De malas prontas para levar a família de Brasília para o Rio de Janeiro, o diretor financeiro e de relações com investidores da Petrobras, Fernando Melgarejo, fez ao Estadão/Broadcast um balanço dos seus primeiros cinco meses no cargo. Ao lado da presidente da estatal, Magda Chambriard, ele vem agradando tanto o mercado como a controladora da empresa: a União. Para 2025, a fórmula continuará a mesma: pagamento de dividendos sempre que possível e otimização dos robustos ganhos da companhia.
Reajustes para os combustíveis não estão nos planos de curto prazo. Se, por um lado, o dólar sobe em relação ao real e a outras moedas do mundo, o preço do Brent tem caído, e não é preciso “correr para dar reajuste”.
Melgarejo destaca ainda que 80% dos analistas indicam hoje compra dos papéis da companhia, e 20%, manutenção. Nenhum indica venda. “É um dos melhores índices que a gente tem desde 2021”, disse o executivo, comemorando o retorno para os investidores de 20% das ações ordinárias no ano e de 17% para as preferenciais.
Leia, a seguir, os principais pontos da entrevista:
Como o senhor avalia a Petrobras desde a sua chegada?
Avalio que, desde a entrada da Magda até o final do ano, a Petrobras, de alguma forma, está mais fortalecida. Várias coisas aconteceram nesse período. É óbvio que tem, sim, uma construção de todos os funcionários ao longo do período, mas a dinâmica e a integração da diretoria hoje, de uma forma interna, tanto quanto externa, está muito mais agregativa. E, com isso, a gente conseguiu trazer, por exemplo, a antecipação de sistemas de produção. O que isso significa? Muito mais capacidade de produção. A gente está com uma capacidade maior de gás e de diesel. Em breve, a gente tem mais uma novidade, que vai ser a antecipação do (FPSO, ou unidade flutuante de armazenamento e transferência, na sigla em inglês) Almirante Tamandaré, onde a gente vai ter a produção de 225 mil barris dia e será instalado no campo de Búzios.
Como está sendo o impacto da alta do dólar na Petrobras?
Não posso falar sobre o quarto trimestre, mas posso trazer o exemplo do segundo trimestre. No segundo trimestre, tivemos um aumento abrupto do dólar, e a cotação trouxe dois efeitos para a gente. Um de forma bem direta, que vem como despesa de variação cambial no resultado. Então o dólar afetou negativamente o lucro líquido comparando um trimestre com o outro. Se eu tiver aumento, ele impacta negativamente. Por outro lado, eu posso até ter efeito positivo na geração de fluxo de caixa, porque 30% da produção a gente exporta. Se exportar a R$ 6,20 (o dólar), eu tenho mais renda do que se eu exportar R$ 5. Então, eles têm efeitos contraditórios no curto prazo. Mas os grandes efeitos que eu posso trazer são esses.
Não seria então um bom momento para o reajuste dos preços da gasolina e do diesel?
Não, não tem uma hora certa (para o reajuste), a gente vai avaliar. Não sabemos se o dólar vai ficar nesse patamar, se o dólar vai voltar a um patamar diferente. Não vou nem dizer quanto é, mas ele pode voltar. Está, é muito cedo para dizer. Qual é o novo patamar? Se ele vai voltar ou não. Tem muita coisa acontecendo no País, em especial na questão fiscal, que pode modificar isso. Fiscal e monetária. A política fiscal está passando no Congresso com algumas aprovações. Então, a gente está olhando o mercado e aguardando. Mas, sem dúvida, se for feita qualquer coisa, vamos comunicar no tempo certo. Não tem essa correria de ter que aumentar. Não existe isso. A gente está num patamar confortável e seguindo a política de comercialização.
A Petrobras surpreendeu o mercado este ano com o anúncio da entrada na produção de etanol. O que podemos esperar para 2025?
Está num período bem incipiente ainda. Todos os negócios com baixa emissão de CO₂ a gente vem buscando fazer parcerias, onde se cresça junto. A matriz energética de etanol é uma matriz que já está bem consolidada, já tem uma parte industrial bacana, e temos toda a parte de logística, tancagem, etc., que a gente pode ter sinergia. Tem muito mais sinergia hoje com o líquido do que com o elétron, com a energia. Dentro da molécula é onde a gente tem a grande sinergia e que a gente entende que vai poder aproveitar mais isso dentro da nossa matriz de geração de energia renovável. Outro ponto é que a gente tem o etanol, ele tem um retorno também um pouco melhor do que os outros, de solar e eólico.
E já foi definido se a linha será pelo etanol de cana-de-açúcar ou de milho?
A que trouxer maior retorno. Vamos investir na hora que entendermos que temos o melhor retorno financeiro, criação de valor para o acionista, aumento de dividendo futuro. É aí que a gente vai tomar nossa decisão empresarial. Não tenho paixão por nenhum. Qual é mais eficiente? Ou qual é o melhor portfólio de sustentável de longo prazo? Meus técnicos estão trabalhando. Tem ainda o etanol de segunda geração, que é uma outra possibilidade. Não está totalmente desenvolvido, mas são possibilidades.
Por que a Petrobras encerrou o programa de recompra de ações?
Não é mais uma prioridade para a gente, pelo menos nesse curto espaço de tempo. Encerramos o projeto de um bilhão de ações até agosto. A gente tem duas classes de ações, as ordinárias e as preferenciais, e a recompra estava se dando nas preferenciais. Se faço recompra nas ordinárias, tem uma relação dos acionistas que pode modificar. E quando tenho somente preferenciais, eu posso não ter o efeito positivo desejado. Além disso, ela reduz do fluxo de caixa livre, que é quase 100% dos dividendos. No curto prazo, há uma redução de dividendos para todo mundo. Pode beneficiar no longo prazo, mas a gente fez algumas avaliações e nesse momento a gente então encerrou.
A Petrobras se tornou uma grande pagadora de dividendos, mesmo com prejuízo, o que tem agradado o mercado. Quanto foi distribuído este ano?
Foram R$ 102 bilhões retornando para a sociedade na forma de dividendos. A gente é um dos maiores pagadores de dividendos no Brasil, talvez no mundo, fruto da geração de caixa que a gente tem. Realmente é uma companhia que tem uma geração de caixa positiva, bastante forte, e todos os nossos indicadores são pautados por essa geração de caixa. Permanece a nossa visão de pagar 45% do fluxo de caixa livre. Não há nenhuma discussão a esse respeito, se tem que mudar, se não tem que mudar. Ele é algo que continua como um compromisso da Petrobras, que o ordinário é 45% do fluxo de caixa livre.
E sobre os dividendos extraordinários? Qual a expectativa em relação ao quarto trimestre?
Um ponto que a gente acertou bem na mão, estudamos bastante, foi o extraordinário. Que é a tese de que o excesso de caixa não nos ajuda, então o excesso de caixa será assim. Ou a gente busca investimentos, de preço e valor, ou então a gente faz a distribuição de dividendos. Com diversos cenários probabilísticos, e tendo um nível de confiança adequado, mas não só o nível de confiança, também fundamentos adequados. O nível de confiança é estatístico, o fundamento vai além do estatístico. Aí, sim, a gente vê o melhor nível para a companhia, o que é melhor para a companhia, e faz a distribuição do (dividendo) extraordinário. Essa é a lógica que a gente quer imprimir aqui dentro.
O mecanismo da reserva de capital permanece?
A reserva da remuneração de capital é perene. Toda vez que eu entender que tenho lucro, que não vou fazer distribuição do seu lucro total, vou lá e aciono a remuneração da reserva de capital. Posso oferecer para sempre. Isso vai se dar em toda Assembleia-Geral Ordinária, a distribuição do que fazer com o resultado, que acontece normalmente em abril. Este ano a gente zerou a reserva com a distribuição do extraordinário. Então, o que se avalia é assim. A gente vai fazer a avaliação a partir do resultado do quarto trimestre, se vai sobrar reserva, se vai sobrar lucro para a composição de reserva ou não. Posso ficar zerado? Posso. Não tem problema nenhum também.
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