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Jornalista e comentarista de economia

Análise | Decepcionante, pacote fiscal levanta mais dúvidas sobre a condução da economia pelo governo Lula

Além de não estar claro se as medidas irão controlar as despesas, o processo revelou graves problemas sobre a articulação do ministro Fernando Haddad

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Foto do author Celso Ming

A gente ainda não sabe qual será a cara definitiva desse pacote fiscal. As primeiras avaliações mostraram que tem mais a ver com uma careta.

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Não há analistas e economistas que não tenham observado que é, de longe, insuficiente para garantir a sustentabilidade da dívida pública. Pode, em princípio, ajudar a conter as despesas em 2025 e em 2026, embora não garanta a meta do arcabouço fiscal. Mas ninguém menos que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, admitiu que será preciso alguma complementação, ainda a ser negociada com o presidente Lula.

O que foi apresentado deve cortar despesas entre R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões em dois anos, como apontam algumas projeções iniciais. Haddad fala em economia de R$ 71 bilhões até o fim do mandato, mas há muito ceticismo nesses números. Mesmo depois de esmerilhada pelas pressões dos políticos e dos interesses imediatos, a ideia era, pelo menos, criar condições para que as despesas não crescessem mais do que a inflação futura. Mas nem isso ficou claro.

O pacote ainda incluiu um contrabando: a proposta de isentar de Imposto de Renda os contribuintes cuja renda se limite a R$ 5 mil mensais. Ou seja, o pacote de corte de gastos cortou receitas. Para apontar arrecadação nova que compense a perda de alguma coisa a partir de R$ 45 bilhões por ano, pelas avaliações de economistas do mercado, o governo aponta para um aumento do Imposto de Renda dos mais ricos, que acusem renda de R$ 50 mil por mês, incluídos aí dividendos e resultados de aplicações financeiras.

Se vier a ser aprovada pelo Congresso, essa compensação não leva em conta o que se viu nos países em que foi tentada a sobretaxação dos mais ricos: a enorme capacidade dos endinheirados de executar manobras de administração tributária ou, simplesmente, de transferir patrimônio financeiro para o exterior – onde se paga menos imposto ou num paraíso fiscal onde se garante isenção tributária.

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Ministro Fernando Haddad durante coletiva de imprensa na manhã desta quinta-feira (28), realizada no Salão Leste do Palácio do Planalto em Brasília.  Foto: WILTON JUNIOR/Estadão

Esse contrabando, que nada tem de providência destinada a conter despesas, foi feito apenas para comemoração da plateia do PT e daqueles que vinham cobrando mão tributária pesada também “no andar de cima”.

O resultado imediato foi o esticão da cotação do dólar no câmbio interno, que ultrapassou os R$ 6 por dólar e fechou nesta quinta-feira nos R$ 5,98.

Haddad revelou ao fim deste processo problemas em sua coluna vertebral. Há pouco mais de 30 anos, o então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, chegou a pedir demissão três vezes, quando o presidente Itamar Franco insistiu em enxertar no Plano Real mecanismos de controle de preços. E o ministro ganhou então a parada. Haddad, ao contrário, ficou longe disso.

Esse dólar no patamar dos R$ 6 vai fazer a inflação bombar. O que o presidente Lula ainda não entendeu é que falta de firmeza na condução da economia, a disparada do dólar, a retração na disposição do setor privado em investir, inflação, juros em alta, tudo isso junto é uma mistura envenenada que debilita o interesse do trabalhador e corrói qualquer política social.

Análise por Celso Ming

Comentarista de Economia

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