Há uma grande diferença entre a excelente PEC 45/19, apresentada pelo deputado Baleia Rossi (MBD-SP) e o texto aprovado pelo Senado, que cria o Imposto Sobre Valor Adicionado (IVA) para a tributação do consumo no Brasil. Desnecessariamente, nosso IVA foi desdobrado em dois tributos: um federal, a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS), e outro estadual/municipal, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Mas isso é um mal menor. Os maiores problemas estão nas vitórias conquistadas por segmentos da sociedade, geralmente os que já gozam de privilégios fiscais e são os mais ricos.
Antes das críticas, faço uma ressalva. É improcedente a reclamação de que o grande problema do nosso IVA é que se sua alíquota chegar a 27,5%, tornando-se a mais alta do mundo, haverá aumento da tributação sobre a produção e o consumo. Esse porcentual – que, por ora, é mera estimativa –, se refere à alíquota calculada “por fora”, ou seja, sobre o valor do bem ou serviço antes do tributo. No Brasil, atualmente, a alíquota é calculada “por dentro”, ou seja, o porcentual que o imposto representa sobre o preço final de venda. Se fosse expressa pelo critério atual, a alíquota de 27,5% corresponderia a 21,6%, o que, provavelmente, é inferior à soma das alíquotas atuais dos impostos que serão extintos.
Argumenta-se que o IVA da União Europeia também possui muitas exceções e isenções. Ocorre que este não é um bom exemplo. As principais diretrizes para a harmonização do tributo entre os vários países-membros são de 2006, e tiveram que absorver muitas distorções existentes, já que lidavam com leis de nações soberanas. E as alterações são frequentes. A última ocorreu em 2023. Aqui, poderíamos fazer bem melhor, mediante nosso sistema de legislação única nacional e cobrança unificada. Mas aí entraram em ação os grupos com maior poder de pressão em Brasília.
A quantidade de exceções, isenções, alíquotas zero ou reduzidas e regimes especiais que dependerão de complexas leis complementares que os regulamentem é enorme, e deixa muitas dúvidas em aberto, que impedem uma avaliação acurada da qualidade da reforma. Dada a limitação de espaço, citarei apenas poucos exemplos.
Mesmo com a dificuldade de se calcular o impacto setorial do novo IVA, é certo que o grande ganhador foi o setor agropecuário, que já paga muito menos tributos no Brasil do que os demais.
Não se justifica o tratamento favorecido para educação e saúde privada, assim como a alíquota reduzida para profissionais liberais, pois não são serviços prestados a pobres. Além disso, muitos desses profissionais estão no meio da cadeia produtiva, e o seu IVA gerará crédito integral para seus clientes.
É possível que o novo IVA represente uma melhora em relação ao sistema atual. Mas, dependendo das regulamentações, pode se transformar em uma vitória de Pirro. Que pena, poderia ter sido bem melhor.
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