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Entidades contestam acordo entre Anatel e teles e pedem intervenção da AGU

Segundo Coalizão Direitos na Rede, que reúne cerca de 50 organizações, aprovação de acordos ignorou ponderações dos técnicos do TCU e alegações de danos ao erário citados pelo Ministério Público

Foto do author Circe Bonatelli

Entidades de defesa dos direitos digitais pediram à Advocacia-Geral da União (AGU) que intervenha preventivamente em acordos firmados nas últimas semanas entre a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e as concessionárias de telefonia fixa, com aval do Tribunal de Contas da União (TCU).

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A Coalizão Direitos na Rede (CDR) entrou com uma ação protocolar para que a AGU atue no processo de migração das concessões públicas para autorizações privadas de empresas de telecomunicações, particularmente em relação a ativos conhecidos como bens reversíveis (redes, antenas e imóveis, por exemplo, associados à prestação do serviço de telefonia fixa) que deveriam voltar para a União ao fim da concessão.

Com a mudança do regime de concessão para autorização privada, as empresas ficam livres da maior parte das obrigações, como a custosa manutenção de orelhões e centrais telefônicas, por exemplo.

A CDR reúne cerca de 50 organizações acadêmicas e da sociedade civil em defesa dos direitos digitais. Entre os associados estão o Proteste, Transparência Brasil, Associação Software Livre, Creative Commons Brasil, Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), Internet Sem Fronteiras, entre outros.

Anatel aprovou acordos de investimentos com a Vivo no valor de R$ 4,5 bilhões e com a Oi de 5,9 bilhões Foto: Sinclair Maia/Anatel

Na visão da CDR, a aprovação do acordo ignorou as ponderações da auditoria realizada pelos técnicos do TCU e também as alegações de danos ao erário citados pelo Ministério Público.

“Elas não podem ser ignoradas, especialmente porque ambas estão fundamentadas na defesa do erário e do interesse público, diante do risco de vultoso prejuízo que alcança a casa de bilhões de reais”, descreve a petição, assinada por Fabricio Solagna, secretário executivo da CDR.

No documento, a CDR cita que, anteriormente, o Proteste já havia obtido uma vitória na Justiça em processo que determinou a divulgação das listas completas de bens reversíveis, o que não foi cumprido até então. A CDR diz ainda que houve falhas na avaliação desses ativos na negociação atual no TCU, de modo que cerca de metades deles foi classificado como valor “zero”. Ou seja, sem valor algum.

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Nesse contexto, a CDR relembra do acórdão 3.311/2015, no qual o TCU estimou o valor dos bens reversíveis em R$ 121 bilhões, enquanto a Anatel aprovou acordos de investimentos com a Vivo no valor de R$ 4,5 bilhões e com a Oi de 5,9 bilhões.

Na visão da CDR, esses valores são “incompatíveis com o real valor do acervo de bens associados às concessões, que incluem milhares de imóveis, redes de telecomunicações, e seus respectivos dutos, que dão suporte não só à telefonia fixa, mas também à banda larga”, descreve, na petição. A instituição critica ainda a premissa adotada pela Anatel de avaliar os bens reversíveis com base apenas na capacidade de prestação de serviço, ignorando seu valor patrimonial.

No pedido de intervenção, a CDR cita frase do conselheiro da Anatel Alexandre Freire que, durante seu voto sobre o acordo no conselho diretor da Anatel, afirmou que “a solução consensual pode apresentar desfecho diverso do que no estado de normalidade institucional ocorreria, uma vez que haverá suspensão episódica da legislação de regência e dos precedentes da agência, formando uma necessária jurisprudência de crise”.

Em seguida, a CDR rebate no documento: “Ocorre que o ‘desconto’ a que se refere o representante da Anatel terá implicações definitivas para a finalidade de universalização dos serviços de telecomunicações e conexão a internet, pois reduzirá drasticamente os possíveis investimentos em novas redes de alta capacidade”.

Imbróglio de anos

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O futuro da concessão da telefonia fixa é um imbróglio que se arrasta há anos. O contrato de concessão foi firmado em 1998, na época da privatização das telecomunicações, e ia até 2025. O período foi marcado pelo auge e declínio do uso do telefone fixo para ligações de voz, afastando o interesse das empresas em prolongar o contrato.

Além disso, Oi e Vivo também cobravam da União dezenas de bilhões de reais por um alegado prejuízo em ter que manter as obrigações regulatórias do contrato firmado em 1998 para manutenção da telefonia fixa, serviço que vem caindo em desuso.

Com o acordo, a Oi e Vivo ficaram livres da maior parte das obrigações do contrato original de concessão. As teles também passaram a ser as donas definitivas dos bens reversíveis. Em troca, elas ficaram responsáveis por investimentos em telecomunicações, segundo a política pública apontada pelo Ministério das Comunicações.

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Nos bastidores, fontes ligadas às empresas alegam que boa parte dos bens reversíveis perderam valor, por se tratar de equipamentos antigos, defasados e/ou que deixaram de ser usados na prestação do serviço atualmente. Portanto, na visão deles, seria um absurdo adotar o cálculo de um valor de R$ 121 bilhões para esses ativos. Esse número, aliás, equivale a 81% do patrimônio bruto somado de Oi (R$ 26 bilhões) e Vivo (R$ 124 bilhões), que alcança R$ 150 bilhões.

Agora, a AGU terá que se manifestar sobre o acordo. No caso da Oi, há que se considerar ainda há uma dívida bilionária com a União no processo de recuperação judicial da tele. Sem o acordo aprovado pelo TCU, a capacidade da Oi de honrar essa dívida fica comprometida, bem como suas outras obrigações com credores dentro do plano de recuperação, e a própria capacidade de manter o serviço de telefonia fixa.

Aí, caberia à União assumir a prestação do serviço, que é deficitário e custaria outros bilhões por ano aos cofres públicos. Em outras palavras, os acordos no âmbito do TCU tiveram de lidar com uma situação de minimização dos danos, porque não tem aí situação ideal.

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