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O que virá no lugar do teto de gastos em 2023? Veja as propostas nas campanhas de Lula e Bolsonaro

Propostas almejam permitir o crescimento das despesas acima da inflação, o que hoje é proibido

Foto do author Adriana Fernandes
Atualização:

BRASÍLIA - As campanhas de Lula e Bolsonaro já têm suas propostas para substituir o teto de gastos. É pacificado que a regra que segura os gastos públicos será revista independentemente de quem vencer a disputa. Ao todo são quatro propostas, que têm um denominador comum: permitir o crescimento das despesas acima da inflação, o que hoje é proibido. No que se diferem, a equipe de Bolsonaro trabalha para atrelar a nova regra ao endividamento, enquanto a de Lula estuda retomar o superávit primário como o balizador das contas públicas.

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Na agenda econômica, a definição da nova âncora fiscal em substituição à atual é tema central e alvo da atenção dos agentes econômicos brasileiros e internacionais pelo seu impacto na definição das políticas públicas e programas do presidente eleito a partir de 2023.

No segundo turno das eleições, Bolsonaro e Lula optaram por não colocar na mesa os detalhes da proposta com receio de atrapalhar a campanha e a confiança dos seus eleitores no cumprimento das promessas que veem sendo feitas – a maior parte delas centrada em aumento de gastos.

Para colocar em prática as mudanças, Bolsonaro ou Lula, quem for eleito, terá que mudar a Constituição. E para isso precisarão do apoio do Congresso a uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). O Estadão procurou as duas campanhas para obter informações oficiais sobre os planos para o novo arcabouço fiscal e não obteve resposta. A reportagem conversou com integrantes da equipe econômica do presidente Bolsonaro e da campanha de Lula para aprofundar os rumos das discussões e mostrar o que está em jogo para 2023 (veja detalhes de cada proposta ao fim do texto).

Na equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, os técnicos do Tesouro Nacional apresentaram internamente uma proposta e a Secretaria de Política Econômica (SPE) antecipou detalhes do seu modelo em evento não oficial. As duas abrem espaço para ampliar gastos em 2023 já contratados, como o Auxílio Brasil de R$ 600, mas mantém uma regra de controle do endividamento público por meio de regra de despesa.

Em campanha, Bolsonaro continua assumindo compromissos que aumentam as despesas. A promessa mais recente é de desonerar a folha de pagamentos do setor de saúde, com custo calculado pelo ministro entre R$ 1,5 bilhão e R$ 2,5 bilhões.

O desenho da nova regra do Tesouro é mais rígido. Já a proposta elaborada pela SPE é adaptada à estratégia do ministro Guedes de vincular o arcabouço fiscal às privatizações e desinvestimentos das empresas estatais. Com esse movimento, o ministro espera atender a demanda política por ampliação de investimentos e manutenção do Auxílio Brasil de R$ 600.

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Do lado da campanha de Lula, como antecipou o Estadão, a discussão gira em torno da necessidade ou não de uma regra de controle de despesas. Uma ala da campanha defende que não é necessária uma nova norma para limitar gastos, depois da revogação do teto de gastos, já que o compromisso de responsabilidade fiscal estaria centrado no regime de superávits primários (receitas menos despesas sem levar em conta os gastos com juros). Outro grupo defende a combinação de uma âncora de controle de gasto com crescimento real e meta de primário flexível para acomodar o limite de gasto mesmo se a receita frustrar.

Nas duas campanhas, o desenho de um novo arcabouço fiscal com a mudança do teto de gastos está associado à discussão de uma licença a mais para gastar em 2023 e cumprir as promessas. Economistas de fora das duas campanhas têm defendido regras mais simples após o teto ter sido furado várias vezes desde que entrou em vigor em 2017. Hoje, o limite está R$ 200 bilhões acima da regra original. O impacto tem sido atenuado pelo aumento da arrecadação que tem sido muito alto.

Em entrevista ao Estadão, depois de declarar apoio a Lula, o economista Pérsio Arida defendeu uma regra simples. “Superávit primário, dívida pública são variáveis que dependem de muitos outros fatores. Acho muito ruim prescindir de qualquer regra de controle de gasto”, disse Arida, que defendeu em documento outros cinco colegas a definição de um programa de gastos de R$ 100 bilhões por ano fora do teto até que seja definida uma regra fiscal.

Secretário de Fazenda de São Paulo, Felipe Salto, avalia que a melhor regra fiscal deve combinar três coisas fundamentais: simplicidade, aprendizado com as experiências passadas e algum grau de “contraciclicalidade”. Ou seja, uma regra que permita o aumento de gastos em momentos de queda da atividade econômica, evitando que o governo tenha que cortar despesa num cenário de desaceleração econômica.

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O desenho do secretário combina a dívida pública como referência, em meta de resultado primário e uma regra de gastos diferente da atual. Nesse modelo, uma resolução do Senado definiria um limite tendencial para a dívida bruta do governo geral. A partir da fixação da meta tendencial de dívida bruta, seria fixada a meta de resultado primário, na Lei de Diretrizes Orçamentárias, mas com uma diferença em relação ao que se tem hoje: a meta de primário estaria intrinsecamente relacionada à trajetória da dívida. Isto é, seria o esforço primário necessário para atingir aquela dinâmica específica de dívida. “O mais importante é ter um caminho claro para a política fiscal. Isso depende de compromisso político transparente”, afirma Salto.

O economista Nilson Teixeira, sócio da Macro Capital Gestão de Recursos, também defende uma regra simples e de fácil compreensão. Teixeira propõe a volta da regra de metas plurianuais de superávit primário, convergindo gradualmente para superávit primário de 2,5% do PIB em 2026 e limites para a expansão de despesas, como salários do funcionalismo público, gastos com a previdência dos funcionários públicos e de previdência social, entre outros.

Na avaliação do economista, Sergio Gobetti, que estuda os modelos de regras fiscais em outras países e chegou a desenhar para o Ministério da Fazenda uma regra fiscal com base no resultado fiscal estrutural (que retira os efeitos dos ciclos econômicos), existe relativa convergência ou compatibilidade entre a propostas que têm aparecido no debate público como alternativas diferentes para o regime fiscal: um limite positivo para o crescimento do gasto acima da inflação, vinculado ao patamar da dívida e também ao crescimento do PIB.

“O debate sobre o novo regime fiscal tem sido mal conduzido, como se a discordância fosse com a existência de um teto para o gasto, quando a real divergência sempre foi com a imposição de uma regra tão rígida que reduziria muito drasticamente os investimentos e inevitavelmente acabaria tendo de ser revista depois de alguns anos”, diz ele, que defende regras fiscais semelhantes à União Europeia, onde os resultados fiscais podem variar com o ciclo econômico e a despesa é limitada a crescer não mais do que o PIB de longo prazo. “É preciso distinguir bem uma regra de teto vinculada com o PIB de longo prazo com uma regra de teto variável com o PIB ou resultado fiscal de curto prazo. Nesse segundo caso, pode-se ter um comportamento pró-cíclico indesejável.

Entenda, abaixo, em detalhes cada regra.

Jair Bolsonaro participa de ato de sua campanha à reeleição em Duque de Caxias (RJ) Foto: André Coelho/EFE

BOLSONARO - Proposta do Tesouro

Qual o foco?

Controle de endividamento por meio de regra de despesa.

Qual o indicador de referência?

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Dívida líquida do governo geral.

Como funciona?

A despesa poderá crescer acima da inflação a depender do nível de endividamento. Há uma bonificação em caso de esforço fiscal maior do governante de plantão.

Como se aplica?

A taxa de crescimento real máxima das despesas por dois anos estará limitada a:

** Cenário com dívida líquida em alta:

Acima de 55% -> 0%

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Entre 45% e 55% -> 0,5%

Abaixo de 45% -> 1%

** Cenário com dívida líquida em queda

Acima de 55% -> 0,5%

Entre 45% e 55% -> 1%

Abaixo de 45% -> 2%

** Bônus

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No caso de superávit (contas no azul) e melhora do resultado primário (receitas menos despesas sem levar em conta o gasto com juros) médio dos últimos dois anos, as despesas poderão crescer mais 0,5 ponto porcentual (R$ 8 bilhões).

Quando se aplica?

Uma PEC precisa ser aprovada. Em 2023, primeiro ano de mandato, o presidente define a taxa de crescimento de 2024 e 2025.

BOLSONARO - Proposta da SPE (Secretaria de Política Econômica)

Qual o foco?

Permite o crescimento real das despesas vinculado ao PIB. O tamanho desse aumento dependerá do nível de endividamento.

Qual o indicador de referência?

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Dívida Bruta e PIB

Como funciona?

As despesas poderão crescer acima da inflação de forma permanente se o PIB crescer mais do 1%. Em períodos de recessão, poderá haver uma expansão temporária das despesas no mesmo tamanho da queda do PIB. Se o PIB crescer entre 0% e 1%, o teto não tem crescimento acima.

Como se aplica?

** Dívida bruta abaixo de 60% do PIB

O crescimento do teto acima da inflação será um ponto percentual menor do que o crescimento do PIB do ano anterior.

** Dívida pública entre 60% e 80% do PIB

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O mecanismo de crescimento real do teto só ocorre depois da evolução de 2% do PIB.

** Dívida acima de 80% do PIB

O crescimento real do teto só ocorre se a economia estiver em recessão.

Quando se aplica?

Se aprovada este ano, poderá entrar em vigor em 2023 permitindo uma expansão de gastos das despesas no primeiro ano do governo. Uma PEC precisa ser aprovada.

Qual a relação com as privatizações?

Autoriza que privatizações, concessões e reformas estruturais que economizem recursos possam elevar as despesas de forma temporária e parcelada. Esses recursos serão destinados a investimentos (25%), programas sociais de transferências de renda (25%) e abatimento de dívida (50%).

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Lula faz campanha em Recife Foto: Diego Nigro/Reuters

LULA - Proposta de retorno aos superávits

Qual é o foco?

Modernizar a regra de resultado primário (despesas menos receitas, exceto gastos com juros da dívida) para a busca de superávit (fechar as contas no azul). O teto de gastos é revogado e não há uma regra nova de controle das despesas.

Como funciona?

O retorno do regime de superávits primários adotado no governo Lula (2003-2010) passa a ser a principal âncora fiscal do País.

Como se aplica?

O resultado primário seria mais flexível com fixação de “bandas” com metas variáveis conforme o ciclo econômico. Na prática, esse tipo de regra se assemelha às chamadas metas de resultado fiscal ajustado ao ciclo econômico (conhecido como resultado estrutural). Em caso de desaceleração da economia e redução da arrecadação, poderia haver aumento de gastos como medida anticíclica (ou seja, ser propulsor da atividade). Outra opção é o desconto de investimentos prioritários e estimuladores do crescimento da meta.

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Quando se aplica?

A ideia é aprovar a mudança do arcabouço fiscal ao longo de 2023 combinada com uma licença (“waiver”) para ampliar os gastos no ano que vem destinados à continuidade programas e políticas públicas, como o Auxílio Brasil de R$ 600, que não cabe no orçamento com a regra atual de teto de gasto. Uma PEC teria que ser aprovada.

LULA - Proposta de regra de gastos combinada com primário flexível

Qual é o foco?

Combinar uma regra de controle dos gastos com uma meta de superávit flexível que possa mostrar uma trajetória de sustentabilidade da dívida aos agentes econômicos.

Como funciona?

Uma regra que defina o limite das despesas para os próximos anos. Mas abre espaço para um crescimento real (acima da inflação) das despesas. Uma das possibilidades é atrelar o crescimento das despesas à evolução do PIB. A meta de primário flexível permitiria acomodar o limite de gasto a um cenário de frustração de receita do governo.

Como se aplica?

O crescimento real das despesas permitiria a canalização para determinados gastos prioritários, como investimentos em infraestrutura e habitação popular, evitando a captura clientelista dos recursos do governo. A dívida pública é referência e não uma meta.

Quando se aplica?

A ideia é aprovar a mudança do arcabouço fiscal ao longo de 2023 combinada com uma licença (waiver) para ampliar os gastos no ano que vem destinados à continuidade programas e políticas públicas, como o Auxílio Brasil de R$ 600, que não cabe no orçamento com a regra atual de teto de gasto. Uma PEC teria que ser aprovada.

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