O ministro Fernando Haddad tem colocado enorme peso para o sucesso da política econômica do atual governo na reforma tributária sobre o consumo, ou seja, a substituição da parafernália de impostos e contribuições atuais por um ou dois tributos sobre o valor adicionado (IVA), o chamado Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). E não é para menos. Se aprovada e implantada, a proposta, que se originou em estudos do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), sob a coordenação do economista Bernard Appy, representará enorme avanço para a construção de um sistema tributário mais simples, transparente, justo e com impactos positivos no crescimento econômico potencial.
Isso porque concorrerá (e muito) para aumentar a eficiência na alocação dos recursos produtivos e para reduzir os contenciosos e os custos de conformidade, ou seja, as despesas necessárias para apurar os impostos e contribuições e satisfazer às exigências do Fisco. Além disso, diminuirá a evasão fiscal, ampliará a base de tributação e desonerará as exportações e os investimentos.
Entretanto, apesar de todos esses méritos ou, ironicamente, por causa deles, essa reforma corre o risco de frustrar as expectativas otimistas que aos poucos vêm crescendo entre os agentes econômicos e não ser a bala de prata esperada por Haddad.
Um dos maiores obstáculos é a dificuldade dos políticos, e até mesmo dos contribuintes, para entenderem que impostos sobre o consumo devem ter como única finalidade a arrecadação, da forma mais neutra possível, sem qualquer influência na decisão alocativa dos agentes econômicos.
O IVA não deve ser utilizado como instrumento de política social, setorial ou de desenvolvimento regional. Estas devem ser desenhadas por instrumentos próprios, transparentes, ser explicitadas nos orçamentos públicos e ficar sujeitas a periódicas avaliações de seus custos e benefícios. A tentativa de utilizar a tributação sobre o consumo para atender a esses objetivos múltiplos é a causa principal do caos em que se transformou o sistema tributário brasileiro.
E até mesmo o bom relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro, que é o ponto de partida das discussões atuais, abriu espaços para esses desvios de finalidade no IBS. Criará dois tributos, um federal e um estadual, o que não chega a ser um grande problema, mas é desnecessário, e abre a possibilidade de vários regimes tributários especiais, com possíveis diversificações de alíquotas, como produtos agropecuários, construção civil, transportes coletivos, educação, saúde e outros que muito provavelmente os parlamentares tentarão incluir.
Para contornar as polêmicas e facilitar a aprovação da PEC, tudo isso vai ser tratado em lei complementar. Não há outro caminho. Mas é aí que mora o perigo. Há vários dispositivos constitucionais bem-intencionados que jamais entraram em vigor por falta da lei que os regulamente.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.