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Empresas gastam 1,7% do PIB para se proteger da violência; custo chega a R$ 170 bilhões por ano

Falta de segurança no Brasil consome quase 6% do PIB, considerando também os gastos do governo e as perdas de produtividade, segundo o Ipea

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Foto do author Carlos Eduardo Valim
Foto do author Wesley Gonsalves
Atualização:

As empresas brasileiras gastam, por ano, cerca de R$ 171 bilhões para tentar evitar episódios de violência, segundo uma compilação feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgada no Atlas da Violência. O número equivale a 1,7% do PIB de 2022, o último ano com os dados completos disponíveis.

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O gasto direto das empresas na área é apenas parte do custo social e econômico imposto pela violência no Brasil. Estima-se que o custo total com segurança no Brasil represente, por ano, 5,9% do PIB, o equivalente a R$ 595 bilhões, ainda segundo o Ipea. A conta inclui, além dos gastos com segurança privada, as despesas do governo e as perdas de produtividade com homicídios.

Estudos similares chegaram a resultados parecidos. Em 2018, durante o governo do presidente Michel Temer, a Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos, ligada à Secretária-Geral da Presidência, publicou relatório que apontava para um crescimento substancial, entre 1996 e 2015, dos custos econômicos com a criminalidade, levando eles a representar 4,38% do PIB.

Outro estudo de 2018 sobre segurança pública, divulgado pela Confederação Nacional da Indústria, estimava perda anual de 5,5% do PIB, o que equivaleria a um imposto de cerca de R$ 1,8 mil pagos por cidadão, por ano, em valores da época.

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Custo total do País com segurança equivale a 5,9% do PIB Foto: DANIEL TEIXEIRA

Uma parte disso recai sobre as empresas — e se traduz em produtos mais caros e perda de produtividade. “As companhias precisam proteger seus funcionários e arcar com custos não atrelados a suas atividades operacionais”, afirma a administradora Maria Silvia Bastos, ex-presidente do Goldman Sachs, BNDES, Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e ex-secretária de Fazenda da cidade do Rio de Janeiro.

Atualmente, ela tem se dedicado a estudar o tema e a buscar formas de engajar a sociedade civil para melhorar a situação. “De diversas formas, a violência, que afeta a qualidade de vida e a ocupação de territórios por parte do crime organizado, compromete os investimentos e o crescimento econômico. Ela reduz a produtividade.”

O Estadão vem publicando nos últimos dias a série de reportagens (In)segurança Pública, que traz várias abordagens sobre o tema, como o avanço das milícias e do crime organizado. Nos próximos dias, as reportagens vão analisar os diferentes custos para as empresas com a falta de segurança no País. Os próximos textos vão abordar as perdas que o crime traz para as empresas, como os roubos de cargas, e os custos dificilmente percebidos, mas de grande impacto, causados por homicídios, regiões inseguras que afastam investimentos e perda de atratividade para o turismo.

Daniel Cerqueira, pesquisador do Ipea: "Empresas, governos e sociedade acabam gastando mais com segurança em vez de contratar trabalhadores e investir" Foto: Divulgação Daniel Cerqueira

“Os impactos econômicos da violência vão dos custos mais diretos aos mais ocultos, como os custos de extorsão por parte do crime organizado, que causam quebra regulatória”, diz a economista Joana Monteiro, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada a Segurança da Fundação Getulio Vargas.

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Os gastos diretos são os mais facilmente mensuráveis, traduzidos em pagamentos para proteção privada, equipamentos de segurança e contratação de apólices de seguros, por exemplo. Se esses valores ajudam a movimentar setores da economia, por outro lado, significam que não estão sendo aplicadas em atividades produtivas.

Ainda assim, os especialistas consideram que as pesquisas podem ser conservadoras em relação ao tamanho do problema. Mesmo que seja possível contabilizar os gastos com a contratação de seguranças e apólices de seguros para escritórios, não há pesquisas que consigam detalhar gastos pagos ilegalmente, como valores pagos a criminosos para evitar problemas.

“Devido à violência, empresas, pessoas, governos e toda sociedade terminam gastando recursos com bens e produtos para segurança, em vez de contratar trabalhadores, comprar máquinas ou buscar atividades para gerar bem-estar”, diz o economista Daniel Cerqueira, pesquisador do Ipea e membro do conselho do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Um estudo de 2018 da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), com empresários fluminenses, apontava que eles estimavam os seus custos de prevenção superiores às perdas já sofridas com a criminalidade.

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Gastos diretos das empresas

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O setor de segurança privada movimentou R$ 36,3 bilhões em 2021, segundo a última estimativa da Federação Nacional das Empresas de Segurança e Transporte de Valores (Fenavist). Ele engloba 4.804 empresas e emprega 485 mil vigilantes privados, segundo dados de 2023 do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Outro setor que serve de termômetro da preocupação das empresas com a violência é o de seguros. Duas categorias bastante consumidas pelas empresas são as de seguros de transportes, que arrecadou R$ 5,3 bilhões em 2023, e a de seguros empresariais, que movimentou R$ 3,9 bilhões, segundo a Confederação Nacional das Seguradoras.

As indenizações pagas, no ano passado, também foram bilionárias. As seguradoras desembolsaram R$ 2,6 bilhões em transportes e R$ 1,7 bilhão por incidentes empresariais.

Dono de uma transportadora de combustíveis, Márcio Takao estima gastar por ano cerca de R$ 30 mil em serviços de seguro ambiental, de carga e do caminhão, além dos custos com equipamentos de monitoramento em tempo real, câmeras de seguranças e outros itens para conseguir trafegar com a produto que leva para abastecer os postos na região noroeste do Estado. “Pagar esse serviço custa muito caro. Às vezes, algumas empresas preferem perder um caminhão ou dois no ano do que pagar o seguro de toda a frota”, diz.

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No ano passado, a contratação de seguros patrimoniais cresceu 18,7%. “Esse crescimento não é normal. Tem a ver com o crescimento da economia, mas também com a percepção de riscos que as empresas têm de sofrerem com eventos climáticos ou com segurança”, afirma o presidente da comissão de riscos patrimoniais massificados da Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg), Jarbas Medeiros.

Segundo ele, os estabelecimentos mais visados e que mais precisam contratar seguros são comércios, concessionárias, estacionamentos (ambos devido a roubos de carros), postos de gasolina, hotéis e motéis, restaurantes e até academias de ginásticas. Os roubos hoje são mais voltados a produtos e equipamentos eletrônicos, e não existem muito mais casos de roubo de dinheiro, depois da digitalização dos pagamentos, que acontecem principalmente por meio de cartões e por PIX.

Quanto aos seguros de cargas, esse é um custo obrigatório, já que cada caminhão, por lei, precisa ter apólice para risco de roubo e de acidentes veiculares. Mas nem sempre é fácil contratar o serviço. Se, para veículos que circulam pelas estradas do Sul e do Sudeste, rotas importantes para a indústria, há muita concorrência, não é o que acontece em regiões fortes do agronegócios.

Não retorno

“Temos um grande problema no setor de grãos. A maior parte do transporte é feita por terceiros, não pelos produtores ou pelas transportadoras. Então, o caminhão tem menos manutenção, e na alta safra acontece muito desvio de carga e apropriação indébita”, diz o vice-presidente da Comissão de Transportes da Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg), Marcos Siqueira. “No agronegócio, o risco é altíssimo.”

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Por isso, segundo ele, se existem cerca de 40 seguradoras que atuam em apólices de transportes, apenas cerca de cinco delas topam segurar cargas de grãos, o que encarece o serviço. “O governo precisa investir em segurança nas estradas e em infraestrutura melhor, incluindo sinal de comunicação, para os rastreadores das cargas funcionarem pelo interior do País. E as transportadoras precisam usar mais tecnologia”, afirma. “Os bandidos estão na frente.”

Segundo Maria Silvia Bastos, o risco do Brasil é chegar num ponto de não retorno, o que afetaria decisivamente o futuro do País. “Existe um ponto de virada, que, se ultrapassado, a partir daí, ninguém acredita mais no País, ninguém investe mais, e as famílias começam a tirar os recursos do País.”

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