Muitos analistas nem precisaram esperar pela divulgação hoje do resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre para revisar para baixo suas projeções para o desempenho da economia brasileira em 2018. Já existem até estimativas de um crescimento abaixo de 2%.
Essa perda de fôlego da atividade econômica, além de conter o repasse aos preços da recente disparada na cotação do dólar, pode resultar numa nova onda desinflacionária mais adiante em 2019.
Na mais recente pesquisa Focus, do Banco Central, a expectativa de inflação em 2018 subiu para 3,60%. Há quatro semanas, estava em 3,49%. Mas a projeção do IPCA para 2019 permaneceu em 4,0%, em comparação com 4,03% há quatro semanas.
Ou seja, os analistas reagiram à alta do dólar nas suas projeções do IPCA neste ano, via previsão de maior elevação nos preços administrados, mas não veem, por enquanto, essa pressão contaminando a inflação em 2019.
Talvez porque a fraqueza da recuperação econômica torne mais lento o fechamento do hiato do produto, isto é, que a economia siga crescendo a um ritmo abaixo do seu potencial por mais tempo, o que ameniza pressões futuras da demanda sobre os preços.
Na pesquisa Focus, a estimativa do crescimento do PIB neste ano caiu para 2,37% ante 2,75% há quatro semanas. E a maré pessimista com o desempenho do PIB neste ano deverá ganhar força quando se contabilizar detalhadamente o impacto da greve dos caminhoneiros que praticamente paralisou o País nos últimos dias.
A greve causa um choque de oferta imediato, reduzindo a capacidade de produção no País, ao atingir várias cadeias produtivas, o que, no curto prazo, gera uma alta nos preços de muitos itens, como os agrícolas.
Mas, além de ter um impacto negativo direto na atividade econômica, a paralisação dos caminhoneiros pode afetar os índices de confiança de empresários e consumidores, que colocarão em dúvida a capacidade do governo Temer de evitar que novas categorias profissionais promovam protestos com impacto semelhante ao da greve dos caminhoneiros – na economia e nas contas públicas. E a queda nos índices de confiança pode resultar em menores níveis de investimento e consumo.
A greve dos caminhoneiros é posterior à última reunião do Copom, quando o BC manteve a taxa Selic inalterada em 6,50%, surpreendendo o mercado, que esperava um corte dos juros. A decisão refletiu a piora no cenário externo que acabou levando a uma alta acelerada do dólar.
Se, no curto prazo, a disparada da moeda americana em relação ao real impediu um novo corte de juros pelo BC e levou muitos analistas a elevar suas projeções de inflação em 2018, no médio prazo os efeitos negativos sobre a economia da greve dos caminhoneiros podem não somente compensar a alta do dólar, como também resultar numa pressão desinflacionária.
Há analistas que lembram que a situação vivida atualmente no Brasil é semelhante a de 2008, quando a crise financeira global fez o dólar disparar 31% em relação ao real, mas a inflação ficou em 5,90%, abaixo do teto da meta de inflação para aquele ano, de 6,50%.
No último trimestre de 2008, no auge da crise financeira mundial, o PIB brasileiro caiu 3,6% em relação ao terceiro trimestre, refletindo, entre outros fatores, em queda brutal nos índices de confiança. Resultado: para reavivar a economia, o BC cortou a Selic em 1 ponto porcentual, em janeiro de 2009, apesar da alta do dólar até então.
Mesmo porque, como o Brasil deixou de ter uma elevada dívida em dólar, registrada até no início dos anos 2000, a alta da moeda americana passou a contaminar menos as expectativas inflacionárias de longo prazo refletindo um temor sobre um eventual impacto fiscal (se o governo decidisse monetizar essa dívida para viabilizar seu pagamento) da desvalorização do câmbio.
Como o Copom abordará agora o impacto da greve dos caminhoneiros? Se as projeções do PIB convergirem para um crescimento de 2,0% ou até abaixo disso, a Selic ficará em 6,50% por mais tempo do que o esperado mesmo se o dólar seguir subindo? A resposta talvez só após o desfecho das eleições, quando o próximo presidente da República disser o que pretende fazer em termos de reformas econômicas em 2019.
*COLUNISTA DO BROADCAST
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