Conta de luz pode subir 7,5% com ‘jabutis’ mantidos em relatório das eólicas offshore

Projeto das usinas em alto-mar carrega seis medidas alheias à proposta original, como o estímulo às usinas a carvão e contratação de térmicas a gás em regiões sem oferta da matéria-prima

PUBLICIDADE

Publicidade
Foto do author Alvaro Gribel
Atualização:

BRASÍLIA – O relatório do senador Weverton (PDT-MA) sobre o projeto de lei que cria o marco regulatório para produção de energia eólica em alto-mar (offshore) manteve seis “jabutis” que vão encarecer a conta de luz em torno de 7,5%, pelas contas da Frente Nacional dos Consumidores de Energia e da consultoria PSR Energy.

PUBLICIDADE

O texto foi apresentado na terça-feira, 4, durante audiência na Comissão de Infraestrutura (CI) do Senado, mas sua votação foi adiada após pedido de vistas (mais tempo para análise) coletiva.

O custo anual das medidas, segundo a PSR, é de R$ 17 bilhões por ano. Esse valor será incorporado à conta de luz, o que gerará o aumento de custo estimado. Procurado, o Ministério de Minas e Energia não se manifestou.

Durante a tramitação do projeto de lei das eólicas offshore na Câmara, houve a incorporação de oito 'jabutis'; no relatório do Senado, seis foram mantidos. Foto: Andrei Netto/AE - 17/01/2008

Segundo o presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, Luiz Eduardo Barata, ex-diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), o relatório do senador manteve a apreensão entre os consumidores de energia.

Publicidade

“O relator retirou dois jabutis, mas deixou seis, dentre eles os que mais nos preocupam, que são a inclusão de térmicas a gás inflexíveis (que ficarão ligadas em pelo menos 70% do tempo) no sistema e a extensão do subsídio para o carvão”, afirmou. “O projeto, como está, continua provocando aumento no sistema de mais de R$ 440 bilhões até 2050, o que significa um aumento anual no custo da energia de 7,5%. Além de provocar um aumento da produção de gases de efeito estufa.”

Até 2050, a estimativa da PSR é de que as propostas, se aprovadas, tenham um custo de R$ 697 bilhões. Como parte das medidas são prorrogação de subsídios já concedidos – e que já terão impacto de R$ 253 bilhões – o efeito “líquido” das propostas é de R$ 444 bilhões (veja a tabela abaixo).

Entenda os ‘jabutis’

Durante a tramitação do projeto de lei das eólicas offshore na Câmara, houve a incorporação de oito medidas que não tinham relação com a proposta original. No linguajar do Congresso, essas medidas alheias ao texto ganham o apelido de “jabutis”.

Dois desses jabutis foram recusados pelo senador Weverton, mas seis foram mantidos, entre eles, a contratação de térmicas a gás de forma compulsória em regiões do País que não têm abastecimento do produto e a contratação compulsória de energia gerada por pequenas centrais hidrelétricas (PCHs).

Publicidade

O projeto aprovado na Câmara tinha um impacto de 11% na conta de luz, pelas contas da PSR, feitas no início da tramitação do projeto, em 2023. Agora, com a retirada das duas medidas, esse valor caiu para 7,5%. Uma prorrogava incentivos para projetos de minigeração distribuída e outra postergava o prazo para projetos renováveis entrarem em operação com subsídios.

O maior custo do projeto vem de um jabuti para viabilizar as termelétricas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Na privatização da Eletrobras, ficou determinado que haveria um preço teto para a contratação dessa energia. Mas o leilão de 2019 ficou vazio, sem interessados. Agora, o PL retira esse preço teto – o que na prática, vai embutir no preço da energia a ser paga pelos consumidores o custo de construção de gasodutos que vão sair da costa do País até essa regiões onde não há gás.

Outro custo elevado é a contratação compulsória de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), que também têm custo de construção mais elevado do que outras fontes disponíveis no sistema. Essa diferença entre o que vai ser pago pelos consumidores e o que poderia ser pago por fontes mais baratas é o que está sendo considerado pelas entidades no cálculo.

Lucien Belmonte, presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro) e porta-voz do União Pela Energia, movimento que reúne 70 associações da indústria brasileira, diz que os jabutis colocam o Brasil na contramão do mundo, com aumento do custo da energia e também da emissão de gases de efeitos estufa.

Publicidade

“Não tem a menor chance de este projeto dar certo para o Brasil como um todo, porque estamos encarecendo, emburrecendo, indo na contramão do mundo – por exemplo, com o absurdo do carvão”, afirmou.

Líder diz que governo é contra

Segundo o relator do projeto, senador Weverton, os “jabutis” foram incorporados em um único artigo da lei, para que eles sejam analisados em conjunto e não atrapalhem a análise da eólica offshore, que é o principal objetivo da proposta. Segundo ele, o setor elétrico é formado por interesses difusos, mas todos beneficiados pelos próprios subsídios, sem que ninguém queira abrir mão do que já recebeu.

“Eu nunca tinha tratado sobre esse assunto concreto, da legislação da energia do País. Tive a árdua missão de ouvir todos os setores. Estou começando a formar opinião. É preciso, urgentemente, o governo rediscutir essa questão da política energética do País. Todos, sem exceção, inclusive da energia limpa, competem sempre de forma muito dura com os demais, mas nenhum veio me pedir para abrir mão dos subsídios que têm”, disse.

O vice-líder do governo no Senado, Otto Alencar (PSD-BA), disse que a orientação é votar pela retirada de todos os jabutis. “Nós temos um questionamento dentro desse projeto, um artigo que dá incentivos fiscais a uma série de matérias que são estranhas inclusive à proposta inicial desse projeto de lei. Montante muito alto, quase R$ 30 bilhões de novos incentivos fiscais, e o governo não concorda com essa posição. Preparei emenda supressiva para esse artigo como um todo”, afirmou.

A interlocutores, Weverton disse que o mais importante, neste momento, é conseguir aprovar o marco regulatório das eólicas offshore, que está parado no Congresso, sem que a exploração possa começar. O seu entendimento é de que o governo federal poderá vetar o artigo com os jabutis, o que levaria a uma nova análise pelo Congresso – para manter ou derrubar os vetos –, mas sem que isso atrase a proposta das eólicas.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.