A queda do mercado de TV por assinatura, que se arrasta há anos e não deve ser revertida, fez a rede de canais Telecine abraçar de vez o streaming e partir para a briga com gigantes que tentam dominar a distribuição de conteúdo. Com um diretor geral que veio do setor de tecnologia, Eldes Mattiuzzo, o Telecine vai manter a parceria com as operadoras de TV, mas uma das prioridades agora é a oferta do acesso ao app Telecine junto com pacotes de internet banda larga.
Em entrevista ao Estadão, Mattiuzzo destacou que a TV por assinatura ainda é muito importante para o negócio, mas inevitavelmente tem data de validade. “Hoje, dos nossos assinantes via TV a cabo, 30% usam nosso streaming. Pode parecer pouco, mas, se você pensar que isso era zero há dois anos, é um crescimento importante”, diz o executivo. “Acredito que ainda vai existir uma base na TV a cabo por cinco a dez anos no Brasil.”
O desafio do Telecine e de outros canais é convencer o cliente antigo a migrar para a nova plataforma. Não é tarefa fácil. Para se ter uma ideia da deterioração do mercado que concentra a maior parte da clientela da rede de canais, basta olhar os dados da consultoria Teleco: somente nos 12 meses encerrados em julho, o segmento perdeu 1,5 milhão de assinantes. A TV por assinatura vive uma sangria que começou com a recessão de 2015 e 2016 e se intensificou com a migração do consumo de conteúdo para a banda larga.
Essa reorganização de negócio é relevante porque, além da onipresente Netflix, vários outros pesos-pesados do conteúdo têm se organizado para disputar a preferência do consumidor. Em 17 de novembro, a Disney+ chega ao País depois de lançamentos de êxito nos EUA e na Europa. A HBO Max, que já tem a base da HBO no País e os conteúdos mais premiados da TV global, chega à América Latina no primeiro semestre de 2021. O mercado ainda inclui Amazon Prime e Apple TV+.
Mostrar-se relevante é essencial: com preços a partir de R$ 10 e diferentes cardápios de conteúdo, todos esses concorrentes querem fazer parte da “cesta” de entretenimento do consumidor. O Telecine custa R$ 37,90 na versão 100% internet e se posiciona entre os serviços mais caros do mercado.
Conteúdo
Para se diferenciar da concorrência pesada – que ainda inclui outros streamings de menor porte e de nicho –, o Telecine decidiu apostar em sua principal fortaleza: os filmes. Mattiuzzo diz que a canal não fará séries ou outros conteúdos. O Telecine é um produto do Grupo Globo, mas, para garantir acesso a conteúdo, tem como sócios os estúdios americanos Fox, MGM, Paramount e Universal.
Apesar do reforço desses pesos-pesados, existe no mercado a dúvida de que se essas empresas não poderão, no futuro, priorizar as próprias plataformas. A Fox, no ano passado, foi adquirida pela Disney, que tem investido pesado do Disney+. A MGM já tem um serviço próprio, que recentemente começou a ser distribuído no País via Amazon. E a Paramount acabou de renomear seu produto Paramount+.
Para reforçar seu posicionamento enquanto migra para o streaming, o Telecine tem feito ações de marketing – comprou, por exemplo, o direito de batizar um cinema drive-in erguido na Marina da Glória, no Rio de Janeiro – e desenvolveu um projeto de lançamentos de filmes nacionais inéditos em seu serviço. Recentemente, Três Verões, dirigido por Sandra Kogut e protagonizado por Regina Casé, estreou direto na plataforma.
Personalização
Mattiuzzo diz que o aplicativo vai trazer mais tecnologia para a interação com os usuários. Uma das apostas é que o app se adapte ao gosto do consumidor. “O tempo de descoberta é o maior problema dos streamings hoje. Você fica lá meia hora navegando antes de decidir o que vai ver e acaba ficando com sono”, diz ele. “A ideia é personalizar essa experiência do app, que ela se adapte a cada consumidor. A interação tem de ser a seguinte: ‘O que o Telecine tem para mim hoje?’.”
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