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Bastidores do mundo dos negócios

Construtoras da Lava Jato querem pagar leniência por meio de prejuízo fiscal

Empreiteiras afirmam que acordos são ‘impagáveis’

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Atualização:
Empreiteiras querem seguir caso da BRF, que firmou acordo com a União de R$ 584 milhões para pagar dívida por meio de precatórios e de prejuízo fiscal Foto: REUTERS/Rodolfo Buhrer

Empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato discutem com a Controladoria Geral da União (CGU) a revisão de prazos e formas alternativas de pagamento dos acordos de leniência. Segundo fontes ouvidas pela Coluna, OEC (da Odebrecht), Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, UTC e OAS buscam pagar parcelas futuras por meio de prejuízo fiscal e de precatórios. Uma regulamentação da CGU específica sobre o uso de prejuízo fiscal deve sair em breve, de acordo com outra fonte.

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Essa rediscussão entre as construtoras começou no fim do ano passado, quando a BRF firmou um acordo com a União no valor de R$ 584 milhões que permitiu o pagamento da dívida por meio de precatórios e de prejuízo fiscal. Já nos acordos firmados com as construtoras da Lava Jato, essas cláusulas não foram inseridas.

“As empresas estão com acordos impagáveis. Com a correção desses montantes, a dívida basicamente dobrou”, afirma uma fonte que participa das discussões e não quis se identificar. “É uma forma de minorar os impactos.”

Alta da taxa Selic dificultou pagamento

A correção monetária usada na maioria dos acordos é feita pela taxa básica de juros, a Selic, que está hoje em 13,25%. Quando os acordos - a maioria, bilionários - foram assinados, a taxa estava em pouco mais de 2%. “A dívida simplesmente não diminui”, diz uma fonte. As parcelas são anuais e, caso haja atraso, há ainda multa de 2% sobre o valor corrigido.

Desde 2015, essas construtoras ficaram sem acesso a crédito bancário ou ao mercado de capitais. Com as condições mais precárias, têm batido na porta da CGU para amenizar as dificuldades financeiras, agravadas durante a pandemia e com a disparada da Selic. “Demorou mais de ano para termos resposta (em relação ao pedido de acerto posterior de pagamento, por conta da pandemia) e o cenário ficou muito pior do que imaginávamos inicialmente”, diz. “Estávamos sem receita e com os custos de manter as empresas abertas.”

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Agora, a expectativa dessas construtoras é de que o benefício dado à BRF se estenda a elas. Sem grandes obras há anos, as construtoras poderiam ter no uso do prejuízo fiscal um grande alívio. Já o pagamento com precatórios teria como contrapartida desafogar o Orçamento da União.

Pagamento com prejuízo fiscal é complexo

O uso de créditos oriundos de prejuízo fiscal não é tão simples quanto parece, diz o advogado especialista em direito tributário Carlos Navarro, sócio do escritório Galvão Villani Navarro Zangiácomo Bardella Advogados. Ele só pode ser usado após o pagamento do Imposto de Renda e Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) - que tem alíquota de 34%. Após o pagamento dos impostos, o contribuinte pode pagar até 30% da leniência com o prejuízo fiscal. Os outros 70% devem ser pagos em dinheiro. Além disso, a empresa deve ter lucro, o que não tem acontecido com a maioria das construtoras.

“O prejuízo fiscal é um crédito que a empresa possui contra a União. É como se fosse um imposto pago a mais e que só pode ser usado para abater do próprio lucro das empresas, exclusivamente para uso no Imposto de Renda”, afirma. “É uma monetização difícil, a menos que a empresa passe a ter um lucro muito grande. O lucro precisa ser três vezes maior do que o prejuízo para conseguir usar tudo de uma vez em um único ano, algo que é muito raro”, completa.

Para o advogado Valdir Simão, sócio do escritório Warde Advogados e ex-ministro da CGU, a Lei 14.375, aprovada em junho do ano passado, já permite o uso de prejuízo fiscal para o pagamento de outras dívidas, sejam elas tributárias ou não. Ou seja, apesar de o tema ainda não estar regulamentado, já está previsto em lei a possibilidade de usar esses créditos em outras situações. Uma delas, defende ele, poderia ser as parcelas do acordo de leniência. “Tem se discutido o direito de as empresas usarem os créditos para amortizar as parcelas dos acordos e como seria feito, qual seria o procedimento adequado, porque envolve também a Receita Federal”, afirma o ex-ministro, que também foi auditor fiscal. A discussão, na visão dele, “está avançando”. “É muito claro o direito das empresas. Está na lei. E é importante que se busque um procedimento que, de um lado, garanta que possa pagar, e, de outro lado, que administração pública possa ter segurança na existência desse ‘crédito’”, diz.

CGU nega planos de revisão geral de acordos de leniência

À Coluna, a CGU disse que a partir do Decreto 11.129, de julho de 2022, “existe a possibilidade, excepcional, de as pessoas jurídicas colaboradoras solicitarem a alteração ou substituição de algumas obrigações fixadas dos acordos”. “O dispositivo prevê a possibilidade de a CGU deferir pedido de repactuação do prazo e forma de pagamento dos valores definidos no acordo de leniência, mantendo-se os valores já pactuados e as demais condições originais do acordo”, afirmou o órgão.

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A Controladoria enfatiza que “não há planos de revisão geral dos acordos de leniência” e que os eventuais pedidos de revisão das empresas serão embasados de acordo com uma série de critérios do referido decreto. Dentre eles, uma “maior vantagem para a administração”, “boa-fé” e o grau de adimplência da empresa com as parcelas.

Procuradas, a BRF, a Camargo Corrêa, a Andrade Gutierrez e a OAS não quiseram comentar. A Odebrecht disse que “a empresa está adimplente, cumpriu e segue cumprindo o acordo” e não fez comentários adicionais sobre formas alternativas de pagamento. A UTC não respondeu às tentativas de contato da Coluna.


Esta nota foi publicada no Broadcast no dia 14/09/23, às 18h12.

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