Imagine-se num grande navio em que a todo momento o comandante fosse ameaçado, as suas decisões questionadas e houvesse brigas entre os oficiais. E o capitão privilegiasse um grupo de passageiros, prejudicando outros. Quais as chances de a viagem não acabar bem? Mesmo que o mar esteja bom, a viagem será difícil e a chance de acidentes e perdas é grande. Isso acontece quando a governança de uma companhia é agredida, ou conduzida de maneira leviana.
Governança corporativa é o conjunto de regras e práticas dentro de uma companhia justamente voltadas para reduzir conflitos internos, dar transparência e prestar contas, definir papéis e responsabilidades, permitir a gestão de riscos e buscar respeito aos direitos dos acionistas. No entanto, a Petrobras, maior empresa brasileira e grande força do nosso mercado de capitais, parece não ter grande preocupação com essa questão.
Ingerência política e quebra de regras internas é algo usual na petroleira. A briga do seu presidente com o ministro de Minas e Energia é algo público, regras de formação de preços dos combustíveis são pouco transparentes, o presidente do conselho de administração não foi escolhido de uma lista tríplice como manda o seu estatuto, além de que há potencial conflito de interesse porque essa mesma pessoa comanda uma das secretarias do Ministério das Minas e Energia, tanto que houve questionamentos na Justiça.
Recentemente, o conselho negou a distribuição de dividendos extras relativos ao resultado de 2023, o que gerou um tombo de R$ 55,3 bilhões no valor da empresa. De um lado havia o mercado que desejava maior volume de distribuição e do outro o governo em briga sobre o tema.
A distribuição de dividendos é tida como uma forma de sinalização ao mercado sobre a capacidade financeira, sobre a política de investimentos e outras estratégias da empresa. Os investidores até podem estar com uma visão de curto prazo demandando maior fatia dos lucros, mas declarações de cunho ideológico vindas do governo, também não ajudam na questão.
O fato é que o risco da ingerência política pode prejudicar a empresa. A despeito das Leis das Estatais que cria barreiras para as nomeações de natureza política, e do próprio estatuto da Petrobras conter regras adequadas, o governo parece não se importar com isso e ignora o melhor interesse da empresa e dos seus acionistas, principalmente os milhares de investidores pessoas físicas, o que a empresa representa para o mercado e para a nossa economia.
Quando o Estado terá consciência de que quebrar regras básicas de governança aumenta o risco, abala confiança, arranha a imagem da companhia e gera perdas para os investidores?
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