Em relatório divulgado este mês, o World Wildlife Fund (WWF) aponta o Brasil como quarto maior produtor de lixo plástico do mundo, gerando 11,3 toneladas por ano. O documento, elaborado com base no estudo "What a Waste 2.0: A Global Snapshot of Solid Waste Management to 2050", do Banco Mundial, apontou também que apenas 1,28% desse total é reciclado.
Segundo a gerente do Programa Mata Atlântica e Marinho do WWF, Anna Carolina Lobo, o baixo índice é um reflexo, principalmente, da falta de infraestrutura para atender a grande demanda. "A falta de infraestrutura adequada resulta na impossibilidade de fazer reciclagem em larga escala e as empresas não compram porque reclamam que essa matéria-prima é cara", explica.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), José Ricardo Roriz Coelho, enfatiza a existência de uma barreira de infraestrutura: "temos que resolver dois gargalos: como fazer com que o material pós-consumo seja devidamente coletado e como fazer com que esse material coletado chegue, de fato, aos recicladores."
Coelho elenca também outras questões impeditivas à cadeia de logística reversa: "consumismo desenfreado, descarte incorreto de resíduos sólidos, ausência de uma efetiva coleta seletiva, baixa conscientização e educação ambiental da população, baixa valorização de produtos feitos de material reciclado e falta de incentivos fiscais à cadeia impossibilitam um maior índice de reciclagem no Brasil."
Esse ou aquele?
Em resposta ao relatório apresentado pelo WWF, a Abiplast divulgou uma nota apontando o que acredita ser um equívoco nos dados de geração de lixo plástico e índices de reciclagem apresentados pela organização, devido a simplificações na metodologia. Coelho menciona que há incoerência entre os números apresentados pela organização e os disponibilizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pela Fundação Instituto de Administração (FIA).
"Segundo o IBGE, o Brasil consumiu 6,3 milhões de toneladas de produtos transformados plásticos em 2016, sendo que 2,1 milhões de toneladas se referem a embalagens e equiparáveis pós-consumo. Já de acordo com a FIA, a reciclagem de plásticos no Brasil, naquele mesmo ano, foi de 550,4 mil toneladas. Logo, temos um índice de reciclagem de cerca de 26% no País", afirma.
Ainda assim, o executivo declara que existe a necessidade de um cenário diferente. "Esse número poderia ser muito maior caso todos os envolvidos assumissem suas respectivas responsabilidades e fosse realizada uma análise sistêmica da questão", explica.
Patrimônio cultural da humanidade
Na visão de Anna, a utilização do plástico vai além da necessidade e beira uma prática cultural. "Chegamos a um ponto em que o custo é tão baixo e a acessibilidade é tão grande que as pessoas não param para pensar em alternativas baratas já existentes para isso", avalia.
O material, de fato, é utilizado em inúmeros setores, como, por exemplo, na construção civil, indústria têxtil, eletrônicos e agricultura. Para Coelho, mesmo com movimentos de sustentabilidade contrários ao uso, o plástico ainda é significativo. "O material continuará a ter sua importância para a sociedade - como para preservar a validade dos alimentos, evitando desperdícios", observa.
Segundo o executivo, cerca de de 70% da indústria corresponde a produtos com ciclo de vida médio (entre 1 e 5 anos) e longo (acima de 5 anos). Entretanto, o relatório do WWF apontou que 75% de todo plástico já produzido foi descartado. Anna enfatiza: "95% dos plásticos quando passam pelas mãos das pessoas acabam sendo descartados no primeiro uso."
Limpando a sujeira
A rentabilidade da matéria-prima reciclada depende da qualidade do material. Segundo o WWF, a garantia de qualidade existe quando há poucas impurezas no plástico e quando ele é uniforme (oriundo de uma mesma fonte). "O sucesso desse processo depende de que valor esse plástico é negociado e seu volume (que permita atender demandas industriais)", afirmou a organização em texto publicado no site.
Tendo em vista esta característica do processo de logística reversa, uma das empresas vencedoras do Prêmio Eco 2018 Eco Panplas desenvolveu uma solução ecológica para a descontaminação do lixo plástico e que permite a utilização de 100% da matéria-prima oriunda do lixo. "Permitimos que o material seja valorizado por ter mais qualidade e possa ser aplicado para a confecção de novos produtos com maior valor agregado", comenta Felipe Cardoso, CEO da Eco Panplas.
O processo de limpeza utiliza uma substância ecológica desenvolvida pela empresa que elimina a necessidade da aplicação de água, evitando a contaminação deste recurso. "Separamos os insumos e conseguimos recuperar também todo o produto residual das embalagens, reciclando-o também. O plástico, o óleo e o rótulo são reciclados", esclarece Cardoso.
Por garantir a qualidade da resina obtida para a fabricação de novos materiais, o executivo explica que a matéria-prima pode ser usada na produção de mercadorias com maior valor agregado, como uma embalagem ao invés de tubos para construção civil, por exemplo. "Também conseguimos reduzir até 10% de custo - para a indústria, nosso cliente final - em relação ao material virgem, com a mesma qualidade e utilizando 100% da matéria-prima reciclada", finaliza.
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