O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, herdou de seu antecessor uma situação fiscal frágil. Baseado em expressivas receitas não recorrentes, Paulo Guedes dizia que “o fiscal estava forte” e concordou com vultosas renúncias de receitas, a maior parte para reduzir o preço dos combustíveis às vésperas das eleições. Ao todo, as desonerações, em bases anuais, chegaram a 1,7% do PIB (cerca de 0,9% para a União). Do lado da despesa, não houve reduções estruturais, mas sim o congelamento dos salários da maior parte dos servidores públicos (sem entrar no mérito da medida, apenas lembro que não é sustentável) e forte repressão também não sustentável das despesas discricionárias, que aniquilaram políticas públicas essenciais e reduziram os investimentos. Deve-se lembrar também que foi Jair Bolsonaro, com apoio quase unânime dos parlamentares, que elevou o Bolsa Família para R$ 600, sem deixar dotação no Orçamento de 2023 para bancar esse benefício.
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Já Lula da Silva, mesmo antes de assumir e de sequer ter indicado seu ministro da Fazenda, emplacou a PEC da Transição, que elevou os gastos públicos para além dos valores que seriam necessários para retomar a execução normal das políticas públicas.
Foi nessa situação que Haddad assumiu, com a missão, provavelmente autoimposta, de zerar o déficit primário já em 2024 e voltar a registrar superávits a partir de 2025, de modo a evitar o crescimento contínuo da relação dívida/PIB. Como o governo não pretende cortar gastos e, reconheça-se, seria mesmo difícil, dada a rigidez das despesas obrigatórias, o ajuste pretendido com o novo arcabouço fiscal concentra-se sobretudo no aumento da arrecadação.
No meu cenário básico, que utiliza as projeções da pesquisa Focus, conduzida pelo Banco Central, para o crescimento real do PIB e para a taxa Selic no período 2023-2026, o cumprimento das metas do arcabouço exigiria que a receita líquida da União crescesse do patamar de 18,2% do PIB, previsto para 2023, até 20% do PIB, em 2026. Isso seria possível? Sim, seria. Se as desonerações eleitoreiras de Bolsonaro tivessem sido revertidas integralmente (para a União), faltaria cerca de 1% do PIB, o que poderia ser encontrado com a revogação adicional de algumas renúncias tributárias e com firme combate às evasões fiscais.
No entanto, Lula e seu partido têm dado demonstrações da falta de vontade política para sustentar as propostas de Haddad. Basta lembrar a novela para reverter, apenas parcialmente, a desoneração do PIS/Cofins sobre combustíveis, e as dificuldades para implantar medida anunciada publicamente pelo ministro da Fazenda, que terminaria com a sonegação de tributos nas vendas internacionais efetuadas a pessoas físicas pelas plataformas digitais.
Sem contar com o firme suporte de Lula e com a complicada base de apoio do governo no Congresso, a missão de Haddad parece muito difícil, quase impossível.
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