BRASÍLIA – Autor de uma proposta mais dura de ajuste fiscal, o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) afirma que, de um lado, o governo Lula não acredita em Orçamento equilibrado, e de outro, falta coordenação no Congresso para a aprovação de um pacote fiscal que resolva o desequilíbrio nas contas públicas no longo prazo. O mais provável, diz ele, é que seja aprovado um pacote tímido para fechar o Orçamento de 2025 e, no ano que vem, voltar à carga com um novo arremedo para encerrar o mandato de Lula.
“Há uma extrema incapacidade dos políticos, tanto da esquerda quanto da direita, de olhar (a responsabilidade fiscal) a médio e longo prazo”, diz Pedro Paulo. “O pacote do governo quer olhar o fechamento do Orçamento do ano que vem e alguma coisa para 2026 para terminar o mandato”.
Além disso, diz ele, “há a racionalidade dos políticos, que pensam ‘não vai resolver o problema e ainda quer que eu faça maldade?’ Eles não acreditam que o pacote fiscal vai dar certo e que ainda estão pedindo para tirar direitos sociais, reduzir abono, mudar critérios de entrada no BPC.”
Na semana passada, Pedro Paulo e um grupo de deputados apresentou uma proposta de emenda constitucional com medidas como a desvinculação de benefícios sociais do salário mínimo e a extinção do abono salarial – benefício concedido a trabalhadores formais que recebem até dois salários mínimos. A economia gerada até 2031 poderia chegar a R$ 1,1 trilhão, segundo as estimativas que eles apresentaram.
O projeto animou parlamentares que consideram tímido o pacote do governo, que fala em uma economia de R$ 327 bilhões até 2030, mas não avançou sem o apoio de líderes do Congresso.
A conclusão de Pedro Paulo é que o governo Lula demonstra uma “crença praticamente indestrutível” contra a responsabilidade fiscal – e, na Câmara, falta o convencimento dos líderes partidários.
“Tem o discurso ‘o governo não botou a cara, não teve coragem, e quer que o Parlamento tenha esse desgaste; vamos deixar esse desgaste para o governo’. É uma racionalidade óbvia que funciona com alguns líderes. Falta uma coordenação das lideranças em favor da responsabilidade fiscal”, afirma Pedro Paulo.
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“No governo, há uma percepção de que já foram no limite do limite, de que estão fazendo muito, bem mais do que deveria ser feito, e que a economia vai crescer 3%. Mas no ano que vem não vai ser assim”, afirma. “O governo está ganhando conforto na sua narrativa para a sua base política e está tentando um fôlego para os próximos dois anos para encerrar seu ciclo, mas eu acho que vai colher o preço e vai ser muito mais caro. Pode ser antes da eleição de 2026.”
O parlamentar, assim como boa parte dos economistas, teme que a inflação acelere nos próximos meses como consequência da alta do dólar. A leitura de analistas do mercado financeiro é que o pacote é insuficiente para dar credibilidade ao plano fiscal acertado pelo governo quando apresentou o novo arcabouço fiscal em 2023. Isso fez proliferar apostas de alta da inflação nos anos à frente.
Em meio ao mal-estar instalado no mercado, investidores passaram a esperar que a Câmara possa apertar a proposta do governo, tornando o ajuste mais rigoroso.
Pedro Paulo não enxerga esse cenário como provável e teme por uma desidratação ainda maior. “Nós vamos fazer um arremedo agora para fechar o ano, aproveitar o momento político, e no ano que vem nesta mesma época vamos estar discutindo outro rearranjo do arcabouço fiscal. E em 2026 a mesma coisa, com a dificuldade da proximidade da eleição”, afirma.
Emendas
Pedro Paulo, em conjunto com o deputado Mauro Benevides Filho (PDT-CE), apresentou uma emenda à proposta do governo, sugerindo a redução paulatina de benefícios tributários concedidos a empresas ao longo de dez anos. Ele também crê que é possível reduzir mais o valor do abono salarial para trabalhadores que recebem um salário mínimo – a proposta do governo reduz o benefício para os que ganham até 1,5 salário.
As propostas serão debatidas quando o mérito (conteúdo) do pacote fiscal começar a ser discutido na Câmara. Na noite desta quarta, 4, deputados aprovaram a tramitação em regime de urgência de dois projetos que integram o pacote. Além deles, o governo também enviou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC).
Até o momento, não foram indicados relatores para os projetos. Entre os nomes cotados estão Isnaldo Bulhões (MDB-AL) e Cláudio Cajado (PP-BA), além de Rubens Pereira Júnior (PT-MA) na PEC que trata, entre outros temas, de mudanças no abono salarial e de um limite para os supersalários do funcionalismo público.
Como político, vice-líder do governo na Câmara, ele também interpreta sinais não-econômicos do pacote. Se muitos analistas se ativeram à atuação do ministro Fernando Haddad, Pedro Paulo observa que a timidez do plano de ajuste para o longo prazo sugere que Lula trabalha apenas para fechar o atual ciclo político e não está verdadeiramente empenhado em uma reeleição.
“Mais do que sinais econômicos, há sinais políticos do governo. A pouca ousadia e a falta de visão de médio e longo prazo no pacote mostram a falta de disposição do Lula para enfrentar desgaste e um sinal de que ele pode estar contando mais com uma possibilidade de encerrar o ciclo”, afirma ele.
O segundo indicativo para essa análise deverá ocorrer no início do ano que vem, quando está prevista uma reforma ministerial. O espaço ambicionado e cedido a partidos aliados dará sinais sobre se Lula pode conquistar apoios com vistas a uma eventual reeleição.
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