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Economista e diretor-presidente da MCM Consultores

Opinião|A taxa básica de juros está muito alta, mas não se derruba a Selic no grito

Mesmo que o BC reduzisse os juros agora, nada garante que as taxas mais longas, que são as mais relevantes para a economia, também cairiam

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Mesmo as pessoas não familiarizadas com estatística já se habituaram com as expressões “margem de erro” e “nível de confiança das estimativas”. Esses termos são muito popularizados nas pesquisas eleitorais. A margem de erro determina os limites, inferior e superior, dos intervalos de confiança de estimativas amostrais. Por convenção, em estatística, geralmente se trabalha com nível de confiança de 95%. Mas, devido à alta instabilidade das relações e da interferência de um número grande de variáveis, as margens de erro nas projeções de inflação dos modelos dos bancos centrais mundo afora, a esse nível de confiança, são enormes.

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Por exemplo, na tabela constante do Relatório de Inflação (RI) do Banco Central (BC) do Brasil, de dezembro de 2022, observa-se que, para o nível de confiança de 50%, ou seja, quase um par ou ímpar, o intervalo estimado para o IPCA acumulado nos 12 meses até junho de 2024 é de 2,4% a 4,2%. Se trabalhássemos com o nível de confiança usual de 95%, essa margem de erro seria muito maior.

Assim, é difícil afirmar, com segurança, que o atual nível da taxa Selic (13,75%) seja o ideal para fazer a inflação convergir para as metas. Os modelos são ferramentas úteis, mas em política monetária há mais arte do que ciência. De fato, começam a surgir indicações de que a taxa básica atual seja muito alta e que estaria se aproximando o momento de o BC iniciar, responsavelmente, o afrouxamento gradual da política monetária.

Mesmo durante a tramitação tumultuada da PEC de Transição, o que se discutia era se o ciclo de redução da Selic se iniciaria em maio ou agosto de 2023. A média móvel trimestral anualizada das medidas de núcleo da inflação (que retira choques e preços muito voláteis) despencou de 12,4%, em junho de 2022, para 5,3%, em janeiro de 2023. As condições financeiras estão muito apertadas e isso já começa a se refletir nas dificuldades de acesso ao crédito. A crise da Americanas pode ser algo muito particular, mas outras empresas estão com problemas evidentes de crédito, por exemplo, Lojas Marisa, Oi, companhias aéreas, entre outras. A inadimplência das pessoas físicas com o sistema financeiro saltou de 4%, em junho de 2021, para 5,9%, em dezembro de 2022.

Começam a surgir indicações de que a taxa básica atual seja muito alta e que estaria se aproximando o momento de o BC iniciar o afrouxamento gradual da política monetária.  Foto: Dida Sampaio/Estadão

Mas aí veio o discurso raivoso de Lula da Silva e do núcleo duro do PT. Ao rotularem Roberto Campos Neto de “bolsonarista infiltrado no governo” e “esse cidadão”, e o presidente da República dizer que não sabe a serviço de quem ele trabalha e que, ao final de 2024, vai avaliar a conveniência de manter a autonomia operacional do BC, Lula, além de cometer grosseria e injustiça, desestabiliza as expectativas e torna mais difícil a queda da taxa de juros. Mesmo que o BC reduzisse a Selic agora, nada garante que, em um ambiente como esse, as taxas mais longas de juros, que são as mais relevantes para a economia, também cairiam.

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Não se derruba taxa de juros no grito.

Opinião por Claudio Adilson Gonçalez

Economista e diretor-presidente da MCM Consultores, foi consultor do Banco Mundial, subsecretário do Tesouro Nacional e chefe da Assessoria Econômica do Ministério da Fazenda

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