Com o arcabouço fiscal aprovado no Congresso e caminhando para a sanção presidencial, a dúvida agora será sobre como o governo fechará a conta nos próximos anos. Muito já se falou sobre o caráter de evitar riscos de cauda da proposta, ou seja, não termos aumento explosivo de dívida nos próximos anos. Mas será isso suficiente?
O fato é que o governo tem dado sinais dúbios sobre a questão fiscal a todo momento. Começou com a PEC da Transição, que dinamitou o superávit primário que se poderia ter este ano.
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O arcabouço fiscal evita riscos maiores, mas deixa em aberto como o governo conseguirá chegar ao superávit primário zerado em 2024. De julho deste ano até o final do ano que vem, deveremos ter cerca de R$ 170 bilhões de déficit. Com a queda da receita depois do boom das commodities não será nada fácil fechar essa conta.
Na verdade, ela provavelmente não será fechada, e o governo terá que rever o arcabouço já no ano que vem para acomodar um resultado negativo. Por mais que os projetos referentes aos fundos exclusivos e offshore aconteçam, não seriam suficientes para conter o déficit do ano que vem.
Mas isso tudo fica ainda mais difícil quando lembramos que, para atingir as metas propostas de primário no arcabouço até 2026, o governo terá que sacar dois pontos porcentuais a mais de carga tributária, cerca de R$ 350 bilhões até o último ano de governo, caso queira chegar minimamente perto do proposto.
O problema é que o desenho da proposta fiscal depende excessivamente da boa vontade do Congresso em aumentar os impostos e de que ocorra um crescimento econômico relevante. Sem adequar corretamente a estrutura de gastos, o cenário de entrega dos resultados será um desafio a cada ano.
Para piorar, as pressões se acumulam para aumentar os gastos. Surgem ideias de subsídios para a indústria e retiradas de investimentos da regra para o PAC. Nós já vimos muito esse filme no passado e ele terá que ser muito bem dirigido para não causar os estragos de antes. Ano que vem será essencial para sabermos o grau de responsabilidade fiscal efetiva do governo./Sergio Vale é economista-chefe da MB Associados
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