Crise imobiliária persiste como obstáculo para a economia da China, e setor deve perder relevância

Apesar dos esforços do governo chinês para estimular mercado imobiliário e do aumento nos gastos de consumo, medidas não têm sido suficientes para evitar desaceleração da atividade econômica

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A crise imobiliária ainda representa um obstáculo para retomada econômica na China, que apresenta sinais de enfraquecimento no mercado interno. Para analistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast, o setor deve perder relevância para o sistema financeiro do país no longo prazo.

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Na semana passada, a Country Garden, uma das maiores incorporadoras imobiliárias chinesas, efetuou o pagamento de dois títulos emitidos no mercado doméstico para evitar calote, apenas dois dias após anunciar que poderia recorrer a um fiador estatal. A situação reflete o contexto do mercado imobiliário, com menos projetos e pagamentos antecipados de hipotecas.

Segundo o advogado Emanuel Pessoa, professor da Chinese Foreign Affairs University, o setor não deve se recuperar no curto prazo. Se a retomada vier, será com base em “investimentos públicos, e com mais rigor sobre financiamento e construções para evitar bolhas futuras”, afirma.

O analista de Macroeconomia e Energia da Hedgepoint Global Markets, Victor Arduin, destaca que a crise imobiliária segue como um fator importante na desaceleração da economia chinesa neste ano, apesar de reconhecer que ela não parece ter impactado severamente o sistema financeiro do país.

Construção civil era um dos maiores motores do crescimento chinês Foto: Jade Gao / AFP

“Os primeiros meses de 2024 continuam a apresentar tendências de baixa para o setor imobiliário, com quedas de mais de 25% nas vendas de imóveis residenciais e investimentos em queda. Em 2013, o setor imobiliário representava 12% do PIB do país, enquanto para este ano as projeções indicam um valor um pouco acima de 5%”, coloca Arduin.

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Apoio fiscal e monetário

A desaceleração do setor preocupa o governo chinês, que lançou medidas para estimular a demanda. Em fevereiro deste ano, o Ministério da Habitação e Desenvolvimento Urbano-Rural aprovou US$ 17,2 bilhões em empréstimos para financiar projetos do mercado imobiliário. No mesmo mês, o equivalente ao banco central do país, o Banco do Povo da China (PBoC), reduziu a LPR de 5 anos, importante taxa de juros de referência, pela primeira vez desde junho de 2023.

O esforço parece não ter surtido o efeito desejado, já que o NBS, escritório oficial de estatísticas do país, apontou na quinta-feira, 16, que os preços das novas habitações caíram 3,51% em abril na comparação anual. Na sexta, 17, o PBoC anunciou a remoção dos pisos das taxas hipotecárias para primeira e segunda residências. Além disso, declarou também redução da taxa de adiantamento de hipoteca para mínimo de 15% para primeiras residências e 25% para segundas habitações.

Para a Capital Economics, embora haja uma previsão de suporte governamental a curto prazo e um aumento nos gastos de consumo, isso não será suficiente para evitar uma futura desaceleração da atividade econômica. Ainda conforme a empresa, a construção civil, em particular, deve enfrentar uma contração considerável nos próximos anos.

O economista-chefe da Pantheon Macroeconomics na China, Duncan Wrigley, afirma que uma nova redução na taxa de juros na China teria efeito limitado, já que o setor imobiliário está estagnado e outros segmentos importantes se queixam da falta de demanda. “O governo está oferecendo apoio fragmentado ao mercado imobiliário, que até agora não conseguiu trazer de volta compradores e restaurar a confiança”, diz Wrigley. O analista complementa dizendo que não se surpreenderia se incorporadoras chinesas, mesmo aquelas bem geridas, como Country Garden e Vanke, apresentassem novamente dificuldades para honrar dívidas.

Arduin, da Hedgepoint, argumenta que, ao contrário de 2023, quando a reabertura da economia pós-pandemia de covid-19 impulsionou o crescimento, o país precisará de medidas fiscais e monetárias para alcançar a meta de expansão de cerca de 5%. “Ainda é incerto se as políticas atuais serão suficientes, mas o corte em fevereiro da LPR de 5 anos demonstrou uma mudança na postura de Pequim e sinalizou que o governo está atento à crise do setor”, menciona.

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O economista reitera que o governo chinês deverá intervir para evitar uma crise sistêmica no mercado imobiliário. Para o longo prazo, entretanto, Arduin crê que a combinação da crise com o encolhimento da população chinesa deverá fazer com que o setor imobiliário perca relevância para o PIB do país.

“Diante desse cenário, o governo busca impulsionar o mercado interno e as exportações de alto valor agregado, como celulares, carros e outros produtos, direcionando a economia para um modelo mais focado no consumo do que na construção civil”.

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