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Economista e diretor-presidente da MCM Consultores

Opinião|Críticas à Selic desfocam o debate econômico do que realmente é importante

Frequentes manifestações do presidente Lula contra o BC são tiros nos pés, tanto do governo como da população

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A Selic, abreviatura de Sistema Especial de Liquidação e Custódia, é a taxa fixada pelo Comitê de Política Monetária (Copom), aplicada às operações de curtíssimo prazo entre o Banco Central (BC) e os bancos com contas de reserva, para regularizar a liquidez do sistema bancário. Além disso, ela orienta as taxas no mercado interbancário (CDI), operações também usadas para regularização de liquidez entre as próprias instituições.

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Quase nenhum tomador de crédito paga Selic. Tampouco ela determina diretamente o custo de oportunidade de projetos de investimentos. As taxas de juros relevantes para essas decisões são as de prazos mais longos, entre um e cinco anos, ou mais. Elas podem ser influenciadas pela Selic e pelas comunicações do BC, mas não são determinadas diretamente pela autoridade monetária. São estabelecidas no mercado, e dependem de vários parâmetros, principalmente das expectativas sobre a inflação futura.

Um simples exemplo deixa claro que os analistas, os políticos e a imprensa muitas vezes superestimam o papel da Selic e/ou a discricionariedade do BC. Suponha que as expectativas de inflação estejam crescendo e se distanciando das metas fixadas pelo Conselho Monetário Nacional e, mesmo assim, o Copom reduz a Selic. Claro, as taxas de juros de curto prazo vão cair, mas as que realmente importam para os agentes econômicos (taxas futuras) vão subir, pela percepção de que a inflação será mais alta, em um movimento conhecido no jargão econômico como inclinação da curva de juros. Ou seja, o BC, por razões políticas ou por erros de avaliação, ao reduzir a Selic, estaria realmente elevando as taxas de juros relevantes para a economia.

Brasil tem muitos outros problemas estruturais que jogam para cima a taxa real de juro, que debilita o crescimento e afugenta o capital externo Foto: Wilton Junior/Estadão

Assim, as frequentes manifestações, às vezes ofensivas, do presidente Lula da Silva em relação ao BC, especialmente contra o presidente da instituição, são tiros nos pés, tanto do governo, como da população. Além disso, desfocam o debate econômico do que realmente é importante.

Claro, a estabilidade fiscal é importantíssima, e já tratei dela em outros artigos. Mas não devemos entoar o samba de uma nota só ao restringir o debate econômico a esse tema. O Brasil tem muitos outros problemas estruturais que jogam para cima a taxa real de juro, que debilita o crescimento e afugenta o capital externo. A lista é enorme e o espaço aqui é pequeno: insegurança jurídica, falta de autonomia das agências reguladoras, péssima qualidade de ensino, precariedade de infraestrutura, excesso de proteção tarifária (tarifa média efetiva próxima a 25%), sistema tributário caótico – questão já endereçada pela Emenda Constitucional n.º 32, mas de implementação longa e muito deformada em relação à proposta inicial –, manutenção de facilidades fiscais sem análise de seus custos e benefícios, insistência em políticas públicas que deram errado no passado, entre outros.

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Opinião por Claudio Adilson Gonçalez

Economista e diretor-presidente da MCM Consultores, foi consultor do Banco Mundial, subsecretário do Tesouro Nacional e chefe da Assessoria Econômica do Ministério da Fazenda

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