ECONOMIST: Trump é um desastre para os EUA e para o mundo

Nunca, desde que começou, ao fim da 2ª Guerra Mundial, o sistema global de comércio vive tão grande perigo

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Por Redação
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Donald Trump não é de modo algum o primeiro presidente americano a estabelecer tarifas unilaterais sobre importações. Todo ocupante do Salão Oval desde Jimmy Carter impôs algum tipo de barreira protecionista ao comércio, frequentemente, sobre o aço. Tampouco a promessa de Trump de taxar a importação de aço em 25% e a de alumínio em 10% vai abalar, por si, a economia americana: os dois itens responderam apenas por 2% dos US$ 2,4 trilhões de bens importados pelos Estados Unidos no ano passado, ou0,2% do PIB. Se o protecionismo de Trump se limitasse a isso, seria apenas um ato sem sentido de autoflagelação. Na verdade, trata-se de um desastre potencial- tanto para os Estados Unidos quanto para a economia mundial.

O presidente dos EUA, Donald Trump Foto: Michael Reynolds/EFE

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Ainda não ficou exatamente claro o que Trump vai fazer, mas os presságios não são bons. Diferentemente de seus predecessores, Trump é um conhecido cético quanto ao livre comércio. Ele debocha do sistema multilateral, que vê como mau negócio para os EUA. Seu governo é caótico, e a assustadora decisão de Gary Cohn de renunciar, no dia 6, ao cargo de principal assessor econômico do presidente priva a Casa Branca de um raro adepto do livre comércio, significando que a função passará para mãos protecionistas. Nunca, desde que começou, ao fim da 2ª Guerra Mundial, o sistema global de comércio vive tão grande perigo.

Esse perigo tem várias dimensões. Uma é o risco de uma escalada "olho por olho" de retaliações. Depois de a União Europeia dizer que vai retaliar com sanções sobre bens americanos, incluindo bourbon e motocicletas Harley-Davidson, Trump ameaçou investir contra a importação de carros europeus.

O segundo perigo deriva da lógica de Trump. As tarifas são baseadas em uma lei pouco usada que permite ao presidente proteger a indústria a pretexto de zelar pela segurança nacional. Essa desculpa é evidentemente falsa. A maior parte do aço importado pelos EUA vem do Canadá, União Europeia, México e Coreia do Sul, aliados dos americanos. Canadá e México parece que estão temporariamente excluídos - mas apenas porque Trump quer alavancar sua renegociação do Tratado de Livre Comércio da América do Norte, o Nafta, o que não tem nada a ver com segurança nacional. Trump está criando um precedente que outros países podem explorar para proteger seus próprios produtores, de forma igualmente falsa.

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Não está claro se outros países podem responder com medidas legais quando a segurança nacional é invocada dessa maneira. Isso leva a Organização Mundial do Comércio (OMC) a uma armadilha. Tanto Trump pode provocar uma enxurrada de queixas e retaliações que o tribunal da OMC não conseguirá julgar como o tribunal pode condenar as alegações de segurança nacional dos EUA, levandoassim Trump a abandonar a organização. 

A OMC já está sob pressão. O fracasso da rodada Doha de conversações comerciais, em 2015, após 14 infrutíferos anos, pôs indefinidamente em banho-maria a necessidade de reformas. Disputas que poderiam ter ido para uma nova rodada de negociações empacaram nos mecanismos de resolução da OMC, que são lentos e frágeis demais para suportar a sobrecarga. A OMC não tem acompanhado o avanço das mudanças econômicas. Os investimentos estão cada vez mais ligados a fatores intangíveis, como patentes e direitos autorais, do que a bens físicos, como usinas de aço. Regras traçadas por economias ricas e voltadas para o mercado nem sempre servem para policiar o capitalismo de Estado. Os subsídios implícitos que a China dá a seus produtores causam uma saturação global de metais industriais. Não é de se estranhar que a segunda maior economia do mundo venha sendo alvo de tanta fúria.

Sejam quais forem os problemas da OMC, enfraquecê-la seria uma tragédia. Se os Estados Unidos buscam uma política mercantilistaque desafie o sistema global de comércio, outros países podem decidir segui-los. Isso não levaria a um colapso imediato da OMC, mas correria um dos fundamentos da economia globalizada. 

Todos sofreriam. Trump parece acreditar que comércio é uma prática de soma zero, na qual déficit é sinal de mau negócio. Mas a imensa melhora nos padrões de vida depois da 2ª Guerra ocorreu junto com uma rápida expansão do comércio mundial através de oito rodadas de negociações, cada uma delas levando a barreiras mais baixas. Importações são de fato bem-vindas, porque beneficiam consumidores e incentivam produtores a se especializar no que fazem de melhor. 

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Sem a OMC, o comércio através das fronteiras vai continuar - não há como detê-lo -, mas a falta de normas e procedimentos levaria a uma escalada nas disputas. Quanto menos regras, maior o campo para problemas mercantilistas e retrocessos. A política comercial pode ser capturada por interesses especiais. O poder militar teria maior peso em disputas comerciais que o jogo econômico honesto. Investimentos transnacionais podem secar. Como a enorme economia continental que são, os EUA perderiam menos nisso que outros países. Mas sua perda seria de qualquer forma muito grande, incluindo o fim de um pilar do sistema que consolidou sua influência política no pós-guerra.

Como o mundo pode sair dessa saia-justa? Embora Trump se comporte com uma assustadora irresponsabilidade, outros devem manter a cabeça no lugar. Alguns podem impor retaliações limitadas - afinal, é assim que se lida com bullies -, e a ameaça de industriais americanos dará força aos republicanos para pressionarem Trump a recuar. Mas tais ações têm de ser proporcionais e limitadas. Uma guerra olho por olho com os Estados Unidos seria desastrosa. 

O mais importante no momento é proteger o comércio. É confortador pensar que existe apoio global para se consertar a OMC, mas não existe. Os únicos acordos comerciais em oferta são regionais, como a Parceria Transpacífica, um pacto assinado nesta semana por 11 países que serve de modelo para a modernização do comércio. Embora Trump tenha abandonado a Parceria, ele deu a entender que pode reconsiderar, o que será um começo. 

O melhor modo de ajudar a OMC é seus outros membros coordenarem qualquer iniciativa, inclusive uma queixa na OMC contra as tarifas de Trump. Mesmo que possa ser uma carga para o tribunal da organização, seria um voto de confiança na ideia de que a economia global pode ser conduzida segundo regras. 

O mundo está muito distante dos anos 1930, graças a Deus. Mas a ignorância e a complacência deixaram o sistema comercial em grave perigo. Defensores do livre comércio têm de reconhecer que a OMC pode ajudar a manter os mercados abertos frente ao lobby protecionista, em casa e no exterior. É fundamental que eles invistam no comércio baseado em regras. Isso não será fácil. Pela primeira vez em décadas, o maior adversário do livre comércio é o homem no Salão Oval. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ 

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