Desde a aprovação da reforma da Previdência, a economia deixou de ser a principal fonte de incerteza de médio prazo no Brasil. Já as crises causadas pelo presidente Jair Bolsonaro e o seu entorno – familiares e assessores – alçaram a política como o maior fator de instabilidade.
Com a Previdência aprovada na Câmara, o sentimento de analistas é que a ameaça de um colapso fiscal está afastada, injetando maior confiança e previsibilidade macroeconômica, essenciais para o investimento e o consumo.
A agenda de reformas, aliás, está avançando com surpreendente rapidez, mas isso graças ao Congresso. Os parlamentares chamaram para si a responsabilidade de promover mudanças urgentes nos benefícios previdenciários e no sistema de tributos e impostos.
O presidente Bolsonaro mais atrapalhou do que ajudou durante a tramitação da reforma na Câmara. A bola agora está com o Senado.
Quanto à reforma tributária, enquanto uma proposta já tramita na Câmara e outra no Senado, o governo ainda não apresentou o seu projeto.
É verdade que, até o momento, o desempenho da atividade tem ficado muito aquém do esperado em 2019. Depois de uma queda de 0,2% no primeiro trimestre, há o risco de o PIB do segundo trimestre ficar estável ou negativo, o que, nesse caso, colocaria a economia brasileira em recessão técnica.
Além de ter sofrido com um cenário externo mais adverso nos primeiros seis meses deste ano, em meio à guerra comercial entre Estados Unidos e China e à desaceleração da economia global, o Brasil ainda sente o impacto do elevado desemprego, afetando quase 13 milhões de pessoas.
Também atrapalharam o desempenho da economia as incertezas sobre a aprovação da reforma da Previdência, em razão, especialmente, das sucessivas crises políticas causadas por Bolsonaro, por seus filhos e também por seus partidários desde que o presidente tomou posse.
O que preocupa é que o comportamento de Bolsonaro segue sendo uma fonte de instabilidade política. Nem ainda terminou seu primeiro ano de mandato e o presidente já assumiu a postura de candidato à reeleição em 2022, fazendo declarações polêmicas e tomando posturas mais radicais para agradar ao núcleo duro de seus apoiadores.
E com a proximidade das eleições municipais de 2020, quando o tabuleiro para a campanha presidencial começa a tomar corpo, a política deve gerar mais ruído. O quanto, então, o comportamento errático do presidente Bolsonaro poderá contaminar uma recuperação econômica mais adiante?
Sim, porque há uma combinação muito forte de fatores que leva a crer que a atividade econômica deverá engatar num ciclo expansionista mais robusto a partir do ano que vem.
Primeiro, é provável que o Senado aprove a reforma da Previdência até o fim de outubro. Segundo, como parece já haver um consenso no Congresso de que uma reforma tributária é essencial, não seria difícil imaginar que, se houver um acordo entre parlamentares, governos, Estados e empresários para um texto de mudanças no sistema tributário, essa reforma seria aprovada em algum momento no ano que vem. Isso sem falar de outras medidas importantes já aprovadas pelo Congresso, como a da Liberdade Econômica e a própria reforma trabalhista.
E se somar à agenda de reformas um ciclo agressivo de corte de juros pelo Banco Central, os ingredientes estão postos para uma retomada mais forte do crédito, do consumo, do investimento e do emprego, tendo como pano de um fundo uma inflação ainda muito bem comportada. A maioria dos analistas espera uma redução da taxa Selic para 5,0% até o fim deste ano, mas há quem aposte em juros abaixo de 5,0%, diante da anêmica atividade econômica e inflação bem abaixo da meta.
Mesmo aqueles que dizem que a política monetária já não tem a mesma potência de antes reconhecem que a redução de juros mais profunda poderá injetar um estímulo significativo. Não à toa, as projeções de crescimento do PIB em 2019 e em 2020 voltaram a melhorar, embora discretamente. Para 2019, a previsão de crescimento é de 0,83%. Para 2020, de 2,20%.
Com o Brasil fazendo o dever de casa das reformas, mas Bolsonaro agindo como candidato e não como presidente, é provável que, no curto prazo, a economia e a política sigam se comportando como rivais, tal como Esaú e Jacó. *COLUNISTA DO BROADCAST
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