O mercado financeiro já esperava esse aumento dos juros básicos (Selic) de 0,25 ponto porcentual para 10,75% ao ano. Mas o governo Lula, grande parte dos políticos do PT, sindicalistas e os dirigentes do empresariado voltaram a fulminar a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), de resto acompanhada de duras advertências.
Não entendem como os membros do Copom podem ser tão sádicos a ponto de puxar os juros para cima a fim de combater o aumento de preços, dias depois de a inflação ter apresentado em agosto variação negativa de 0,02%. Além disso, tomaram essa decisão justamente no dia em que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) derrubou os juros em 0,50 ponto porcentual pela primeira vez em 4 anos.
Afora a renitente tentativa de usar o Banco Central como tábua de tiro ao alvo para tirar o foco das mazelas da economia, boa parte dessa megadivergência acontece porque esses críticos ignoram que o BC não é uma lancha que pode fazer uma curva instantânea de 180 graus. É um transatlântico, que tem de preparar seus movimentos com grande antecedência.
Leia também
A inflação do Brasil foi negativa em agosto, mas está apontando para novas altas, por seis fatores rastreados há semanas: o governo volta a acionar o tacão da gastança e transforma a meta fiscal em matéria de pura ficção; a seca e o fogaréu que tomou o País acenam para aumento dos preços dos alimentos e da energia elétrica; a demanda leva a economia a avanços maiores do que suas pernas aguentam; os preços dos serviços seguem produzindo inflação; a alta do dólar em reais também puxa pelos preços; e o BC está sob risco de perder o controle das expectativas.
Como das duas vezes anteriores, a decisão do Copom foi tomada por unanimidade. Até mesmo os dirigentes nomeados pelo presidente Lula divergem frontalmente do diagnóstico curtoprazista do governo.
Do ponto de vista global, a decisão mais importante foi o passo dado também nesta quarta-feira pelo Fed. Boa parte dos analistas recomendava novos cortes de 0,5 ponto, em novembro e dezembro, mas o presidente do Fed, Jerome Powell, preferiu esvaziar esse balão. Em todo o caso, juros mais baixos implicam circulação maior de dólares nos mercados e, a partir daí, certa desvalorização do dólar ante as outras moedas, inclusive o real. Mas a falta de um sinal de que o ritmo de cortes se mantenha pode voltar a fortalecer o dólar em vez de enfraquecê-lo. Nos próximos dias ficarão mais claras as proporções do ajuste.
O Copom não apontou seus movimentos seguintes. Como, no entanto, a inflação ameaça escapar da meta, ficam inevitáveis novos apertos. Falta saber se continuarão sendo de 0,25 ponto ou se um deles será de 0,5.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.