Há dois riscos externos que tendem a atrapalhar a economia brasileira em 2024: o primeiro, e que me parece mais sério, é a difícil situação econômica da China.
Há uma crise imobiliária grave naquele país. Os números do setor são preocupantes. O valor das vendas de imóveis caiu cerca de 20% nos últimos dois anos. A área construída de novas habitações desabou 58% no período 2019-2023. A inadimplência, que levou à liquidação da maior incorporadora chinesa, a Evergrande, continua crescendo.
Dada a importância do setor imobiliário no PIB da China, essa crise tende a contaminar toda a economia, pela destruição de empregos, instabilidade financeira e deterioração de expectativas. O pior é que o governo chinês vem lidando mal com essa situação. Os estímulos para evitar o pior têm sido tímidos, uma vez que Xi Jinping teme realimentar uma bolha, o que é compreensível, mas, ao mesmo tempo, fecha a válvula de escape que costumeiramente era aberta em situações semelhantes, ainda que menos graves, no passado.
E os problemas da China não param por aí. O país está em deflação e seu principal índice de ações, Shanghai Composite, apesar das intervenções do governo, caiu 13% nos últimos 12 meses e 20% nos últimos 2 anos.
Os dados aqui citados são como um termômetro, apenas medem a temperatura da crise. Sua verdadeira causa parece ser a visão de Xi Jinping de que ele próprio e o Partido Comunista devem aumentar seu controle sobre a economia. Vide, por exemplo, o endurecimento das regras sobre o setor de tecnologia, que tem afugentado investidores externos.
A provável redução drástica da taxa de crescimento da economia chinesa tende a enfraquecer a demanda por commodities exportadas pelo Brasil.
O segundo risco é a possível necessidade de o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) manter o aperto monetário por mais tempo do que o esperado pelo mercado. Uma amostra do estrago que isso pode provocar nos foi dada no início da semana passada, quando o Índice de Preços ao Consumidor dos Estados Unidos ficou um pouco acima das expectativas. Nesse caso, sou um pouco menos pessimista, pois tendo a crer que a inflação por lá está controlada. Mas não descarto a possibilidade de eu estar errado.
Tudo o mais constante, se um ou ambos os riscos citados se concretizarem, o Brasil será afetado principalmente pela depreciação do real, seja em função da queda do preço das commodities, seja pela redução do diferencial entre a taxa de juros interna e a externa. O efeito líquido disso é redução do crescimento e mais inflação.
A missão de enfrentar um quadro como o acima descrito não poderá ficar apenas a cargo do Banco Central. É essencial que Executivo e Legislativo façam sua parte, seja praticando uma política fiscal responsável, seja avançando nas reformas estruturais.
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