Em ofício enviado ao ministro da Previdência, Carlos Lupi, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) afirma que a proposta de redução do teto de juros do consignado para aposentados e pensionistas foi levada ao Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) sem debate. Diz ainda que o órgão não tem levado em conta os impactos dos cortes do teto sobre as concessões.
No documento de cinco páginas, encaminhado na terça-feira ao ministro e ao qual à Coluna teve acesso, a federação afirma que ficou surpresa com o fato de a proposta do Ministério, de reduzir o teto de juros de 1,84% ao mês para 1,77%, ter sido levada ao CNPS sem debate com os membros do grupo de trabalho dedicado ao consignado.
“Não se esperou o GT, por intermédio de seus representantes, concluir um trabalho técnico mais apurado. Ao contrário, a proposta do MPS foi comunicada ao GT como sendo a que seria levada ao CNPS, sem qualquer espaço maior de tempo para análises ou possíveis ajustes/flexibilizações”, afirma o ofício.
Os bancos argumentam ainda que na reunião de setembro do Conselho, ficou definido que o teto não seria alterado porque era preciso aprofundar as discussões no GT. Diante disso, questionam o fato de as conclusões do grupo não serem levadas ao CNPS, que tem o poder de decisão sobre os juros do empréstimo consignado do INSS.
Em outro ponto, a Febraban afirma que em uma reunião do GT realizada em outubro, tanto a entidade quanto a Associação Brasileira de Bancos (ABBC) propuseram que o teto de juros vigente até então, de 1,91% ao mês, fosse mantido “até que as variáveis que pressionam os custos das instituições financeiras pudessem arrefecer”.
Os bancos distribuem o crédito consignado através das redes próprias, mas 40% do volume é concedido via correspondentes bancários, que têm rede física de atendimento e são pagos via comissões. Outro custo relevante é o de captação, e segundo fontes do setor, esse é um dos pontos que o Ministério não tem levado em conta.
Ao propor as reduções do teto, a pasta argumenta que o corte da taxa Selic permite cobrar juros menores. Os bancos, porém, afirmam que os custos de captação dos recursos destinados ao consignado estão melhor refletidos nos juros futuros de dois anos, prazo similar à média dos empréstimos.
O juro futuro de dois anos roda em torno de 10%, mesmo com as perspectivas de que a Selic caia à casa dos 9% no final do atual ciclo de cortes. Pontos como as dúvidas do mercado sobre o cumprimento da meta fiscal de superávit zero estabelecida pelo governo para o ano que vem têm pressionado a curva futura.
Média mensal de concessões de consignado caiu 30% após cortes nos juros
No documento, os bancos afirmam ainda que “causa estranheza” o fato de o Ministério não levar em conta os dados do Banco Central que apontam queda de cerca de 30% na média mensal de concessões do consignado desde março, mês em que houve a primeira redução de juros da modalidade, para 1,70% ao mês - as taxas subiram para 1,97% após os bancos, inclusive os públicos, pararem as concessões.
Segundo a Febraban, o Ministério tem considerado apenas os dados da Dataprev, que faz uma contabilidade diferente, mas que também aponta uma queda, de 12%, na média mensal de concessões de consignado do INSS. Em ambas as bases, a comparação é do período entre março e setembro deste ano e o mesmo intervalo de 2022.
Além disso, a entidade afirma que não faz sentido considerar os dados de janeiro e fevereiro na análise, como faz o Ministério, porque naqueles meses, valia o teto de juros de 2,14%, que na visão dos bancos cobria os custos da modalidade.
Em apresentação enviada pela Febraban à pasta no mês passado, os dados da Dataprev são utilizados para mapear a variação das concessões em cada Estado do País. No Rio de Janeiro, entre maio e setembro, a média de concessões foi 21% menor que no mesmo período do ano passado, a maior queda vista no País. Em São Paulo, a queda foi de 12%. Apenas em Roraima (+4%) e Rondônia (+1%) houve aumento.
Além disso, os dados apontam que as concessões ao público acima de 70 anos caíram 70% no mesmo período, para 700 mil. Essa faixa etária é considerada de maior risco que as demais porque quando o beneficiário morre, o benefício é cancelado e os bancos têm de cobrar a dívida por outros meios.
Relações entre bancos e Lupi estremeceram em março
A redução dos juros do consignado do INSS é uma bandeira de Lupi, quadro histórico do PDT, desde que ele tomou posse no Ministério, em janeiro. De acordo com fontes, os bancos procuraram o ministro para evitar uma “canetada” que inviabilizasse a modalidade.
As relações estremeceram de vez quando o CNPS reduziu os juros do consignado para 1,70% ao mês, em março. Embora tenha voltado atrás naquele momento, o conselho reduziu a taxa outras vezes após o Banco Central começar a reduzir a Selic, sob o argumento de que era necessário repassar ao tomador final o menor custo dos juros.
“A Federação Brasileira de Bancos (Febraban), de forma recorrente, vem alertando o ministro Carlos Lupi sobre os prejuízos que ele tem causado aos aposentados, a partir das decisões que, sem amparo em análises técnicas, culminaram em reduções, de forma totalmente arbitrária e artificial, do teto de juros do consignado do INSS, de 2,14% para 1,80% ao mês”, disse a Febraban em nota divulgada nesta terça-feira.
Na segunda-feira, o CNPS reduziu os juros de 1,84% ao mês para 1,80%. A proposta do Ministério acabou não prosperando diante do impasse no Conselho.
Esta nota foi publicada no Broadcast+ no dia 05/12/2023 às 17h09
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