A diretora de Assuntos Internacionais do Banco Central veio a público afirmar que é injusto atribuir motivação política à decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de manter juros tão altos por tanto tempo. De fato, seria abusivo supor que o Copom tenha se transformado em uma célula que conspira contra as intenções do governo recentemente eleito de promover o crescimento da renda e do emprego.
Juros na Lua, como sabemos, pioram a vida de todos, com exceção dos rentistas, que podem usufruir de ganhos extraordinários sem correr maiores riscos. Mas a inflação renitente, eis aqui o argumento nuclear do Banco Central, é ainda pior para lidar com nossas mazelas. O Copom, nessa visão, apenas nos salva de fazer escolhas erradas no dilema intertemporal que aflige todos os governos. Melhor um sacrifício agora do que a purgação eterna. Assim dizem.
Não há motivação política no Copom – acreditemos. Mas haverá motivação ideológica? É fácil constatar que a definição dos juros no Brasil se dá em um contexto bastante propício ao “pensamento de grupo”. “Groupthink” é o cerne do trabalho seminal do psicólogo americano Irving Janis, que, já nos anos 1970, estudou as condições em que grupos homogêneos e coesos, submetidos à situação de estresse, podem tomar decisões irracionais (ver Victims of Groupthink, 1972).
Faz parte dos sintomas do pensamento de grupo a ideia de que todos os membros são portadores de uma ideia intrinsecamente correta, baseada em princípios inquestionáveis e verdades absolutas. As críticas e ameaças externas servem apenas para enrijecer os dogmas que nutrem o pensamento coletivo. O dissenso é desestimulado em favor de uma coesão que evita os dissabores do atrito, ao custo de suprimir o pensamento independente.
O Copom hoje preenche perigosamente as condições descritas por Janis. A tentativa, tosca, de tipificar o embate atual dos juros como se fosse um duelo pueril entre considerações técnicas e conveniências políticas é mais um sintoma desse quadro. Quem deseja a queda dos juros não pode ser comparado aos defensores da cloroquina, já que mesmo entre os economistas há nítido dissenso sobre a Selic ideal.
Felizmente, a nomeação dos novos diretores do Banco Central tem tudo para contribuir para a diluição das falsas certezas. Também no Copom a diversidade será funcional e poderá enriquecer a discussão a respeito das debilidades de nossa política anti-inflacionária, a começar pelo fato de que ela é exageradamente dependente das decisões de um pequeno grupo de pessoas. Que, não esqueçamos, podem estar erradas.
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