BRASÍLIA - O Congresso Nacional promulgou de forma fatiada a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, que abre espaço no Orçamento para o pagamento do Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família. O governo pretende pagar, no mínimo, R$ 400 mensais aos beneficiários do programa criado para ser a marca da gestão Jair Bolsonaro.
Após uma discussão com a senadora Simone Tebet (MDB-MS), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), manteve a decisão de promulgar a mudança no cálculo do teto de gastos (a regra que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação) a partir do ano que vem.
O trecho promulgado que altera a regra de correção inflacionária do teto de gastos, segundo a Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados (Conof), abre espaço fiscal de R$ 64,9 bilhões no próximo ano. Já o Ministério da Economia estima um valor um pouco mais baixo, de R$ 62,2 bilhões.
De acordo com o Ministério da Economia, boa parte do valor (R$ 42,7 bilhões) já seria consumida por gastos obrigatórios inadiáveis e independentes da PEC, como a correção dos benefícios do INSS pela inflação, a parte do teto reservada aos demais poderes e os pisos para as despesas com saúde e educação. Dessa forma, sobrariam R$ 19,5 bilhões de espaço no teto para o Auxílo Brasil de R$ 400, menos do que o necessário, segundo o governo.
Outros dispositivos, como o limite para o pagamento de precatórios (dívidas que o governo precisa pagar depois de ser condenado na Justiça), com espaço de outros R$ 43,8 bilhões, dependerão de votação na Câmara. Sem a aprovação desse item, o governo teria que pagar todos os precatórios previstos no Orçamento do próximo ano. A nova análise deve ser feita diretamente no plenário na próxima terça-feira, 14, em dois turnos, e exige o mínimo de 308 votos favoráveis.
Há temor de que os deputados rejeitem o "carimbo", abrindo margem para outros gastos de interesse do presidente no ano que vem e que a folga seja usada também para incrementar as emendas de relator, que ficaram conhecidas como orçamento secreto. A destinação dos recursos foi um dos principais impasses entre Câmara e Senado. Senadores pressionaram Pacheco para garantir mudanças aprovadas no Senado.
Após reunião com Pacheco na noite de terça-feira, o presidente da Câmara disse "não ter dúvidas" de que a Câmara deverá manter partes das mudanças feitas pelos senadores, mas não se comprometeu com a vinculação do espaço fiscal. "Controle de mérito nem a Câmara fará ao Senado nem o Senado fará à Câmara", disse Lira.
Se promulgada inteiramente, a PEC pode abrir espaço de R$ 106 bilhões, segundo o Ministério da Economia, ou de R$ 108,4 bilhões, segundo a consultoria da Câmara.
Bate-boca
A promulgação que deveria selar a paz entre Senado e Câmara foi palco de um impasse e bate-boca entre Pacheco e Tebet, ambos pré-candidatos ao Palácio do Planalto em 2022.
Simone Tebet e outros senadores críticos à PEC reagiram à decisão da cúpula do Legislativo de fatiar a proposta sem a garantia de vinculação do espaço fiscal em 2022 para transferência de renda e despesas com saúde, previdência e assistência social.
"Eu lamento muito que Vossa Excelência não tenha honrado o compromisso feito nessa Casa quando garantimos os votos para o presidente da República e o seu governo e que não iria fatiar. Lamento muito, essa PEC não passaria", disse Tebet, para quem o fatiamento só seria feito sem a promulgação dos dispositivos que abrem espaço fiscal em 2022.
"Eu não estou conhecendo a sua arguição de descumprimento de acordo", disse Pacheco. "Não sei qual é a intenção de Vossa Excelência nisso, minha intenção é resolver o Bolsa Família", retrucou o presidente do Senado, que acusou Tebet de estar fazendo discurso eleitoral. "Eu não fiz acordo nenhum com Vossa Excelência de não promulgar a parte comum, a senhora vai me desculpar."
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