Por que cada vez mais empresas avaliam sair da bolsa ou se blindar contra ‘ofertas hostis’

Companhias têm consultado bancos e consultorias para ver as possibilidades de fechar o capital, além de adotar medidas para evitar investidores oportunistas

Foto do author Cynthia Decloedt
Foto do author Altamiro Silva Junior
Atualização:

A queda acentuada no valor das ações na Bolsa tem levado algumas empresas a adotar estratégias para reagir às cotações baixas. Algumas buscam assessoria de bancos de investimento para esclarecer dúvidas sobre o fechamento de capital, enquanto outras implementam medidas de proteção. Essas ações incluem acordos com acionistas e ajustes em cláusulas que restringem o aumento de participação, com o objetivo de dificultar a atuação de investidores oportunistas no caso de ofertas hostis de compra.

PUBLICIDADE

As cotações de algumas empresas da Bolsa descolaram de fundamentos econômicos do negócio. Ou seja, apesar do desempenho de alguns ativos, as ações estão em queda. Na B3, não é difícil encontrar companhias com quedas acima de 90% em suas ações nos últimos 12 meses. A Gafisa, por exemplo, caiu 87%; Braskem, 59%; Vamos, 50%; e Raízen, 48%.

Vários fatores explicam o desempenho negativo do mercado acionário. No cenário internacional, o aumento do risco geopolítico e as novas medidas adotadas por Donald Trump na presidência dos Estados Unidos têm deixado os investidores cautelosos.

No mercado doméstico, o avanço da dívida pública intensifica o risco fiscal, enquanto a pressão inflacionária exige uma política de juros mais rígida. Esse conjunto de elementos contribui para a queda dos preços das ações na Bolsa. Isso sem contar questões setoriais específicas ou endividamento das empresas.

Publicidade

Nesse ambiente, alguns pedidos de fechamentos de capital já foram encaminhados e anunciados por empresas como Carrefour, Wilson Sons, Santos Brasil e Eletromídia, os três últimos casos relacionados a processos de aquisição. A Serena Energia tem uma discussão em andamento.

Em entrevista ao Estadão/Broadcast, o presidente da B3, Gilson Finkelsztaino, ressaltou que a onda de empresas considerando sair da bolsa é passageira e reflete o fato de que “a Bolsa está barata”. “Deslistagem é uma função do preço, de que existe uma visão de que a empresa está muito barata e o mercado não está apreçando corretamente o valor futuro dessa empresa”, afirma.

Para banqueiros ouvidos pelo Estadão/Broadcast, esse é um ano que teremos coisas invertidas em renda variável. Ou seja, o número de empresas fechando o capital pode superar o de aberturas, que seria o mais natural.

Na B3, não é difícil encontrar companhias com quedas acima de 90% em suas ações nos últimos 12 meses Foto: Werther Santana/Estadão

Na visão dos empresários, ao fechar o capital, eles terão mais capacidade de alavancar sua companhia sem o escrutínio do mercado. O mais provável, no entanto, é a de que a maioria dos fechamentos de capital aconteça em um contexto da entrada de um novo sócio ou venda do ativo.

Publicidade

A avaliação de fechar capital não é uma conversa simples. Pode esbarrar em brigas entre acionistas que não querem se desfazer das ações na baixa, trazer desgaste e, portanto, risco de imagem.

Outro executivo da Faria Lima observa que fechar capital tem custo relevante, especialmente porque para fazer uma volta ao mercado, por meio de oferta inicial de ações, tem de aguardar uma janela e ainda pode gerar certa desconfiança de investidores com aquela companhia, que era aberta, fechou o capital e quer ser aberta de novo.

Em recentes reuniões do Santander Brasil com investidores no Rio, uma das principais demandas dos investidores foi sobre questionamentos de um potencial fechamento de capital da subsidiária brasileira pela matriz espanhola, de acordo com um relatório da Genial Investimentos.

O analista da Genial Eduardo Nishio ressalta no texto que o tema é uma “especulação”, e que não houve nenhuma sinalização do Santander Espanha sobre um movimento neste sentido. A razão das perguntas, diz ele, é que a filial brasileira está “barata” quando comparada aos múltiplos da matriz em Madrid e o fato de, em 2023, o Santander Espanha ter fechado o capital da subsidiária no México.

Publicidade

Potenciais casos

Após os casos recentes de matrizes fechando o capital de subsidiárias brasileiras, como a do Carrefour, que ofereceu prêmio de 30%, os analistas do Bradesco BBI foram atrás de potenciais novos casos e encontraram 31 empresas listadas na América Latina já dominadas por estrangeiros e que, eventualmente, poderiam querer comprar as demais ações. Nelas, os estrangeiros têm uma participação média de 54%, um prêmio que permite aquisições e espaço para valorizar mais o papel para os outros sócios.

O time de analistas do Bradesco BBI vê, no entanto, como “exageradas” as preocupações com a diminuição do mercado de ações do Brasil. O número de ações listadas localmente caiu 13% nas últimas duas décadas. Contudo, esse movimento é semelhante ao que aconteceu nos EUA e à tendência global.

Blindagem

Outro movimento que acontece como consequência da queda expressiva das ações é que as companhias em Bolsa ficam expostas a ofensivas de compradores por meio de ofertas hostis, via mercado, e em transações nem sempre visto como vantajosas pelos controladores.

Para se blindar de ofertas desse tipo, a Hypera, por exemplo, anunciou na semana passada que o Grupo Votorantim dobrou sua participação na empresa, chegando a 11%. Já a Hapvida aprovou no mês passado a inclusão no estatuto da companhia a “pílula de veneno”, que obriga uma oferta pública de aquisição de ações (OPA) no caso de qualquer acionista ou grupo de acionistas atingir participação igual ou superior a 20% do capital da operadora de saúde.

Publicidade