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Opinião|A farra dos gastos ‘extrateto’ precisa acabar

Em 2027, o extrateto deveria chegar a um fim para termos um limite global de gasto. Unificado.

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Foto do author Fabio Giambiagi

Venho expor hoje para o leitor um assunto muito específico, dir-se-ia um pouco entediante, mas que vou tentar apresentar da forma mais leve possível. Refiro-me ao chamado “extrateto”. Quando, em 2016, o Congresso votou o “teto de gastos”, ficou “fora do teto” um conjunto de despesas que o governo aceitou deixar sem o controle rígido da despesa aplicado aos demais gastos. Quando o teto foi aprovado, no ano inicial o valor do “extrateto” correspondeu a apenas 3% do valor do teto, o que era razoável. No mundo brasiliense, porém, qual é o problema? A criatividade parlamentária. Gustavo Franco escreveu um livro bem humorado sobre as leis da economia e uma delas no Brasil poderia ser exposta com o seguinte enunciado: “Se houver uma brecha para gastar, o Congresso irá explorá-la ao máximo”. E foi isso o que aconteceu. O Fundeb estava “fora do teto”. O que ocorreu em plena pandemia? Um aumento enorme da rubrica para o período 2021/2026. Com que argumento? O de que “não afeta a política fiscal” por “estar fora do teto”, o que é como acreditar que se uma pessoa se propõe a fazer regime, “exceto entre às 20 e 21 horas”, qualquer coisa que coma nesse intervalo estará ok. É um ato de autoengano.

Se houver uma brecha para gastar, o Congresso irá explorá-la, afirmou Gustavo Franco  Foto: Dida Sampaio / Estadão

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Além das brechas existentes no teto original, o princípio foi modificado três vezes, com as duas PECs aprovadas mexendo no assunto no governo Bolsonaro e com o “arcabouço fiscal” no governo atual. Eu tenho uma tabela que montei para acompanhar o assunto até 2023 e ela se caracterizava por duas coisas: i) as rubricas originais foram “engordando”; e ii) o Congresso foi aumentando o número de exceções. Quer-se aumentar a remuneração dos profissionais de enfermagem? O item vai ser registrado “acima do teto”. O MEC bola um programa para favorecer a permanência dos “nem-nem” na escola? Se é mais gasto, como fazer? O leitor adivinhou, não? Mais um item para o “extrateto”. Resultado: o número de rubricas de exceções era de cinco em 2016 e em 2023 chegou a 14 itens.

Isso não é sério. O valor somado das despesas do extrateto – com exceção das transferências por repartição de receitas – foi de R$ 37 bilhões em 2016 e alcançou nada menos que R$ 216 bilhões em 2023. Os argentinos têm um ditado para isso: Hecha la ley, hecha la trampa (algo como “feita a lei, feito o drible na lei”). Em 2027, o extrateto deveria acabar para termos um limite global de gasto. Unificado. Como diria um famoso político: “com o Supremo, com tudo”.

Opinião por Fabio Giambiagi

Economista, formado pela FEA/UFRJ, com mestrado no Instituto de Economia Industrial da UFRJ

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