O crime organizado tomou conta do Rio de Janeiro. Eles fazem, eles solucionam, eles julgam e sentenciam, em geral, com a pena de morte. E eles mostram o tamanho do seu poder, como se viu nesta semana: a circulação na cidade foi interrompida. Recado dado.
Quando as imagens do poder do crime chegam ao público é um corre-corre. As autoridades fingem indignação. O ministro da Justiça abandona por instantes o palco das redes e a campanha para o STF para lançar um pacote de Segurança Pública ineficaz, que não sobreviveu 24 horas. De novo vem a Força Nacional. E o governo do Estado começa (mais) uma operação especial.
As vítimas desta tragédia cotidiana, resultado de uma guerra sem sentido às drogas, se acumulam. Guerra que já deve ter gerado muito mais mortes que o uso de entorpecentes. São anos para o STF definir algo simples como a diferença entre traficantes e usuários, sendo que são esses que lotam nossas cadeias. Eles não têm o prestígio de um Zinho, Dadá ou André do Rap, todos liberados pela “Justiça”.
A ausência do Estado é absoluta. Serviços básicos são “oferecidos” pela milícia. O Executivo não garante a segurança, e o Judiciário coloca nas ruas quem tem grana para se aproveitar das benesses que o Legislativo garante. Um regime de progressão sem sentido beneficia chefes de facção e milicianos para usufruir de prisão domiciliar. Eles somem na poeira da história.
Os efeitos negativos da violência para a sociedade são imensos. Ela mina o desenvolvimento do cidadão desde a primeira infância, período essencial de sua formação. Vale uma leitura cuidadosa de pesquisa recente realizada pela organização Redes da Maré sobre o assunto (disponível aqui). Os números lá falam por si. Trágicos.
Crianças e jovens das comunidades vivem em um ambiente de guerra. São vítimas de balas perdidas, transitam por ruas apertadas, sem área de lazer, cercada por muros, separadas por territórios disputados por facções e palco de operações policiais. Seu direito de ir e vir é ignorado. Perdem dias de aula preciosos. Sons de motos e helicópteros, que, em geral, anunciam nova guerra por território ou ação policial, deixam traumas. Sem falar nos tiros.
A pesquisa mostra que a violência direta e o medo têm o mesmo efeito sobre as crianças. Todos, pais e filhos, sofrem abalos que gerarão impacto sobre sua educação, produtividade no trabalho e saúde (física e mental), comprometendo seu futuro e aprofundando o fosso de desigualdade social. Tudo isso, no meio do nosso trajeto diário pelo qual passamos com indiferença.
Não posso encerrar sem agradecer as inúmeras mensagens que recebi e que me incentivaram a continuar ocupando este espaço. Obrigada.
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