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Distribuidora de energia fala em possível 'corte emergencial' e leva a receio de racionamento velado

Em cartas enviadas para grandes consumidores de energia, distribuidoras não mencionaram a crise hídrica, mas acenderam um alerta vermelho para a chance de cortes preventivos para evitar blecautes

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Foto do author Marlla Sabino

BRASÍLIA - Cartas enviadas por distribuidoras a grandes consumidores sobre a possibilidade de cortes emergenciais de energia em tempo real levantaram receio no mercado sobre as reais condições de fornecimento de eletricidade no País. Em meio à pior crise hídrica da história, indústrias interpretaram o comunicado sobre um plano de corte de cargas como um racionamento velado. 

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O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), no entanto, afirma que o pedido que gerou a emissão da carta é apenas um procedimento de rotina sem qualquer relação com o momento atual. Nos bastidores, fontes reconhecem que a solicitação foi inadequada, já que abriu margem para interpretações de que as condições de abastecimento se agravaram.

O Estadão/Broadcast teve acesso a um comunicado enviado pela Elektro, concessionária que atua em Campinas (SP), a uma indústria. Na carta, datada de 27 de julho, a concessionária afirma que o ONS pediu às distribuidoras que mantenham em seu controle um “Plano de Corte Manual de Cargas (PCMC)”. A execução desse plano, diz a carta, poderá ser solicitada pelo ONS para manter o controle da frequência do sistema e “de forma a evitar um colapso no controle de tensão, violação de limites de equipamentos ou linhas de transmissão remanescentes”. A distribuidora afirma que as solicitações de corte no consumo serão realizadas em “tempo real” e pede aos operadores da empresa que “estejam cientes e preparados quando do recebimento desta solicitação de forma emergencial”.

Objetivo da carta é permitir que as concessionárias tenham o mapeamento de seus consumidores. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Segundo apurou a reportagem, a mesma carta foi enviada a vários consumidores eletrointensivos - ou seja, que compram grandes quantidades de energia no mercado livre e conectados diretamente à rede de transmissão de energia. Não há na carta nenhuma menção à crise hídrica, risco de racionamento ou apagões, mas alguns agentes interpretaram o comunicado como uma prévia do que esperam para os próximos meses: cortes de carga preventivos para evitar blecautes.

“Acreditando-se que se trata de uma questão rotineira numa crise em que há expectativa de corte de carga, esse tipo de comunicado assusta, pois ogoverno afirma a todo o momento que essa possibilidade não existe. Por outro lado, faz sentidoavisar o consumidor que esse tipo de coisa pode, sim, acontecer”, afirmou o ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) Edvaldo Alves de Santana.

Nos bastidores, cresce a expectativa de que o governo vai fazer tudo para evitar o custo político de um racionamento, que pode ser fatal para o projeto de reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Por isso, especialistas falam em "negacionismo energético". Já há quem acredite que apagões no horário de ponta serão inevitáveis, que os reservatórios das hidrelétricas serão levados ao limite e que a garantia do abastecimento vai depender das chuvas do período úmido - mesma aposta arriscada que o governo Dilma Rousseff fez em 2014.

Apesar desse cenário crítico, a avaliação é a de que a carta enviada pelas distribuidoras aos grandes consumidores diz respeito a um procedimento rotineiro, previsto nos contratos e já feito em outros anos. O objetivo é permitir que as concessionárias tenham o mapeamento de seus consumidores e saibam como atuar em situações como deficiência de geração ou problemas de transmissão.

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Procedimento regular

A carta explica que o plano de corte de cargas deve ser atualizado em razão deum procedimento de rede do ONS emitido em 1º de julho deste ano. Na nova versão do documento, o operador pede às distribuidoras que atualizem o plano de corte manual de cargas e o enviem à gerência de procedimentos operativos - na anterior, o documento deveria ser entregue ao centro de operação. Essa foi a única mudança no documento. Procurado, o ONS informou que cabe às distribuidoras decidir quando vão solicitar as informações aos clientes, desde que elas sejam encaminhadas ao operador até 28 de fevereiro.

Em nota, a Elektro informou que a carta é encaminhada “regularmente” aos consumidores eletrointensivos e que o conteúdo “já consta no contrato de fornecimento com o cliente”. “O envio da correspondência, portanto, não tem qualquer relação com o atual cenário da crise hídrica e apresenta procedimento rotineiro de alívio de carga do Operador Nacional do Sistema (ONS)”, disse a empresa.

Assim como o plano de cortes para os consumidores livres, as regras do setor elétrico também prevê mecanismo semelhante para os consumidores cativos, atendidos diretamente pelas distribuidoras, como os residenciais. Nesse caso, o plano se chama Esquema Regional de Alívio de Carga (ERAC). Esse tipo de procedimento efetua o corte automático de cargas quando há algum problema no sistema, para evitar que as falhas tenham proporções maiores. Exemplo: caso haja saída de alguma usina do sistema ou queda de linha de transmissão, o ERAC corta o fornecimento em um bairro residencial para manter a eletricidade de uma região com concentração de hospitais e linhas de metrô.

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Em paralelo a esses planos, e na tentativa de evitar blecautes, principalmente em momentos em que há maior consumo de energia, o governo negocia com a indústria ações que podem ser adotadas para redução da demanda de empresas que consomem muita eletricidade. Esse modelo, porém, será voluntário, e quem aderir vai receber algum tipo de incentivo financeiro para deslocar a produção para outro momento.

A três meses do início do período úmido, o Ministério de Minas e Energia (MME) ainda não finalizou os estudos para que um programa de resposta à demanda seja submetido à consulta pública. Segundo o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, a proposta deve ser finalizada nos próximos 15 dias. O MME cogitou incluir a possibilidade de uma “racionalização compulsória” em uma Medida Provisória enviada ao Congresso, mas desistiu diante da repercussão negativa após o Estadão/Broadcast revelar o teor da minuta. 

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