A decisão da S&P Global, de revisar a perspectiva do rating do Brasil, foi inesperada e indica que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva — ao menos por ora — conseguiu deixar para trás a preocupação de um cenário de retrocesso na agenda econômica do País, de acordo com economistas consultados pelo Estadão.
Nesta quarta-feira, 14, a S&P Global manteve o rating do Brasil em BB-, mas subiu a perspectiva de estável para positiva. No comunicado, a agência afirmou que o risco de as reformas serem revertidas ou fracamente implementadas diminuiu.
“A decisão é positiva e reflete duas coisas: as boas notícias recentes na economia, mas, mais importante, o entendimento do governo nos últimos meses das reformas que eram esperadas, especialmente o arcabouço”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados.
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No campo das boas notícias, a economia brasileira colheu um desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) melhor do que o esperado no primeiro trimestre. O crescimento de 1,9% entre janeiro e março elevou as projeções para o ano para próximo de 2%. A inflação também tem surpreendido para baixo, o que pode abrir espaço para o Banco Central cortar os juros nos próximos meses.
Nas contas públicas, o texto do arcabouço fiscal já foi aprovado na Câmara dos Deputados, e ainda precisa ser votado no Senado. A nova regra não é considerada ideal pelos economistas — porque não será capaz de estabilizar a já elevada relação dívida/PIB do País —, mas, pelo menos, consegue fornecer alguma baliza para o quadro fiscal do País no futuro.
“Uma evolução positiva, embora algo inesperada, uma vez que o novo arcabouço fiscal ainda não foi aprovado, e as perspectivas e o conteúdo final da reforma tributária bem como os seus impactos ainda são incertos”, avaliou Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica do Goldman Sachs para América Latina.
No início da atual administração, havia uma grande preocupação de que o governo Lula pudesse retroceder em pontos importantes. E sinais não faltaram. Houve um confronto público com o Banco Central, o governo tentou alterar o marco do saneamento, e questionou a privatização da Eletrobras.
“Havia uma preocupação grande com o retrocesso de agenda, na reforma trabalhista, na da Previdência, no marco do saneamento. E o Congresso está mostrando que não vai dar aval para esse tipo de retrocesso”, afirma Silvio Campos Neto, economista da consultoria Tendências.
E o grau de investimento?
Embora a S&P tenha melhorado a avaliação do Brasil, os economistas dizem que o grau de investimento está distante e só virá quando o País conseguir estabilizar o seu endividamento.
Em 2015, a S&P retirou o grau de investimento da economia brasileira — uma espécie de selo de bom pagador que dá confiança aos investidores para aplicarem o dinheiro em um País. Em 2019, a agência fez um movimento semelhante, de melhorar a perspectiva de estável para positiva, mas desfez no ano seguinte diante dos estragos provocados pela pandemia na economia global.
“É um movimento positivo, que devolve o Brasil à situação de antes da pandemia. Porém, continua muito distante a ideia de o Brasil conseguir o grau de investimento. Até 2026, a probabilidade é próxima de zero”, afirmou Carlos Kawall, sócio fundador da Oriz Partners e ex-secretário do Tesouro.
Em sua avaliação, se tudo der certo — o que significa o País não retroceder nas reformas e controlar os gastos —, é possível esperar um primeiro upgrade em um prazo de 12 a 18 meses, e uma segunda elevação em dois anos, colocando o rating no limiar do grau de investimento.
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