Com a retomada do ciclo de alta dos juros básicos pelo Banco Central, as instituições financeiras e as construtoras já vislumbram uma elevação das taxas cobradas no crédito imobiliário. Na semana passada, o Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a Selic em 0,25 ponto porcentual, para 10,75% ao ano. A expectativa do mercado é que o aperto monetário ocorra até janeiro de 2025, quando alcançaria 12% ao ano.
A vice-presidente de Habitação da Caixa Econômica Federal, Inês Magalhães, afirmou que o banco manterá a taxa inalterada neste ano caso o volume de financiamentos permaneça como planejado. Já se a demanda for além, o banco avaliará uma possível subida.
“Para 2024, vamos trabalhar com essa taxa de juro (cerca de 9% a 10% ao ano). Para o orçamento de financiamento previsto, estamos tranquilos”, disse Magalhães. A Caixa liberou R$ 39,5 bilhões em crédito imobiliário neste ano até julho, o equivalente a 56,4% do teto do orçamento anual, de R$ 70 bilhões. “Se tivermos de ampliar o orçamento, aí teremos de precificar qual será a taxa”, ponderou.
No Itaú BBA, o sócio e diretor de Negócios Imobiliários, Bruno Bianchi, disse que há possibilidade de uma subida da taxa do crédito imobiliário nos próximos meses se não houver uma reversão no rumo dos juros da economia brasileira — algo pouco provável no curto prazo.
“É possível ver uma alta na taxa de juros do crédito imobiliário nos próximos meses se não houver uma mudança de tendência dos juros do País”, afirmou Bianchi. “Não tem muito como escapar dessa situação.”
Ele admitiu que essa não é uma notícia boa para o setor imobiliário, que tem uma demanda intensiva de capital, seja para a construção de moradias quanto para a venda. Por outro lado, o executivo disse que há um esforço em segurar ao máximo as taxas, considerando que o crédito imobiliário é a maior carteira setorial, com inadimplência reduzida, e fidelização dos clientes por vários anos. “Qualquer ajuste será feito com parcimônia.”
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O superintendente executivo de Empréstimos e Financiamentos do Bradesco, Thiago Lisboa Spessoto, disse que o ciclo de alta da Selic gera uma pressão relevante de elevação das taxas praticadas pelas instituições financeiras. “A pressão sobre o spread (diferença entre o que os bancos cobram dos tomadores de crédito e o quanto pagam para os depositantes) é na veia”, enfatizou.
Spessoto explicou que há um esgotamento na oferta de recursos da caderneta de poupança para abastecer o financiamento imobiliário. Dessa forma, os bancos têm buscado fontes alternativas de recursos, cujo custo de captação está atrelado à Selic. “Estaremos mais suscetíveis às variações dos juros. Se o juro sobe, põe pressão sobre o spread dos bancos.”
Incorporadoras trabalham com perspectiva de alta dos juros
O diretor Financeiro e de Relações com Investidores da Cyrela, Miguel Mickelberg, classificou como “frustrante” a mudança na direção da Selic, já que as previsões de economistas no início de 2024 era de um ciclo de redução dos juros ao longo do ano. “É uma frustração grande começar o ano esperando uma taxa de juro de um dígito e ver o cenário atual mudando completamente”, disse o executivo.
Mickelberg contou que, por ora, não houve mudança de taxa nem de condições de financiamentos dos bancos aos clientes na etapa de entrega das chaves de imóveis vendidos na planta. No entanto, a tendência é que o mercado fique mais apertado nos próximos meses, estimou. “Acredito que os bancos vão ter algum reajuste na taxa. Ainda não vimos nada disso, é uma opinião pessoal com base no cenário macroeconômico”, afirmou. Mickelberg acrescentou ainda que as vendas de imóveis da companhia e do mercado “seguem saudáveis”.
O diretor Financeiro e de Relações com Investidores da incorporadora Eztec, Emilio Fugazza, apontou um aumento na procura de financiamento pelos clientes diretamente com a incorporadora. Isso tem acontecido ainda de forma incipiente, mas indica que os bancos andam mais restritivos na concessão de empréstimos. “Os bancos têm buscado atender, mas nem todos os clientes se enquadram. Na média, a taxa de juros está mais alta”, afirmou.
Essa avaliação foi corroborada pela coordenadora de crédito da consultoria MelhorTaxa, Priscilla Basso. “Quanto às taxas, não tivemos mudanças. Mas vimos limitações na oferta dos recursos”, apontou a coordenadora da consultoria que presta serviço de comparação de taxas e condições de crédito.
O presidente da Abrainc, Luiz França, também espera dificuldades para o mercado. “A classe média tem interesse em comprar imóveis, mas encontra dificuldade em obter crédito devido aos juros elevados. Isso não só compromete o orçamento das famílias, que enfrentam obstáculos para financiar a casa própria, como também inibe o lançamento de novos projetos pelas incorporadoras, afetando todo o setor”, afirmou.
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