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Copom: mercado vê queda de 0,5 ponto na Selic esta semana e pouco espaço para acelerar cortes

Para analistas, cenário externo é o principal desafio para o BC neste momento; fala de Lula sobre meta fiscal adiciona um novo ingrediente nessa equação

Foto do author Marianna Gualter
Foto do author Eduardo Rodrigues
Atualização:

São Paulo e Brasília - O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central se reúne nesta terça, 31, e quarta-feira, 1º, para definir a nova Selic, a taxa básica de juros da economia. O mercado é unânime ao prever um corte de 0,5 ponto porcentual, o que levaria os juros dos atuais 12,75% para 12,25% ao ano.

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E os analistas veem a barra agora um pouco mais alta para o BC acelerar esses cortes, por conta principalmente da questão internacional, um pouco mais instável após o início da guerra entre Israel e Hamas. Esse cenário ainda recebeu, na sexta-feira, 27, um novo ingrediente, quando o presidente Lula disse que não faz sentido o Brasil perseguir uma meta de déficit fiscal zero em 2024.

Pesquisa feita pelo Projeções Broadcast com 57 instituições mostra que o corte de 0,5 ponto esta semana é unânime. Em relação à reunião que será realizada em dezembro, 55 também projetam outra queda de 0,5 ponto, enquanto duas preveem um corte um pouco maior, de 0,75 ponto. A mediana das respostas indica, portanto, uma Selic de 11,75% no fim deste ano. No fim do atual ciclo de cortes, a projeção é de uma taxa de juros de 9%.

Para Maurício Une, economista-chefe do Rabobank Brasil, o ambiente externo figura como o principal elemento que limita as chances de cortes mais profundos. “A guerra Israel-Hamas traz certa tensão para o mercado de petróleo global. Mesmo que nesse momento ainda não tenhamos visto maiores repercussões do conflito sobre esse mercado especificamente, estamos com um olhar mais atento para o que pode acontecer com o desenrolar da crise”, diz. Ele também cita o aperto das condições financeiras globais como um dos fatores que demandam maior cautela em relação ao ritmo de cortes.

O economista prevê manutenção dos cortes de 0,5 ponto durante o início de 2024, seguida por uma desaceleração para reduções de 0,25 ponto a partir do segundo trimestre do ano. Os cortes menores devem durar até a primeira reunião do Copom de 2025, quando o ciclo deve encerrar com Selic em 9%, projeta.

Une admite que os dados recentes corroboram uma tendência de desinflação e destaca o alívio registrado pelo núcleos de serviços no IPCA-15 de outubro, divulgado na semana passada. Ele pondera, no entanto, que o efeito potencial do El Niño sobre a inflação doméstica segue como ponto de atenção. “É algo que olhamos como um fator de cautela e justifica cortes mais suaves da taxa de juros”, diz. O Rabobank prevê alta de 4,8% para o IPCA em 2023, desacelerando para 3,9% em 2024.

O economista para Brasil do Barclays, Roberto Secemski, corrobora a avaliação de que a melhora dos núcleos de inflação, ainda que bem-vinda, não é suficiente para inclinar o Copom para um corte de 0,75 ponto nesta reunião. Secemski analisa que, além de um novo corte de 0,5 ponto, o colegiado deve repetir a maior parte da comunicação da última reunião e sinalizar que planeja manter o ritmo de flexibilização.

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“Considerando a crescente complexidade do cenário global e as próximas mudanças no conselho previstas para o início de janeiro, pensamos que menos é mais agora”, escreveu, em relatório. “O que significa que o conselho provavelmente irá se abster de balançar o barco com mudanças que podem gerar mais ruído ou incerteza nesse meio tempo.” O Barclays reitera o cenário base de uma série de cortes de 0,5 ponto nas próximas reuniões, com redução da taxa Selic a 9,5% no fim do ciclo, em meados de 2024.

Contraponto

A economista para o Brasil do BNP Paribas, Laiz Carvalho, prevê cortes de 0,5 ponto na taxa Selic nas duas últimas reuniões do ano, mas antevê aceleração do ritmo para 0,75 ponto a partir da reunião de janeiro. Ela avalia que o cenário de inflação doméstica continua bem comportado e que as incertezas do cenário global no momento deverão se dissipar à frente, permitindo um corte maior no juro.

“O IPCA-15 mostrou que a inflação continua desacelerando, com uma composição de média de núcleos e serviços subjacentes comportada. Foi uma notícia muito boa para o Banco Central”, afirma. “Não fosse o cenário global incerto, teríamos mais discussões sobre a aceleração dos cortes.”

O BNP prevê cortes de 0,75 ponto até a reunião de maio de 2024, seguidos de duas reduções de 0,5 ponto nos encontros de junho e julho, levando a uma Selic de 8,5% no final do ciclo. O cenário do banco considera que os Estados Unidos devem iniciar o ciclo de redução nos juros no segundo trimestre de 2024, o que deve permitir que o Brasil leve a Selic mais próxima do nível considerado neutro, avalia a economista.

Meta fiscal

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Apesar da forte reação do mercado à fala do presidente Lula, que praticamente jogou a toalha sobre o cumprimento da meta de primário zero em 2024, a percepção de maior leniência com o déficit nas contas públicas não deve alterar a comunicação do Copom nesta semana. Na avaliação de economistas consultados pelo Estadão/Broadcast, o colegiado já deu o seu recado sobre o fiscal e deve mantê-lo inalterado nesta quarta-feira, 1º.

Enquanto o Copom deixou explícito no comunicado da reunião de setembro o “reforço à importância da firme persecução das metas fiscais já estabelecidas”, Lula admitiu na última sexta-feira, 27, que o governo “dificilmente chegará à meta zero”, até porque o chefe do Executivo “não quer fazer cortes em investimentos e obras”.

Para o estrategista-chefe da Warren Rena, Sérgio Goldenstein, a sinceridade de Lula não altera o jogo do Copom, que já vinha considerando o risco fiscal em seu cenário. Ele lembra que o próprio mercado nunca acreditou em um resultado primário zero no próximo ano, já que o consenso do Boletim Focus até piorou, de 0,75% para 0,78% do PIB, conforme divulgado pelo BC nesta segunda-feira, 30.

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Reunião do Copom será nesta terça e quarta-feira Foto: Dida Sampaio/Estadão

“As declarações de Lula foram ruins, mas o que não pode acontecer é uma mudança de meta de primário. O mercado já não acreditava no déficit zero. O importante é que, caso o resultado fique fora do intervalo de 0,25% ponto porcentual do PIB, os gatilhos de despesas sejam acionados. Se for alterada a meta, o arcabouço perde eficácia. Isso aumentaria o prêmio de risco, levaria a uma desancoragem ainda maior das expectativas, e aí, sim, repercutiria nas decisões futuras do Copom”, avalia.

O economista da XP Rodolfo Margato concorda que o Copom não deve pesar ainda mais a comunicação para rebater a fala de Lula, até mesmo porque essa não seria a função do Banco Central.

“O Comitê deixou claro na sua comunicação recente a importância de se buscar o equilíbrio no resultado primário e transmitiu bem a mensagem sobre o impacto dos riscos fiscais sobre as expectativas inflacionárias. A comunicação foi bem dosada nos documentos recentes, e o último Relatório Trimestral de Inflação, inclusive, trouxe um box sobre como a desancoragem das expectativas para 2025 está relacionada com a percepção de descumprimento da meta fiscal em 2024. O Copom já expressou bem o seu diagnóstico”, acrescenta.

Ambos os economistas esperam que o Copom mantenha o plano de voo na quarta-feira, sinalizando a manutenção do ritmo de cortes da Selic em 0,5 ponto porcentual nas próximas reuniões. Goldenstein lembra que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, e os demais diretores da instituição mantiveram o discurso desde a última reunião de que a “barra é alta” para mudar o passo da política monetária para cima e para baixo. Ele estima uma Selic em 9% no fim de 2024, enquanto a mediana do Focus subiu de 9% para 9,25% no boletim desta segunda-feira.

Já Margato reforça que a XP enxerga um ciclo mais curto de ajuste, com a Selic mais alta no fim do ciclo, em 10% ao ano. Mas, como os dados recentes de inflação mostraram uma abertura benigna do IPCA e confirmaram um ritmo mais fraco na atividade, o espaço para flexibilização monetária no passo de 0,5 ponto permanece para este e os próximos encontros.

“Mesmo assim, nunca chegamos a projetar uma Selic abaixo de 10%. Na nossa visão, pesam as incertezas fiscais e a dificuldade de estabilização da dívida pública. E temos uma visão diferente sobre política monetária dos Estados Unidos. Para nós, o principal canal é a expectativa de inflação de longo prazo, estacionada em 3,5% há bastante tempo, e desconfiamos que poderá subir ao longo de 2024. Aqui reside a nossa maior diferença com o modelo do BC”, completa.

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