Delação da JBS põe em xeque apuração privada

Meses antes de os donos da JBS confessarem crimes de corrupção, Veirano Advogados e EY tinham dito que não havia irregularidades na Eldorado

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A delação dos donos da JBS colocou em xeque o trabalho de consultoria e escritórios de advocacia que fazem investigação interna para apurar atos ilícitos nas empresas. No ano passado, Joesley Batista havia contratado o escritório Veirano Advogados e a consultoria Ernst & Young (EY) para apurar irregularidades em uma das empresas do grupo J&F, a Eldorado Celulose. A conclusão assinada pelas duas empresas, em janeiro deste ano, é de que não havia indícios de que os fatos apurados pela Polícia Federal tinham fundamento.

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Apenas dois meses depois, Joesley começou a negociar sua delação, que veio a público em meados de maio. Nela, o executivo confessou que houve crimes nos pontos investigados pelas empresas. Afirmou, por exemplo, que um empréstimo de R$ 946 milhões feito pelo FI-FGTS (fundo de investimentos que usa recursos do FGTS) foi obtido por meio de pagamento de propinas, e que os cerca de R$ 37,4 milhões em pagamentos feitos pela Eldorado a empresas de Lúcio Funaro, apontado como operador do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e intermediador dos empréstimos do FI-FGTS, eram referentes a pagamentos ilícitos.

Eldorado inicia operações florestais de fábrica de celulose Foto: CHICO SIQUEIRA/AE

A dúvida que fica depois disso, segundo um executivo ligado a um dos fundos de pensão sócios da Eldorado, é o quanto se pode confiar nessas investigações. Ele questiona até que ponto os fatos ilícitos podem ser escondidos ou como as investigações podem ser direcionadas, de forma que os resultados escondam o que realmente se passa na empresa. Em função da quantidade de denúncias de corrupção envolvendo empresas no País, a investigação forense – como essa atividade é chamada – ganhou espaço entre as atividades dos escritórios de advocacia. Mas essa possibilidade de os investigadores se esconderem atrás de um “escopo” definido pela empresa preocupa investidores.

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O Estado ouviu cinco advogados especialistas no assunto, que preferiram não ter seus nomes revelados, e eles afirmam que esse serviço tem sido feito muitas vezes com um pensamento antigo: o de que o advogado deve defender seu cliente. Na investigação forense, dizem, isso não pode acontecer, sob o risco de o próprio escritório perder sua credibilidade.

No caso da Eldorado, o argumento do Veirano Advogados é que toda a investigação foi feita dentro do escopo passado pela empresa. Em nota, o escritório afirmou que, “em investigações desta natureza, há escopo de atuação definido pelos órgãos da própria companhia, e o resultado depende das informações por ela disponibilizadas, não tendo o escritório mandato para ir além dos limites contratuais estabelecidos, nem tampouco poder de exigir a produção de provas ou evidências”.

A empresa também destaca que "as conclusões da investigação, incluindo eventuais pontos de atenção e de verificação, foram apresentadas ao Conselho de Administração da Eldorado em sua plenitude e estão resguardadas por cláusula de sigilo profissional, razão pela qual o escritório não irá comentá-las". 

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O Veirano também foi responsável pela investigação feita no BTG Pactual após a prisão de André Esteves, principal acionista do banco, em 2015, envolvido em denúncias na Lava Jato. A conclusão da investigação foi de que, dentro do escopo apresentado pela empresa, não havia irregularidades.

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A EY, por sua vez, já foi responsável por centenas de investigações desse tipo, e garante que a conclusão apresentada ao conselho da Eldorado em janeiro não refletia o trabalho que havia feito. Em entrevista ao [BOLD]Estado [/BOLD]em fevereiro, um sócio da consultoria, Idésio Coelho, afirmou que o resultado do levantamento de dados que era de sua responsabilidade não foi apresentado ao conselho. A empresa é responsável hoje por uma investigação na JBS.

Contestação. Os resultados da investigação relativa à Eldorado foram polêmicos já quando mostrados em reunião do conselho da Eldorado, em janeiro. O conselheiro Max Pantoja, representante da Funcef, fundo de pensão da Caixa, questionou o relatório, apresentado na forma de slides de powerpoint dizendo que não havia irregularidades na empresa. O conselheiro pegou o material e o levou diretamente para os procuradores do Ministério Público Federal que estavam à frente das investigações da Operação Greenfield, que apura irregularidades nos investimentos de fundos de pensão estatais.

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Um dos questionamentos principais na investigação era de como era possível se afirmar que os pagamentos a Funaro não eram relacionados a pagamentos de propinas – levando-se em conta que ele estava preso acusado de liderar o esquema de propinas no FI-FGTS – e que os serviços prestados por ele não condiziam com a atuação da Eldorado.

Às delações de Joesley foram anexadas notas fiscais de pagamentos da Eldorado a Funaro, em sua maior parte, por serviços de consultoria de compra e venda de energia. Funaro nega que as notas eram frias, e diz que os serviços se referiam a um trabalho de mediação que ele fez na briga da JBS com Bertin, depois da fusão das duas empresas. De fato, a J&F tem um contrato de R$ 100 milhões com Funaro, mas que não dizem respeito à Eldorado. 

A J&F disse, em nota, que todos os atos irregulares foram entregues à Procuradoria-Geral.