Nas últimas semanas, preocupados moradores de Nova Jersey, nos Estados Unidos, têm olhado para o céu para acompanhar os movimentos do que pareciam ser drones misteriosos sobrevoando, formulando teorias sobre suas origens e planejando como se livrar deles.
A algumas milhas de distância, a oeste de Phoenix, a Amazon está em uma missão ambiciosa para convencer as pessoas de que os drones de 36 quilos zunindo sobre suas casas não só são inofensivos, mas representam o futuro excitante das compras online.
Você talvez já tenha ouvido falar dos drones da Amazon antes. A empresa os apresentou pela primeira vez há mais de uma década, quando Jeff Bezos apareceu no “60 Minutes” para declarar o início do Prime Air, um serviço experimental de entrega por drones que a empresa esperava que um dia entregasse milhões de pacotes aos clientes em 30 minutos ou menos.
Para os viciados na Amazon, a proposta era irresistível. Precisa de um carregador de telefone? Esqueceu sua pasta de dente em uma viagem de trabalho? Toque um botão, disse Bezos, e um drone autônomo voaria pelo céu para entregá-lo a você, em menos tempo do que levaria para dirigir até a loja.
Esse futuro não chegou conforme o planejado, no entanto, e Bezos agora está mais focado em enviar foguetes para o espaço. Mas a Amazon não desistiu dos drones. Esta semana, eu fui convidado junto com meu co-apresentador do “Hard Fork”, Casey Newton, para visitar a instalação onde a Amazon acabou de lançar a mais nova interação do Prime Air e ver seus novos drones em ação.
Nossa visita foi estranhamente cronometrada — bem no meio de um pânico nacional sobre os drones pairando sobre Nova Jersey. Seja o que for, a Amazon diz que os drones misteriosos não são seus. Oficiais federais disseram esta semana que a maioria dos avistamentos relatados acabou sendo de aviões pilotados e drones de hobby, embora alguns permaneçam inexplicados.
Mas a Amazon não está desanimada. A empresa acredita que a conveniência da entrega por drones superará quaisquer preocupações que as pessoas tenham sobre os próprios drones.
“Qualquer forma de tecnologia precisa ter utilidade,” disse David Carbon, vice-presidente e gerente geral do Prime Air da Amazon, que serviu como nosso guia turístico do dia. “Se não tiver utilidade para a população em geral, é um incômodo.”
Testamos essa teoria ao pedir uma entrega por drone de algo chamado Creme Brazilian Bum Bum para uma casa nos subúrbios de Phoenix que a Amazon havia alugado para o dia.
O creme é um dos cerca de 60 mil produtos que podem ser pedidos para entrega por drone, todos pesando 2,2 quilos ou menos e cabendo em uma caixa padrão Prime Air. Apesar do nome sugestivo, o Creme Brazilian Bum Bum é usado em muitas partes do corpo.
Nossa entrega correu sem problemas. Também inspirou a visita de um vizinho, cuja reação provou que o público pode não estar tão empolgado quanto a Amazon sobre um futuro cheio de drones.
Limitações
Em 2013, quando Bezos fez sua proposta no “60 Minutes”, os drones da Amazon não estavam realmente prontos.
Para começar, a empresa ainda tinha que receber aprovação regulatória do departamento de aviação dos Estados Unidos para operar um programa de entrega por meio de drones.
Essa aprovação só veio em 2020, quando a agência autorizou o Prime Air a operar como uma companhia aérea e entregar pequenas encomendas via drone. A aprovação foi expandida para incluir entregas “além da linha de visão” este ano.
Leia também
Os próprios drones também tinham problemas — o alcance e a capacidade de carga era limitados, não podiam voar sob chuva forte ou vento e faziam muito barulho. Eles também eram ineficientes como veículo de entrega. Ao contrário de vans e caminhões cheios de caixas, um drone Prime Air poderia entregar apenas um pacote por vez.
Havia preocupações com a segurança também. Em 2022, a Bloomberg relatou que uma instalação de testes de drones da Amazon em Pendleton, Oregon, havia registrado cinco quedas de drones em um período de quatro meses, incluindo um que explodiu em chamas e iniciou um incêndio em uma área. Ninguém se feriu, e a empresa caracterizou os incidentes como parte dos testes de rotina.
Em 2020, a Amazon contratou David Carbon, um executivo de aviação de longa data, para reformular o Prime Air e transformar esse projeto em realidade. Carbon deixou a Boeing, onde supervisionou a fábrica do 787 Dreamliner na Carolina do Sul, após um artigo do The New York Times detalhar práticas de produção apressadas e supervisão fraca.
David Carbon, vice-presidente e gerente geral da Amazon Prime Air, é um otimista da entrega por drone. Em 2022, o Prime Air iniciou a entrega por drone com clientes reais em College Station, Texas. O programa provou que os drones da empresa poderiam voar com segurança, mas não foi um sucesso com os clientes, em parte porque a inscrição para entregas por drone era muito complicada.
Antes de enviar drones para as casas dos clientes, os funcionários da Amazon tinham que visitá-las para encontrar um local adequado para a entrega de pacotes. Os clientes recebiam cartões impressos com códigos QR, que eles colocariam em seus quintais ou entradas de automóveis para ajudar a guiar os drones até o local correto.
Tudo isso parecia mais uma jogada de marketing elaborada do que uma prévia do futuro. Naquela época, meu colega David Streitfeld descreveu memoravelmente o Prime Air como “um programa que transporta Listerine Cool Mint Breath Strips ou uma lata de Campbell’s Chunky Minestrone Com Linguiça Italiana — mas não ambos de uma vez — para os clientes como presentes.”
Recentemente, a Amazon desenvolveu um novo drone — conhecido como MK-30 — que pode resolver muitos dos problemas que houve com os modelos anteriores. Os novos drones podem voar por distâncias duas vezes maiores e a empresa diz que são significativamente mais silenciosos. Os drones também podem identificar onde deixar pacotes com a ajuda de câmeras e sensores, o que significa que não são mais necessárias pesquisas de quintal ou códigos QR.
Este ano, a Amazon começou a oferecer entrega por drone a partir de uma instalação em Tolleson, Arizona, um subúrbio de Phoenix — onde, como no Texas, os céus são tipicamente ensolarados e claros, proporcionando condições de voo ideais.
Seus drones agora entregam dezenas de pacotes por dia para clientes reais e pagantes na área metropolitana do oeste do Vale do Phoenix. É uma fração minúscula do que mesmo uma van da Amazon poderia fazer, mas um passo em direção à realização da visão original de Bezos.
Objetos voadores
Uma vez que chegamos em Tolleson, Carbon nos deu coletes de segurança e nos levou em um tour pela instalação do Prime Air. A instalação está localizada em um canto nos fundos de um armazém da Amazon que eu seria tentado a descrever como “enorme”, mas a empresa informou que era menor do que um centro de atendimento típico.
Do lado de fora, em uma área cercada que é o Centro de Entrega de Drones Prime Air, uma frota de cerca de uma dúzia de drones MK-30 estava pronta para decolar. Eles tinham formato de lágrima, eram brancos, com grandes logotipos azuis da Amazon e tinham seis rotores de três lâminas ao redor do compartimento de entrega.
Esses drones personalizados são maiores e mais pesados do que qualquer coisa que você encontraria à venda na Best Buy. Cada MK-30 pesa 36 quilos e tem aproximadamente o tamanho e a forma de um cão labrador. E eles voam a uma velocidade de mais de 100 quilômetros por hora.
Assim que um pedido do Prime Air chega, um trabalhador dentro do armazém o embala em uma caixa especial, almofadada e a envia por uma esteira rolante.
Outro trabalhador leva o pacote para fora, até a área de entrega por drone, coloca-o em um verificador de tamanho e o desliza por um tubo até outro funcionário. Esse trabalhador então carrega a caixa em um compartimento dentro do drone.
Um cronômetro programado para 30 segundos começa a funcionar. Quando chega a zero, as lâminas do drone começam a zumbir, e o drone decola e faz um trajeto direto para a casa do cliente.
Colocar esses drones no ar exigiu alguns compromissos. Atualmente, a Amazon pode lançar apenas sete drones por hora a partir da instalação de Tolleson, e cada um pode carregar apenas um pacote, com um único item dentro. Isso mudará no próximo ano, quando os clientes terão a opção de adicionar vários itens a uma caixa, disse Carbon.
A Amazon cobra dos membros Prime um extra de US$9,99 por uma entrega por drone (não-membros pagam US$14,99), e os drones não entregam à noite. A empresa também teve que recuar da promessa original de Bezos de entregas em 30 minutos. Agora informa aos clientes que seus pacotes Prime Air chegarão em uma hora ou menos.
E a entrega por drone, por enquanto, parece não lucrativa. Carbon não quis dizer quanto a Amazon perde em cada entrega, mas o Business Insider relatou em 2022 que a empresa projetou que as entregas por drone custariam à empresa US$63 por pacote até 2025, segundo documentos internos.
Carbon, um australiano otimista, acredita que tudo isso mudará em breve, à medida que a tecnologia da Amazon continuar melhorando e o serviço se expandir para mais áreas.
Seu objetivo é entregar 500 milhões de pacotes por ano em 30 minutos ou menos por meio de de drone até 2029. Isso ainda seria uma pequena fração do volume total de pacotes entregados pela empresa, mas um enorme sucesso para o Prime Air. A Amazon informou que o Prime Air fez “milhares” de entregas no Arizona e no Texas até agora, mas recusou-se a fornecer números mais específicos.
A Amazon não é a única empresa apostando em drones. Empresas como Wing (unidade de entrega por drones do Google) e Zipline estão se unindo a varejistas como o Walmart para testar seus próprios programas de entrega por drone. E empresas como DroneUp e Matternet estão desenvolvendo tecnologia que poderia permitir uma operação mais suave de grandes frotas de drones autônomos.
Questionado sobre se as pessoas querem drones deixando pacotes em seus quintais, Carbon tem uma resposta: Sim, pelo menos algumas pessoas, algumas vezes.
Ele admitiu que nem todo cliente gostaria de receber todas as compras imediatamente. Mas ele disse que havia muitas situações em que você queria algo o mais rápido possível.
O executivo deu como exemplo de uma criança que derrama algo em sua camisa. Com o Prime Air, o pai poderia pedir uma barra de sabão e recebê-la de um drone em minutos, antes que a mancha se fixasse no tecido. “Ninguém pode jamais me dizer que a velocidade não importa,” ele disse.
Rapidez
É difícil discordar de Carbon nesse ponto. Nos Estados Unidos, nunca é uma boa ideia apostar contra a conveniência. Vivemos em um mundo de gratificação instantânea: jantares do DoorDash e corridas de Uber ao toque de um botão. E, historicamente, toda vez que a Amazon acelerou suas entregas — primeiro para envio em dois dias, depois para o próximo dia, e então para o mesmo dia — os clientes responderam pedindo mais coisas e exigindo que fossem entregues ainda mais rápido.
Mesmo assim, eu me perguntava, não é um pouco loucura usar drones de última geração para entregar cabos USB e garrafas individuais de Tylenol?
Em nosso tour pelo Prime Air, vimos drones sendo carregados com pacotes contendo itens tão pequenos quanto um único cartão-presente. Mesmo que esses drones, totalmente elétricos, sejam melhores para o ambiente do que um caminhão de entrega típico, é muito esforço por um presente de última hora.
Questionei Carbon se ele achava que alguns dos pedidos feitos pelo Prime Air não eram essenciais. Ele respondeu, basicamente, que o que os clientes queriam não era da conta da Amazon. “A beleza da América é que as pessoas decidem o que querem e quando querem, não nós,” ele disse.
Na prática
Após nosso tour pela instalação, fomos até uma casa nas proximidades de Goodyear, Arizona, que a Amazon alugou por um dia para nos mostrar uma entrega real por drone em ação.
Quando chegamos lá, peguei meu laptop e fiz um pedido de Creme Brazilian Bum Bum, um dos primeiros itens que apareceram em uma lista de produtos elegíveis para o Prime Air. Outros produtos elegíveis incluem petiscos para cães, fio dental e cópias impressas da Constituição dos EUA.
O processo de checkout foi semelhante a pedir qualquer outra coisa da Amazon, com um passo extra de selecionar um local para o drone largar o pacote. Hoje, os drones precisam de cerca de três metros quadrados de espaço aberto. Escolhi um local no quintal, ao lado da piscina.
Cerca de 45 minutos depois do pedido feito, um drone passou zunindo sobre nossas cabeças. Ele fez um barulho zumbindo distinto — que Carbon insistiu que não era muito alto, mas para mim soou como um enxame de abelhas irritado — e gerou uma leve brisa ao se aproximar.
Uma vez sobre nossas cabeças, o drone desceu cerca de 12 metros até solo. Um compartimento se abriu e o pacote caiu. Os drones não pousam, disse Carbon, porque os clientes — ou seus cães — poderiam tentar agarrá-los. Então, tão rapidamente quanto chegou, o drone voou para longe.
Admito: É uma façanha impressionante, e tudo sobre a entrega por drone foi tão suave e conveniente quanto anunciado. Mas também atraiu uma atenção indesejada. Segundos depois que nosso pacote pousou, um vizinho veio até nós. Ele se apresentou como Geno e perguntou se éramos da Amazon. Ele disse que as pessoas no bairro começaram a associar o zumbido dos drones sobre suas cabeças com os drones misteriosos em Nova Jersey. “Vocês assustaram muita gente,” ele disse a Carbon.
Medo
Hoje, as pessoas simplesmente não estão acostumadas a ver drones pairando sobre elas, o que os faz parecer sinistros e ameaçadores, e frequentemente deixa as pessoas buscando explicações paranoicas: alienígenas, operações militares secretas, material radioativo?
Isso pode mudar em breve. Como o governo apontou durante sua investigação sobre os drones em Nova Jersey, existem mais de um milhão de drones registrados pelo departamento de aviação dos Estados Unidos e certificados para voar no país hoje. também há milhões de drones recreativos pequenos que voam sem licença.
Drones estão ficando mais baratos e acessíveis, e quadricópteros pequenos e leves agora podem ser comprados por menos de US$ 100. Em alguns anos, talvez não seja mais incomum ver um enxame de drones sobre nossas cabeças — tirando fotos, entregando pacotes ou levando medicamentos para hospitais.
Barreiras
Mas a tecnologia muda mais rápido do que a cultura e as evidências iniciais sugerem que a aceitação de drones não será imediata. Um homem da Flórida foi preso este ano por derrubar um drone de entrega do Walmart que estava deixando um pacote em sua vizinhança. O homem teve de pagar US$5 mil de restituição à DroneUp, a empresa dona do drone.
Referindo-se ao recente drama dos drones em Nova Jersey, o presidente eleito Donald Trump sugeriu nas redes sociais que uma solução seria “derrubá-los.” Carbon disse que nenhum dos drones da Amazon havia sido alvo de tiros, mas que a empresa processaria qualquer um que tentasse fazer isso.
A longo prazo, o trabalho da Amazon não é apenas provar que pode entregar pacotes aos clientes em 30 minutos ou menos. É algo muito mais difícil: convencer milhões de americanos de que, quando virem e ouvirem drones sobre suas cabeças, o primeiro instinto deles não deve ser se abaixar e se proteger, ou pegar suas armas.
“Nosso trabalho é tornar isso normal,” disse Carbon. “E até que seja normal, as pessoas sempre serão justificadamente céticas quanto à mudança.”
Se funcionar, o programa de drones da Amazon — e outros como ele — representará a maior mudança visível em nossos céus desde o advento do transporte aéreo comercial. Se não funcionar, a indústria terá gasto bilhões de dólares aprendendo uma lição difícil sobre nossa tolerância coletiva a bandos de robôs voadores.
Dado o que está acontecendo em Nova Jersey, estou cético de que normalizar drones será fácil ou rápido, mesmo para uma empresa com os recursos e histórico da Amazon. Mas Carbon acredita que a prova estará nos pacotes.
“Se eu fizer meu trabalho direito, ninguém vai se importar com o drone,” ele disse. “O que eles vão se importar é: recebi meu pacote dentro de 30 minutos?”
Este conteúdo foi traduzido com o auxílio de ferramentas de Inteligência Artificial e revisado por nossa equipe editorial. Saiba mais em nossa Política de IA.