PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Caiu uma ficha no governo Lula

Derrotas nas eleições municipais parecem ter sacudido o governo Lula sobre as mudanças estruturais que o mercado de trabalho no Brasil ainda passando

PUBLICIDADE

Foto do author Celso Ming
Atualização:

Pelo menos no discurso, há alguma novidade no jeito com que o governo Lula começa a lidar com as grandes transformações na área do trabalho.

PUBLICIDADE

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva parece ter finalmente descoberto, por exemplo, a importância que o trabalhador brasileiro passou a dar ao empreendedorismo, à ocupação por conta própria e ao avanço dos microempreendedores individuais (MEIs).

Graças, em boa parte, à tecnologia da informação e à grande difusão dos aplicativos, o trabalhador já não vê com os olhos de antigamente o emprego formal, com carteira assinada, marcação de ponto e tudo o que vem junto. Ele quer é ser patrão de si mesmo, prestar serviço para quantos clientes conseguir, quer ser senhor de sua jornada de trabalho.

Pode isso significar ralar todos os dias, até mesmo nos fins de semana e nos feriados, renunciar a férias regulares e passar por perrengues mil, mas conta com que, lá na frente, terá alguma coisa, uma casinha decente, um carro, escola para os filhos, um dinheiro no banco. Pode não ficar rico, mas vai tentar o quanto pode perseguir a prosperidade, subir na vida e ser mais valorizado.

Publicidade

Essa mentalidade se choca com o que pensa a ala mais tradicional do Partido dos Trabalhadores (PT), ainda impregnada pela ideologia da luta de classes e pelo jogo de interesses do patrão contra os do empregado.

O novo trabalhador não valoriza, como tantos no passado, a ação dos sindicatos. Entende que muitos dos tais direitos trabalhistas valem pouco diante do risco de ser demitido a qualquer momento, sem justa causa, apenas porque o empregador decidiu cortar custos – sem falar que todo cinquentão já é encarado como estorvo no mercado.

O governo anda com dificuldade para entender as novas dinâmicas do mercado de trabalho, impulsionadas pela mentalidade do trabalhador autônomo, que quer ser patrão de si mesmo. Foto: Ilustração: Marcos Müller/Estadão

O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, ex-líder sindical, continua decepcionado porque os entregadores de aplicativos não fazem questão de se sindicalizar. O governo Lula e líderes do PT seguem com denúncias do que chamam de “trabalho precarizado” que, para eles, é o resultado da terceirização, da robotização, da pejotização e da falta de cumprimento de direitos do trabalhador. Mas desconhecem ou desconsideram que mais precarizada e mais precária do que isso é a situação de desemprego e as dívidas bilionárias dos empregadores para com o Fundo de Garantia e o INSS.

O resultado das eleições e a derrota acachapante na região do ABC, antigo reduto petista, mostraram que o trabalhador está deixando de ver o PT como o partido que defende seus interesses. E entrega seu voto para os políticos que afirmam que o importante é ganhar dinheiro.

Talvez em consequência das pauladas eleitorais, tenha caído alguma ficha no governo Lula de que o mundo do trabalho passa por radical transformação e que, dada a nova dialética, já não dá para tratar as novidades com a CLT, velha de guerra.

Publicidade

Isso ainda não significa que sobrevenha alguma mudança na política trabalhista do governo. Mas pode intensificar as discussões entre as esquerdas e entre os especialistas em Economia do Trabalho. A conferir.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.