Uma das propostas do agora presidente eleito da Argentina Javier Milei é acabar com o Banco Central, considerado por ele como uma instituição que rouba os argentinos ao contribuir para o processo inflacionário vivido pelo país.
A proposta é de difícil realização, assim como a de dolarizar a economia; mas, caso venha a se tornar realidade, a Argentina seria o maior país a tomar tal atitude.
Hoje, não contam com um banco central países como Andorra, Palau, Kiribati, Micronésia, Ilhas Marshall, Monaco, Nauru, Tuvalu e Panamá. Destes, o maior é o Panamá, que tem um décimo da população e um sétimo da economia argentina.
Dentre esses países, as moedas de circulação costumam ser o dólar, o euro ou o dólar australiano, ou pareadas com estas. Há ainda países que dolarizaram sua economia, mas mantêm um banco central próprio, como Equador e El Salvador.
O que faz um banco central?
Os bancos centrais, embora conhecidos por emitirem papel moeda, também têm a função de reguladores dos bancos privados. Eles são responsáveis pela política monetária, ou seja, determinam a taxa básica de juros do país.
Em sua atuação, o banco central procura manter o poder de compra da moeda nacional (combate à inflação) e garantir o pleno funcionamento do sistema financeiro, visando à segurança da economia.
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Essa instituição também serve como uma espécie de “banco do governo”, uma vez que realiza as operações necessárias para financiar os gastos públicos e administra as reservas internacionais.
Elas funcionam como um “colchão de segurança” que ajuda a manter a funcionalidade do mercado de câmbio, de forma a atenuar oscilações bruscas da moeda local perante o dólar, dando maior previsibilidade e segurança para os agentes do mercado.
O que pode acontecer com o fim do banco central argentino?
Caso Milei venha a ser bem-sucedido em sua proposta, as taxas de juros seriam determinadas unicamente pelo mercado, e o dinheiro em circulação seria apenas o dólar dos Estados Unidos. Dessa forma, o país teria menos ferramentas para poder lidar com crises econômicas próprias, ao passo que ficaria muito exposto no caso de problemas na economia americana e crises externas.
A economia argentina ficaria dependente de decisões do Federal Reserve, o Banco Central dos Estados Unidos, que não vai considerar ou priorizar a economia do país sul-americano na hora de tomar suas decisões.
Outro ponto é que, em ciclos econômicos de baixas ou altas nas commodities, muito mais relevantes nas economias latino-americanas, o país teria pouca margem de manobra para tentar evitar problemas ou aproveitar as altas.
O Panamá, país que não conta com um banco central desde que se tornou independente da Colômbia em 1903, tem taxas de inflação menores que a dos outros países latino-americanos e nunca passou por um colapso financeiro ou crise monetária. Com uma lei que garantiu a liberalização do setor bancário em 1971, passou a atrair grandes bancos internacionais e há grande concorrência entre as instituições financeiras.
Contudo, o sistema do país sofreu um forte abalo na confiança com o escândalo dos Panama Papers, em 2016, quando 11,5 milhões de documentos do escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca foram divulgados, detalhando a criação de empresas no país e em outros paraísos fiscais por parte de empresas e pessoas ricas para escapar de impostos nos países de origem.
Ainda hoje, o Panamá consta na lista da União Europeia de “jurisdições não cooperantes para efeitos fiscais”, ou seja, como um paraíso fiscal.
É possível?
Como as propostas de fechar o Banco Central e dolarizar a economia caminham juntas, Milei teria grandes dificuldades de conseguir apoio legislativo para aprová-las. Isso porque o seu partido, o “La Libertad avanza”, tem 37 cadeiras no Parlamento, enquanto, para se ter maioria, são necessários 129.
Contando com a coalização “Juntos por el Cambio”, de centro-direita e ligada ao ex-presidente Mauricio Macri, que apoiou Milei no segundo turno, somaria-se 93 deputados a mais - no entanto, o apoio destes não é garantido.
No Senado, o partido de Milei elegeu oito congressistas. A “Juntos por El Cambio” tem 24, enquanto a maioria é formada com 37 senadores. Assim, a Casa também deve dificultar os planos do presidente eleito.
Outra dificuldade apontada por especialistas é de ordem prática: para dolarizar a economia, a Argentina precisaria ter uma reserva em dólares muito maior do que a que tem atualmente, o que seria mais um desafio para Milei.
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