BRASÍLIA - O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) reconheceu nesta quarta-feira, 11, a piora do cenário prospectivo para a inflação e chamou para si a responsabilidade de reancorar as expectativas do mercado. Na última reunião sob o comando de Roberto Campos Neto, o colegiado aumentou a Selic em 1 ponto porcentual - mais do que indicava a mediana do mercado - e prometeu altas da mesma magnitude nos dois próximos encontros, já sob o comando de Gabriel Galípolo.
Se esse cenário se concretizar, o BC levará a Selic a 14,25% em março do ano que vem. Seria o maior nível nominal dos juros desde o segundo governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), quando a taxa ficou neste nível de julho de 2015 a outubro de 2016, diante de uma inflação que chegou a superar 10% ao ano. Também é 0,5 ponto porcentual maior que a mediana do último relatório Focus, que indicava alta dos juros até 13,75% no fim do ciclo de aperto.
A promessa de austeridade vem após uma piora generalizada no cenário, que se tornou “menos incerto e mais adverso”, nas palavras do próprio comitê, por causa da materialização de vários riscos. A reação dos agentes do mercado ao pacote de corte de gastos do governo afetou “de forma relevante” os preços de ativos e as expectativas, o que levou a uma dinâmica inflacionária também “mais adversa”. O Produto Interno Bruto (PIB) cresceu mais do que o esperado no terceiro trimestre, indicando abertura adicional do “hiato do produto” - ou seja, a economia tem crescido a um ritmo ainda mais forte que sua capacidade.
“O cenário mais recente é marcado por desancoragem adicional das expectativas de inflação, elevação das projeções de inflação, dinamismo acima do esperado na atividade e maior abertura do hiato do produto, o que exige uma política monetária ainda mais contracionista”, diz o comunicado.
A promessa de juros maiores é consistente com as projeções do colegiado. O BC espera um IPCA de 4% no segundo trimestre de 2026 - horizonte relevante da política monetária - considerando a trajetória de juros do Focus, o que indica que uma Selic de 13,75% ao fim do ciclo de alta seria insuficiente para garantir a convergência. Ao mesmo tempo, a sinalização futura também busca reforçar a credibilidade de Galípolo - indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que é crítico do nível dos juros - no momento em que a âncora fiscal se enfraquece.
Quando iniciou o processo de flexibilização dos juros em agosto de 2023 - ao reduzir de 13,75% para 13,25% a Selic -, o colegiado passou a indicar que faria reajustes da mesma magnitude, se mantido o cenário, “nas próximas reuniões”. Foi em uma coletiva de imprensa que Campos Neto esclareceu que essa expectativa valeria para dois encontros. O comitê seguiu dando o forward guidance (projeção dos passos futuros) até o encontro de março deste ano, quando sinalizou que faria mais um corte de 0,5 ponto porcentual na taxa básica de juros em maio.
Entre as reuniões, o governo alterou a meta fiscal, o que desencadeou o início do processo de desancoragem das expectativas. Quando o Copom se reuniu, em maio, reduziu a Selic em 0,25 ponto porcentual, para 10,50%, em decisão dividida, que opôs justamente os indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos diretores que já compunham o colegiado. Foi aí que o BC decidiu abandonar o instrumento de forward guidance.
A retomada da sinalização resguarda o início da gestão Galípolo na autoridade monetária. Além dos apontamentos sobre o nível dos juros, vários integrantes do PT criticam a posição do BC em relação à escalada do dólar. A própria presidente da sigla, Gleisi Hoffmann, já classificou como “irresponsável, insana e desastrosa” a decisão desta quarta-feira.
Agora, não apenas o futuro presidente estará sob a mira do PT, mas toda a diretoria - já que, a partir de janeiro, os indicados por Lula serão maioria no Copom.
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