BRASÍLIA - A equipe econômica diz que o nível de economia fiscal com o pacote de contenção de gastos está mantido, sem desidratação, mesmo após os ajustes realizados pela Câmara. Em entrevista ao Estadão/Broadcast sobre a aprovação das medidas pelos deputados, concluída na noite desta quinta-feira, 19, o secretário executivo da Fazenda, Dario Durigan, explicou o que leva a pasta a confiar que haverá uma economia de R$ 70 bilhões em 2025 e 2026. Para ele, o processo legislativo foi como um “voto de confiança” do Congresso no plano do governo.
Na Câmara, entre as principais mudanças, os deputados não toparam alterar a correção do Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF), retiraram do pacote algumas restrições para recebimento do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e reduziram o porcentual de uso do Fundeb para educação integral. As medidas agora passam pela análise do Senado.
“Quando anunciamos, havia previsão de economia de R$ 71,9 bilhões em dois anos. Vamos ficar em torno de R$ 70 bilhões. Fizemos discussão na Câmara, e o pacote não desidratou”, afirmou Durigan.
Sobre o BPC — o item que demandou mais negociação —, Durigan diz que está mantida a previsão de economia anual de R$ 2 bilhões. Primeiro porque, segundo ele, essa estimativa era “superconservadora”. Em segundo lugar, argumenta o secretário, uma das definições mais importantes para combater a judicialização na concessão do benefício está integrada no texto: para receber o benefício, o grau de deficiência deve ser “moderado ou grave”, nos termos do regulamento.
“Não mexemos no conceito de pessoa com deficiência, o critério para que a pessoa com deficiência tenha acesso ao BPC é que precisa ser colocado”, disse o número 2 de Fernando Haddad, para quem esse critério é “fundamental” e guiou toda a discussão do governo no Congresso. “Um terço do BPC é fruto de decisão judicial. E essa concessão judicial não tem nenhum parâmetro hoje”, afirmou.
Como fica o Fundeb
No caso do Fundeb, a PEC aprovada pela Câmara estabeleceu que, em 2025, até 10% — e não 20% como proposto — de complementação da União ao fundo poderá ser empregado em manutenção de matrículas em escolas públicas de tempo integral. Mesmo assim, o governo mantém a projeção de economia de quase R$ 5 bilhões no próximo ano.
Segundo Durigan, durante as discussões, foi entendido que os 10% de complementação já correspondem a parcela que o Ministério da Educação dispõe para essa finalidade. “A bancada da educação nos disse e entendemos que os 10% já são suficientes para fazer a economia”, relatou o secretário.
A partir de 2026, a União seguirá sem prever orçamento para o MEC nesta área, e a pasta terá de coordenar a política sem nova fonte de financiamento, mas contando com o Fundeb. Com esse espaço aberto, o governo vai colocar o programa Pé-de-Meia dentro da peça orçamentária a partir de 2025. “O Pé-de-Meia vai ficar orçado”, disse Durigan.
O secretário executivo da Fazenda reconheceu que o governo perdeu na discussão sobre o ajuste no FCDF, que em dois anos geraria economia de R$ 2,3 bilhões à União. Além disso, a equipe não conseguiu garantir desde já o R$ 1 bilhão projetado com as mudanças nas regras da previdência militar, que ainda serão votadas, mas não neste ano. São pouco mais de R$ 3 bilhões, por sua vez, praticamente compensados com uma economia maior a partir da nova regra do salário mínimo, argumentou Durigan.
Como já havia mostrado o Estadão/Broadcast, a revisão do PIB de 2023 aumentou para R$ 15 bilhões a projeção de economia de gastos que será gerada pela nova norma entre 2025 e 2026. Quando a alta do PIB ainda era de 2,9% - foi revisada para 3,2% após a apresentação do pacote -, o governo esperava poupar nos próximos dois anos R$ 11,9 bilhões com a medida.
‘Não resolve tudo, mas é passo fundamental’
Durigan classificou o andamento do pacote fiscal no Congresso como um “passo fundamental” para a evolução da seara fiscal no País, reconhecendo, por sua vez, que a discussão não se encerra.
“Não pode ser (o fim da discussão). Isso resolve a questão fiscal? Não, mas é um passo fundamental. Temos uma estratégia consistente. Queremos, de maneira equilibrada, arrumar o fiscal do País. E nós estamos fazendo isso com toda a sensibilidade política, com toda a articulação”, disse Durigan ao Broadcast. O pacote fiscal avançou com a aprovação da Câmara e agora está sendo analisado pelo Senado.
Sobre a crítica dos investidores de que as iniciativas são insuficientes para endereçar o fiscal e a dívida pública, Durigan disse entender o “tempo do mercado”, mas ponderou que o governo todo está fazendo “o possível” dentro do contexto político. “Temos um tempo humano, um tempo da política e eu respeito e entendo o tempo do mercado. Agora, o que nós estamos fazendo é todo o possível”, respondeu.
‘O arcabouço fiscal não está mais sob dúvida’
Para o número 2 de Fernando Haddad, com a aprovação das medidas, o arcabouço fiscal não está mais sob dúvida, embora reconheça que elas não endereçam todos os problemas. Sem um primeiro passo, argumentou, não seria possível dar o próximo.
“Eu não estou dizendo que isso resolve a dívida, não estou dizendo que isso resolve uma série de outras questões fiscais. Mas é um passo fundamental dado não só pela equipe econômica, mas pelo governo e pelo Congresso”, disse Durigan, para quem a equipe econômica precisará tomar medidas “durante todo o tempo que estiver” à frente da administração para equilibrar a política fiscal.
A avaliação do secretário é de que o pacote foi bem recebido pelo Congresso, uma vez que, na visão do governo, as medidas não foram desidratadas e garantirão a economia de R$ 70 bilhões nos próximos dois anos. “Não tivemos grandes embates de princípio com o Congresso. O Congresso concordou com a necessidade de fazer isso aqui agora, como o governo concordou, como o presidente concordou. E o Congresso agora está avançando para aprovar. O Congresso está votando agora, mantendo a nossa projeção de economia, de alguma maneira está dizendo que esse pacote é equilibrado”, afirmou.
Leia também
Sobre as mudanças promovidas pelos deputados na proposta para limitar os supersalários, Durigan argumentou que não há um impacto relevante do ponto de vista fiscal, e que o assunto foi introduzido pelo governo porque o debate é “moralmente correto”. “Não tem um impacto relevante do ponto de vista fiscal, mas tem um impacto de exemplo muito importante”, defendeu.
Além de ter enfraquecido a proposta do governo sobre o tema, a Câmara não aceitou um dispositivo que, na prática, daria liberdade para a equipe econômica congelar recursos de forma a chegar mais perto do centro da meta fiscal em se tratando de contingenciamento. “Foi a opção do Congresso, que viu um risco de invasão de competência. Não esperávamos economia com essa medida, mas ter mais capacidade de gestão fiscal”, explicou.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.