Há alguns anos, uma das maiores chagas do Brasil era o analfabetismo. Em 1950, por exemplo, 50,6% da população de 15 anos ou mais era analfabeta. As coisas têm mudado, apesar das enormes deficiências do ensino no Brasil. O analfabetismo vem caindo entre os mais jovens, hoje está em 5,6%. Talvez uma explicação para essa melhora seja o uso intensivo do smartphone. Para escrever e ler mensagens no WhatsApp é preciso conhecimento, ainda que rudimentar, da escrita. Muita gente ainda escreve de forma atropelada, confusa e com muitos erros, mas já se comunica por escrito.
O maior problema nessa área é agora a geração “nem-nem”, a moçada que não trabalha nem estuda. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – Educação 2022, divulgada há dias pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostrou que 9,8 milhões de pessoas na faixa de 15 aos 29 anos estão nessa categoria.
Lamentar não basta; é preciso agir. Para Rodrigo Dib, superintendente Institucional do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), além de mostrarem que o Brasil vem falhando em garantir educação básica e qualificação adequada para toda uma geração, esses números revelam como a falta de políticas públicas eficientes pode tornar o futuro ainda mais incerto.
Leia também
É cenário que não só amplia as desigualdades crônicas no Brasil, como também produz outras graves consequências. O baixo nível educacional da população jovem derruba diretamente os índices de produtividade do País. Não há como tornar as empresas locais competitivas e exportadoras, se milhões de jovens não contam com formação mínima, são jogados na informalidade ou exercem atividades pouco desafiadoras e sem perspectiva.
Fernando de Holanda Barbosa, pesquisador sênior do Instituto Brasileiro de Economia (FGV Ibre), acrescenta que qualquer ação que promova a qualificação de jovens no Brasil que não esteja alinhada com o mercado de trabalho será desperdício de recursos. Isso exige ampla reforma educacional, revisão da política nacional de educação profissional e tecnológica e criação de instrumentos que requalifiquem e treinem pessoal. Como poderá esse trabalhador pilotar equipamentos de tecnologia avançada, se não tiver preparo mínimo para isso?
“O mercado está cada vez mais competitivo, e preparar esses jovens para ocupações em que será demandada uma qualificação contínua será fundamental para o futuro do País”, explica o pesquisador.
Dib sugere melhora na Lei de Aprendizagem que garanta trabalho para os mais jovens, a partir do fortalecimento do Programa Jovem Aprendiz. O Brasil conta com cerca de 450 mil jovens aprendizes, mas esse número poderia ser muito superior se houvesse melhor divulgação do programa e, principalmente, fiscalização que obrigasse as empresas a cumprir a legislação.
O superintendente do CIEE pontua também que é preciso empenho para realizar mudanças que desburocratizem as contratações para ampliar o número de vagas que vão ajudar a diminuir esses índices – já que a legislação prevê emprego formal e capacitação profissional para o público jovem.
Mas não basta isso. É preciso, também, criar políticas destinadas a incluir os mais vulneráveis no mercado de trabalho. Mesmo que contem com melhor formação, as mulheres estão entre as mais prejudicadas com a falta de oportunidades. Da mesma forma, o baixo acesso dos jovens negros às ocupações remuneradas não se explica apenas pela falta de experiência ou pela baixa formação desse segmento social.
Dos 7,1 milhões de jovens de 14 a 24 anos que não estudam nem trabalham, 60% são mulheres, a maioria com filhos pequenos; e 68% são pretos ou pardos, segundo levantamento recente sobre empregabilidade de jovens no Brasil realizado pelo Ministério do Trabalho e Emprego.
Grande parte desses problemas demanda soluções que precisam partir dos governos e do setor público – o que torna a situação ainda mais crítica. Não só com a palavra, mas, também, com ação. O governo Lula, que se elegeu prometendo colocar o pobre no Orçamento, precisa mostrar a que veio.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.