Efeito China: retomada beneficia frigoríficos no Brasil, mas afeta mineração e celulose

Desempenho mais fraco do setor industrial já teve reflexo no preço do minério de ferro, que abriu o ano em US$ 130 e agora está em US$ 100; consumo de proteínas, no entanto, não deve ser afetado

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Atualização:

A tão esperada reabertura econômica da China, após um longo período de restrições por causa da pandemia, deve ter reflexos diferentes entre as ações de empresas brasileiras listadas e que têm o país como importante parceiro comercial. Caso o governo de Xi Jinping não adote estímulos econômicos mais fortes, os setores de mineração, siderurgia, papel e celulose tendem a sofrer com a retomada lenta do setor industrial e imobiliário, mas o segmento de proteínas pode se beneficiar de uma recuperação mais acelerada no segmento de serviços. A visão é de analistas de investimentos consultados pelo Estadão/Broadcast.

“Com o setor industrial tendo uma recuperação mais fraca desde março, o consumo de aço e minério de ferro na China (principal consumidora da commodity, representando cerca de 60%) deve ficar estável na comparação anual, o que pressiona o preço do minério de ferro já que a oferta está crescendo”, afirma o analista Daniel Salomão, da Neo Investimento.

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Segundo ele, o minério de ferro iniciou 2023 sendo cotado no patamar de US$ 130,00 por tonelada, mas agora está na faixa dos US$ 100,00 e só deve atingir seu preço de equilíbrio em US$ 90,00. Thiago Ojea, analista da Apex Capital, lembra que a commodity passou por um rali expressivo de novembro de 2022 até janeiro de 2023, na esteira do abandono da política covid zero pela China.

Agora, a expectativa de Ojea é de que o preço médio para o minério de ferro deve ficar em US$ 100 por tonelada, contudo ele destaca que é difícil cravar uma previsão enquanto há dúvidas sobre se o governo de Xi Jinping fará estímulos adicionais para o setor de real state (imobiliário), além de qual seria seu formato e tamanho.

O setor de papel e celulose, por sua vez, tem menos exposição à China do que o de minério de ferro, visto que o gigante asiático representa uma faixa entre 35% e 40% do consumo mundial. “A Europa e os Estados Unidos ainda são mercados muito relevantes para a celulose. Além disso, o setor é mais maduro e há suporte para demanda, principalmente se lembrarmos que a pauta ESG (sustentabilidade ambiental, social e de governança corporativa) tende a substituir o plástico por papel”, destaca Salomão, da Neo.

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Cerca de 80% da produção da Vale é de minério de ferro e praticamente 100% desse total é destinado à exportação Foto: Fabio Motta/Estadao

Já as importações de carne bovina na China devem melhorar no segundo semestre de 2023, na avaliação do Citi. Mesmo que haja uma desaceleração econômica na China, o setor de proteínas não deve ser tão impactado, visto que a maior fatia consumidora está na classe média e de alta renda, segundo o analista Johny Nicolas, da Esh Capital.

Mineração e siderurgia

Na bolsa brasileira, CSN Mineração e Vale são os papéis com maior exposição à China. Ação com mais peso no principal índice da B3, Vale “deve continuar entregando resultados fortes, mas perde o vento de cauda (favorável) que é o preço do minério de ferro, considerando que cerca de 80% de sua produção é de minério de ferro e que praticamente 100% desse produto é para exportação”, segundo Salomão, da Neo.

CSN, por sua vez, tem maior diversificação de produção. Já a Gerdau, apesar de ser muito focada em aço, acaba sendo mais protegida geograficamente por atuar em Argentina, Brasil, Canadá, Colômbia, Estados Unidos, México, Peru, República Dominicana e Uruguai. A Usiminas também, afinal está mais focada no mercado interno brasileiro.

Celulose

Além de a celulose ter menos exposição à China do que o minério de ferro e o aço, a maior parte da commodity acaba indo para setores mais focados em consumo, o qual aponta para uma recuperação. Dentro da bolsa brasileira, Klabin aparece ainda mais protegida da China em comparação com a Suzano, visto que apenas 35% de produção é destinada para celulose de mercado e os outros 65% são mais ligados à atividade doméstica, estima Salomão, da Neo.

No início de junho, a Suzano ainda reduziu em 4% a expectativa de produção de celulose para 2023, em uma decisão que “se baseia no fato de que tal volume não traria retorno adequado para a companhia em um momento de mercado de celulose mais complexo”.

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Com a medida, o BTG Pactual projeta que o preço da celulose deve alcançar o intervalo entre US$ 530 até US$ 550 por tonelada nas próximas semanas. Na avaliação do banco, a Suzano tomou uma decisão racional e sinalizou ao mercado que os preços atuais em torno de US$ 500 por tonelada estão “insustentavelmente baixos”. Para o BTG, a produtora de celulose não deve reportar perdas de Ebitda.

Ojea, da Apex Capital, acredita que o corte de produção da Suzano ajuda no preço da celulose, visto que atualmente a demanda na América do Norte na Europa está mais fraca e que ainda haverá um aumento de oferta no segundo semestre deste ano devido ao projeto no Uruguai da finlandesa UPM e ao projeto Mapa da Arauco.

Frigoríficos

Em relatório, o Citi destaca que na China o setor de hotéis e restaurantes - que tem tido uma recuperação acelerada - é atendido principalmente por importações, enquanto a produção doméstica de carne bovina chinesa serve principalmente ao consumo doméstico. Assim, na bolsa brasileira, Minerva tem maior exposição à China e, portanto, conta com um cenário positivo daqui para frente.

Entre os pares, JBS também exporta carne para a China, mas também tem exposição à América do Norte e Austrália. Já BRF produz menos bovinos e, de qualquer maneira, é focada no mercado doméstico brasileiro, enquanto Marfrig tem grande exposição à BRF.

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“Para adquirir carne bovina, a China olha mais atentamente: segurança, sabor e, apenas depois, o preço”, afirma Johny Nicolas, da Esh Capital, reiterando que o setor de proteínas deve ser menos afetado mesmo que a recuperação do país asiático seja menos intensa do que o esperado.

A China tem buscado alternativas à carne suína, o que fez as exportações de carne bovina brasileira para o país terem um dos maiores crescimentos em dez anos, disparando 7.140% em 2022 ante 2012. O principal destino da carne brasileira é para o país asiático.

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