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Pressão sobre o Banco Central para cortar juros deve ser ainda maior em abril, diz Heron do Carmo

Para professor da FEA/USP, saída do efeito da guerra da Ucrânia sobre os preços deve aliviar em abril o IPCA acumulado em 12 meses, mas tendência para o ano é de piora da inflação

Foto do author Márcia De Chiara
Atualização:
Entrevista comHeron do CarmoProfessor sênior da FEA/USP

O economista Heron do Carmo, professor sênior da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo e um dos maiores especialistas em inflação do País, vê dias difíceis para o Banco Central. Em abril, quando a inflação acumulada em 12 meses deve recuar para algo em torno de 4%, por conta da saída das pressões de preços acumuladas por causa da guerra da Ucrânia, as pressões para autoridade monetária cortar juros básicos, hoje em 13,75% ao ano, serão maiores.

Por ora, ele diz que o Banco Central foi correto ao manter os juros na última reunião do Copom. “Tirou-se o teto (de gastos) e não foi colocado nada no lugar”, afirma. Para o economista, a piora das expectativas de inflação para este ano, segundo ele, mais perto de 6% do que de 5,5%, decorre da falta de uma âncora fiscal.

Na sua avaliação, se for anunciado um novo arcabouço fiscal factível e que mereça crédito dos agentes econômicos, será possível ancorar as expectativas e ter uma evolução melhor para a inflação e para economia. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Com um novo arcabouço fiscal factível e que mereça crédito dos agentes econômicos será possível ancorar as expectativas e ter uma evolução melhor para a inflação e para economia, diz Heron do Carmo Foto: Hélvio Romero/Estadão

Qual é a tendência da inflação para este ano?

A inflação vai ficar muito parecida com a do ano passado. Só que, neste ano, não teremos a redução de imposto que houve entre julho e setembro de 2022. O corte no imposto reduziu muito a inflação que tinha chegado no ano passado a 12% e fechou dezembro em torno de 5%.

Qual será a trajetória da inflação em 2023?

Tudo indica que devemos ter uma inflação em queda até abril (por causa da saída do efeito nos preços da guerra da Ucrânia). Fazendo uma conta de padaria, a inflação em 12 meses por volta de abril estará 1,60 ponto porcentual menor ante 2022. Em 12 meses, a inflação deve cair de 5,77% para algo em torno de 4%. Isso deve criar uma pressão muito grande sobre o Banco Central (para corte nos juros). Depois deve se manter nesse patamar baixo em maio e junho. E deve voltar a subir entre julho e setembro. A nossa taxa de inflação neste ano vai refletir uma situação mais normal, sem intervenção (corte de imposto).

E o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) deve fechar o ano em quanto?

Estava projetando inflação entre 5,5% e 6%. Cheguei a projetar menos. Agora espero algo mais próximo de 6% do que de 5,5%.

Por quê?

Poderíamos ter uma inflação mais baixa desde que houvesse uma sinalização do governo, principalmente na questão fiscal. Se tivermos um novo arcabouço fiscal, se for algo factível e que mereça crédito dos agentes econômicos, poderemos ancorar as expectativas (de inflação). Ancorando as expectativas, poderemos ter uma evolução melhor para a inflação e para economia como um todo. Precisa ser definido esse arcabouço fiscal e encaminhada a reforma tributária. Essas são duas questões fundamentais. No momento, os sinais da economia não são bons. Há problemas de crédito. Essa dificuldade pode contribuir para, adicionalmente, travar a economia. Seria bom para reduzir a inflação. Mas é uma solução ruim. O melhor é que tenhamos redução da inflação com economia apresentando algum crescimento.

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Além da ausência da âncora fiscal, há outros fatores que levaram à piora da sua expectativa de inflação para este ano?

A economia mundial está dando sinais de atividade econômica muito melhor do que se pensava, descartando a recessão. Isso é bom para a atividade, mas também é um problema. Se, de fato, a perspectiva for essa para economia mundial, isso pode levar as autoridades monetárias a subirem juros, principalmente nos Estados Unidos. O efeito será a valorização do dólar, desvalorização do real e pressão sobre a inflação.

E na vida real, o que pressiona a inflação?

É aquela encrenca toda da economia brasileira. Como há indexação, é difícil a inflação do ano apresentar uma queda muito relevante relativamente à inflação do ano anterior. Mas, a meu ver, mesmo fechando em 6% (a inflação de 2023), não dá para desconsiderar o papel que a política monetária teve. A política monetária vai fazer com que a inflação dos núcleos (de inflação) saia de 9% para 6%.

O Banco Central está correto em manter juros em 13,75% ao ano?

Na última reunião (do Comitê de Política Monetária), sim. Porque tirou-se o teto (de gastos) e não foi colocado nada no lugar.

Qual é a sua avaliação do Banco Central no embate com o governo na questão dos juros?

Enquanto não houver uma definição mais precisa do novo arcabouço fiscal, o Banco Central está sendo prudente. Quando houver uma definição, isso pode até, e deve, levar o Banco Central a rever a sua posição, considerando, inclusive, que teremos uma redução muito expressiva na inflação em 12 meses até abril.

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