Se quer liderar o processo de transição energética, como vêm anunciando autoridades do governo, o Brasil precisa criar condições para desenvolver a cadeia produtiva de terras raras.
Terras raras é o nome dado ao conjunto de 17 elementos químicos – como o neodímio, túlio, cério, lantânio e ítrio –, encontrados em materiais de difícil mineração, cujo as características são imprescindíveis para componentes de turbinas eólicas, carros elétricos, painéis solares, catalisadores automotivos, baterias e circuitos eletrônicos.
Dada a necessidade de descarbonização do planeta e migração para a economia verde, esses materiais são estratégicos e altamente suscetíveis a disputas geopolíticas e comerciais.
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A China, que responde por quase 90% da produção global refinada de terras raras, há meses vem se movimentando para manter seu domínio sobre o setor. Já impôs restrições sobre a exportação de boa parte desses materiais e proibiu a venda de tecnologias destinadas à produção de ímãs de terras raras.
Como apontam levantamentos do Serviço Geológico dos Estados Unidos, o Brasil possui a terceira maior ocorrência de terras raras do mundo. Daí por que se apresenta como opção destinada a reduzir a dependência de fornecimentos da China. Mais do que isso, esta seria uma janela de oportunidades para começar a desenvolver uma cadeia produtiva desses elementos.
No entanto, falta ação e falta sentido de urgência. O Projeto de Lei 2.210/2021, que cria a política nacional das terras raras, não consegue avançar nem nas comissões especiais do Senado. Uma ação articulada, com regras claras para mineração, processamento e fortalecimento de pesquisa e inovação, seria apenas o começo, como observa a pesquisadora Elaine Santos, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP).
Ela avisa, ainda, que é preciso desenvolver estratégias que garantam o sucesso desses investimentos. Entre elas estão a de não focar apenas a extração e o mapeamento da cadeia local, mas, também, o entendimento de quais processos o Brasil já domina e, a partir daí, direcionar recursos para fortalecer a cadeia produtiva e abrir novas frentes.
“O País já tem uma história de domínio de algumas etapas dessa cadeia, então não seria estratégico criar e fomentar políticas para ampliar a extração e mineração desses materiais só para atender a demanda com exportação. Dada importância dessas matérias-primas nesse novo contexto global, o Brasil pode desenvolver o processamento de ponta a ponta aqui”, explica Elaine.
Já há iniciativas em curso, como o Laboratório de Produção de Ímãs de Terras Raras, em Minas Gerais, a primeira planta industrial do tipo no hemisfério sul. A fábrica foi adquirida pela Federações das Indústrias de Minas Gerais (FIEMG) no fim do ano passado e tem a capacidade de fabricar 100 toneladas de ímãs por ano. Com o apoio do BNDES, as Federações das Indústrias de Santa Catarina e de Minas Gerais também criaram o projeto MagBras, que tem por objetivo alçar o Brasil como um player importante na cadeia global de ímãs de terras raras.
Colocar a indústria brasileira, que há décadas vem perdendo força e competitividade, no centro do desenvolvimento e financiamento desse novo ciclo econômico em que o mundo se enveredará, pode ser a chave do sucesso. Mas é preciso acordar para essa necessidade.
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