Até onde o Copom terá de levar os juros e como isso impacta a economia? Veja o que dizem economistas

Copom acelerou nesta quarta-feira, 11, o ritmo da alta da taxa básica de juros para 1 ponto porcentual e levou a Selic para 12,25%

PUBLICIDADE

Publicidade
Foto do author Luiz Guilherme  Gerbelli
Atualização:

O Comitê de Política Monetária (Copom) acelerou nesta quarta-feira, 11, o ritmo da alta da taxa básica de juros para 1 ponto porcentual e colocou a Selic em 12,25%.

PUBLICIDADE

Foi o terceiro aumento seguido promovido pelo Copom, numa tentativa de trazer de volta as expectativas para o centro da meta de inflação, que é de 3%. O comitê indicou que deve continuar a subir os juros. Nas próximas duas reuniões, deve repetir a alta de 1 ponto porcentual, colocando a Selic em 14,25%.

Abaixo, analistas convidados pelo Estadão apontam até onde o Copom terá de elevar os juros e qual será o impacto na economia.


Felipe Salles: ‘Alta dos juros não está sendo suficiente para conter a inflação’

Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank Foto: Werther Santana/Estadão

O primeiro ponto a considerar antes de começar qualquer análise sobre os próximos passos do Banco Central é que a política monetária brasileira não está funcionando em seu modo habitual.

Publicidade

Geralmente, o impacto de uma alta de juros sobre a inflação não se dá de forma direta, e sim por meio dos chamados canais de transmissão da política monetária. O câmbio é um deles. Juros elevados costumam atrair capital externo, o que faz o dólar cair e puxa para baixo o preço dos produtos importados, aliviando a inflação.

Hoje, esse canal não está funcionando, tanto que, apesar da alta dos juros, o dólar chegou a superar os R$ 6. O que explica isso, na nossa visão, é a elevada dívida pública brasileira. Uma alta de juros, nesse contexto, faz aumentar rapidamente o déficit público nominal, que é aquele que inclui o montante de juros a ser pago pelo governo. Essa dinâmica piora a trajetória da dívida, gera aversão ao risco e pressiona o dólar.

Outro canal de transmissão relevante é o da própria atividade econômica. Juros mais altos normalmente reduzem a demanda agregada e, dessa forma, contribuem para diminuir a pressão sobre os preços. Mas, assim como o câmbio, esse canal não está apresentando o resultado esperado. Uma política fiscal expansionista, com injeção forte de estímulos fiscais, tende a desfazer os efeitos da alta de juros, porque joga contra a necessária desaceleração da economia. Enquanto a política monetária pisa no freio, a política fiscal pisa no acelerador. Sabemos que não é assim que o carro vai desacelerar.

Há evidências, portanto, de que a alta dos juros não está sendo o suficiente para conter a inflação. Sem uma política fiscal contracionista, o Banco Central deve continuar subindo os juros, pelo menos até maio do ano que vem. Para 2025, considerando a decisão de hoje do Copom e o tom do comunicado, vamos revisar para cima nossa projeção de Selic, hoje em 13,75%.

Publicidade

É economista-chefe do C6 Bank

Leonardo Costa: ‘BC deveria elevar a taxa básica de juros para 16,75%’

Leonardo Costa, economista do ASA Foto: Divulgação/ASA

O Banco Central subiu em 100 pontos-base (1 ponto porcentual) a taxa básica de juros na reunião de dezembro. Seu comunicado reconhece a forte piora dos indicadores nas últimas semanas, bem como as suas projeções — com seu modelo indicando IPCA de 4% no segundo trimestre de 2026, distante da meta e dentro do seu horizonte relevante. A decisão e o comunicado foram duros, com indicação de mais duas altas de 100 pontos-base nas próximas reuniões do Copom, em janeiro e março.

Nossa projeção é de mais duas altas de 1 ponto, com a Selic indo até 14,25%. Contudo, consideramos que o BC deveria elevar a taxa básica de juros em mais 450 pontos-base (4,5 pontos porcentuais), em três altas de 150 pontos (1,5 ponto porcentual) cada, após o aumento de 100 pontos-base anunciado hoje. Assim, a taxa Selic subiria de 12,25% para 16,75%.

Esse movimento agressivo poderia ser considerado um choque de juros e teria potencial para trazer a inflação para próximo da meta no horizonte relevante de política monetária, no segundo trimestre de 2024. Os efeitos esperados dessa estratégia seriam a desaceleração da atividade econômica — a economia doméstica operaria abaixo do seu potencial, refletindo menores níveis de consumo e investimento. No entanto, o PIB ainda teria crescimento positivo. E a valorização do câmbio, devido à atratividade dos juros elevados para investidores estrangeiros, contribuindo também para conter pressões inflacionárias via preços de importados.

Publicidade

*Economista do ASA

Luís Eduardo Assis: ‘Ajuste será feito na inflação, que tem tudo para ficar acima da meta’

Luís Eduardo Assis, ex-diretor do Banco Central Foto: Hélcio Nagamine/Estadão - 23/9/2021

Talvez a baixa autoestima da profissão seja capaz de explicar a eterna disposição dos economistas de tentar adivinhar o futuro. Há também o conforto de poder contar com a memória fraca de quem pergunta, de boa-fé, o que vai acontecer. Em dezembro do ano passado, a pesquisa Focus conduzida pelo Banco Central nos dizia que os economistas do mercado esperavam um crescimento do PIB em 2024 da ordem de 1,5% — será mais que o dobro disso. A taxa de câmbio fecharia o ano em R$ 5, muito abaixo dos quase R$ 6 que se espera agora. A Selic, por sua vez, deveria estar agora em 9%, se as previsões feitas há um ano estivessem certas. Muito menos do que os 12,25% que teremos. Deu tudo errado, o que ajuda a entender o azedume atual dos operadores.

A discussão a respeito da possibilidade de o Banco Central poder alterar sua forma de atuação, no contexto de uma diretoria majoritariamente escolhida pelo presidente Lula, parece estar superada. Tudo sugere – e o mercado aposta – que pouco ou nada mudará, prevalecendo o pragmatismo conciliatório. Não é pouca coisa, considerando que as limitações do regime de metas de inflação, da forma como o conhecemos, começam a ser questionadas até por economistas ortodoxos de grande reputação (vide Whiter inflation targeting as a global monetary standard?, de Claudio Borio, BIS Working Papers, dezembro de 2024).

Aqui os problemas são menos sutis. Combater a inflação exclusivamente através da taxa Selic em uma economia indexada, fortemente exposta aos preços internacionais, no contexto de uma política fiscal expansionista, embute uma grande ineficácia, da qual resulta a necessidade de juros extraordinariamente elevados. Ainda assim, não é provável que a Selic fique acima de 13% em 2025. Da mesma forma, não é provável que tenhamos uma política fiscal mais contida, até porque o governo, inadvertidamente, deverá priorizar o crescimento da renda e do emprego, a qualquer custo. Nessas condições, o ajuste será feito na inflação, que tem tudo para ficar acima da meta, aproximando-se de 5%. A conferir (ou não).

Publicidade

*Economista, ex-diretor de política monetária do Banco Central do Brasil

Sergio Vale: ‘Selic a 15% coloca um grande risco de uma desaceleração mais grave às portas da eleição’

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados Foto: Gabriela Biló/Estadão

Na falta de uma política fiscal adequada, sobrou integralmente para o Banco Central o trabalho de conter as expectativas de inflação. Corretamente, o banco subiu a taxa em um ponto e já sinalizou mais duas altas iguais. O ciclo final deverá se aproximar de 15%, alta minimamente necessária para se estabilizar a inflação abaixo do teto da meta para 2025 e 2026.

O ponto central aqui é que não há clareza por parte da maioria do governo e do Congresso de quão grave é a situação fiscal. O primário necessário para estabilizar a dívida pública bruta se encontra em torno de 3,5% e estamos muito provavelmente falando de déficits primários de 0,7% do PIB, mesmo com o governo alcançado os objetivos traçados no pacote anunciado.

Por isso, não tem alternativa para o Banco Central. Hiato do produto crescente, com preços de serviços em aceleração e taxa de câmbio caminhando para se estabilizar em torno de R$ 6 coloca a necessidade, novamente, de o BC ter de fazer o trabalho que o governo nega fazer na política fiscal. Mas Selic a 15% coloca um grande risco para o próprio governo de uma desaceleração mais grave às portas da eleição. Com isso, Lula se parece cada vez mais com o governo Dilma.

Publicidade

*Economista-chefe da MB Associadas

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.