O presidente Lula mantém um entendimento contraditório, para não dizer confuso, em relação à inflação. E isso cobra seu preço.
Tem um lado do presidente que considera a alta de preços normal e quase inofensiva. Tem outro que mostra preocupação com seu impacto sobre a popularidade do governo, especialmente quando disparam, como agora, os preços de produtos essenciais, como carne, café, arroz e feijão.
Algumas vezes, quando desancou a política de juros do Banco Central, Lula mostrou que não dá grande importância à inflação. Chegou a dizer que está só um tantinho mais alta do que a meta, como se esse tantinho não fizesse diferença. Uma febre de 39 graus também só é um tantinho mais alta do que os 36,5 graus considerados ideais para o organismo.
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Persiste entre as esquerdas brasileiras a ideia de que a inflação não é tão importante, desde que o País esteja em crescimento e que aumentem os empregos. Nos anos 1960, o economista Celso Furtado, um dos gurus das esquerdas de então, entendia que, na condição de subdesenvolvimento, não há crescimento econômico sem inflação.
O mau entendimento das lições de Celso Furtado parece ter sido o fator que gerou a excessiva tolerância à alta de preços pelas esquerdas.
A questão central está na qualidade da política fiscal. Furtado ensinava que o crescimento econômico exige investimentos em infraestrutura e em capacidade de produção e que a inflação acaba por ser seu efeito colateral que, lá na frente, seria compensado com mais renda. Mas o presidente Lula quer a gastança não para investir e para criar empregos, mas para o consumo. Poupança e investimento não passam de 15% ou 16% da renda nacional. Nessas condições, a inflação acaba por esmerilhar patrimônio e renda da população, especialmente nos segmentos dos salários mais baixos, sem a contrapartida por mais crescimento econômico e de renda.
Essa confusão inicial gera outras. Se, com sua irresponsabilidade fiscal, o governo opera contra o Banco Central na sua tarefa de empurrar a inflação para dentro da meta, é inevitável que os juros avancem, não por conspiração dos banqueiros, como tantos no governo vêm alegando, mas porque é preciso evitar o estouro com dinheiro mais curto.
Até agora, o presidente Lula não parece ter entendido a importância da austeridade fiscal até mesmo para definição de sua política social. Com um rombo nominal (que inclui os juros da dívida) entre 7% e 9% do PIB, não há como estimular aumento na capacidade de produção nem como assegurar o grau de investimento para os títulos do Tesouro, situação que atrairia capitais externos.
Não adianta reclamar da qualidade da comunicação do governo, quando as cotações do dólar ultrapassam os R$ 6, quando a cesta da feira chega em casa cada vez mais vazia e quando as pesquisas passam a captar o mau humor da população.
O que está em questão é a qualidade das opções de política adotadas pelo governo.