Análise | É hora de pensar em investimento, e isso depende de cautela e previsibilidade

Moderação e boa gestão fiscal podem ser muito mais favoráveis à expansão do investimento do que a mera decisão presidencial de privilegiar qualquer tipo de programa ou projeto

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Foto do author Rolf Kuntz

Dólar, inflação, juros e contas públicas dominam o noticiário econômico na passagem de ano, como se a maior economia da América Latina pudesse crescer ou mesmo funcionar sem projetos de estradas, portos, escolas, hospitais, serviços de água e saneamento, sistemas de energia, fábricas, lojas e outros prosaicos componentes do dia a dia. Buscar equilíbrio fiscal sustentável e duradouro tem sido a atividade mais notória do ministro da Fazenda, auxiliar principal de um presidente pouco empenhado em gerir com prudência o dinheiro público.

A insegurança quanto à evolução das contas federais tem como contraponto uma nova fase de aperto monetário. O Banco Central (BC) já elevou os juros básicos de 11,25% para 12,25% em dezembro e dois novos aumentos são esperados para janeiro e março. A taxa estimada para o fim do ano chegou a 14,75%, segundo o último boletim Focus de dezembro, e alguns agentes do mercado já falam em 15%.

Insegurança quanto à evolução das contas federais tem como contraponto uma nova fase de aperto nos juros pelo BC Foto: Dida Sampaio/Estadão

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Juros altos podem demorar meses para conter a inflação, mas afetam rapidamente os planos de investimento produtivo e de expansão dos negócios. O crescimento econômico projetado para 2025 está na vizinhança de 2%. Nenhuma aceleração é esperada para os dois anos seguintes, segundo as projeções do mercado.

Se essas estimativas estiverem corretas, a economia será bem menos dinâmica na segunda metade do atual mandato presidencial. O dinamismo poderá ser prejudicado por fatores externos e internos. O quadro internacional é pouco promissor e as incertezas são agravadas, neste momento, pelas promessas e ameaças - de protecionismo, por exemplo - do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump. Internamente, o conjunto de riscos inclui a inflação longe da meta, os problemas fiscais, a elevação de juros pelo BC e o baixo investimento na capacidade produtiva.

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A deficiência do investimento é um problema apontado com frequência, ao longo de muitos anos, por analistas da economia brasileira. No terceiro trimestre governo e setor privado investiram em meios físicos de produção, como infraestrutura, construções civis, máquinas e equipamentos, o equivalente a 17,6% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na maior parte deste século, essa taxa tem sido inferior aos padrões observados em períodos de maior dinamismo. Além disso, tem sido mais baixa que as contabilizadas em outros emergentes, frequentemente superiores a 18% e até mesmo a 20% do PIB.

Do lado governamental, políticas de investimento são bem-sucedidas quando vinculadas a projetos e planos de crescimento e de modernização e à gestão eficiente dos meios públicos. No caso do setor privado, a decisão de investir depende do custo do capital, expresso pela taxa de juros, e das expectativas econômicas. Essas expectativas são associadas à qualidade da ação governamental e à previsibilidade das condições da política e da economia.

As incertezas quanto à inflação, aos juros e à evolução da dívida pública federal são com certeza componentes desse quadro. Não basta, portanto, o presidente Lula decidir de forma voluntarista a aplicação deste ou daquele volume de recursos públicos em investimentos, se o quadro fiscal for inseguro e houver o risco - entre outros - de juros mais altos. Moderação, cautela e boa gestão fiscal podem ser muito mais favoráveis à expansão do investimento do que a mera decisão presidencial de privilegiar qualquer tipo de programa ou projeto.

Análise por Rolf Kuntz

Jornalista

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