Desde que aprovado no Congresso, o pacote fiscal, agora desmembrado em três projetos, escancara suas insuficiências. O cobertor ficou curto para cobrir o rombo aberto pelas despesas. A expectativa, agora, é de que venham certos remendos para que as contas públicas não fiquem em parte desagasalhadas.
Mas um bom pedaço da incerteza continua. Atrás dela segue a falta de confiança na política econômica tocada pelo ministro Fernando Haddad, notoriamente desautorizado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva por ocasião da divulgação do pacote.
Em entrevista na última quinta-feira, durante a apresentação do Relatório Trimestral de Inflação, o futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, fez questão de dizer que o presidente Lula concorda com a sua interpretação sobre o que se passa com a inflação e com a economia, tal como manifestada – entenda-se – nos documentos do Banco Central. Mais recentemente afirmou também não acreditar em que a moeda brasileira seja alvo de ataque especulativo.
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No entanto, a postura de Lula publicamente é outra. Como declarou no Fantástico do último domingo, para ele, o Banco Central é irresponsável, por definir juros em patamares elevados, acima de 12% ao ano (em março chegarão a 14,25%). Por aí se vê que, ou Lula não concorda com Galípolo, ou faz um jogo com Galípolo e outro com a plateia.
A falta de confiança na política econômica não se manifesta apenas com a esticada do dólar para acima dos R$ 6 e com os juros futuros medidos pelo DI mais 7% ao ano.
Também é corroborada pelo estancamento dos investimentos, pelo afastamento das aplicações estrangeiras no País e, sobretudo, pelo aumento do índice de risco Brasil.
Esse índice é medido pelo Credit Default Swap (CDS-5), que é o que o mercado externo está cobrando de adicional sobre os juros dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos para ficar com títulos de dívida do Brasil. O CDS-5 subiu 33% em dezembro e 65% ao longo de 2024.
É um sinal de desconfiança e de percepção de aumento de risco de calote. Nessas condições, nem pensar em grau de investimento para os títulos do Brasil, que o governo brasileiro afirma estar perseguindo.
Como já avaliado por esta Coluna em edições anteriores, esse quadro não se estanca na área econômica, ele tende a se expandir para a área política. Insegurança, dólar e juros lá em cima, recessão, inflação e tudo o que vem junto, tendem a cobrar alto preço político e eleitoral. Não está claro como o presidente Lula pretenderia reagir a uma persistente deterioração do quadro político.
De tudo o que se conhece do presidente, a tendência é de que persista com uma política de gastança acompanhada de distribuição de bondades destinada a azeitar a boa vontade do eleitor. Se for por aí, os fundamentos da economia continuarão afundando. Se, ao contrário, Lula entender que precisa conduzir a economia com rédea curta, tenderá a se beneficiar. A conferir.
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