Um dos temas sobre os quais os aspirantes a economistas se debruçam na faculdade é a análise do papel dos incentivos. Observe-se algo que funciona mal na economia e, muito provavelmente, haverá um erro no que nós economistas chamamos de “desenho de incentivos”.
As “famílias” de regimes de governo se decompõem em dois grandes blocos: presidencialistas e parlamentaristas. A situação de a nossa Constituição de 1988 ter sido desenhada para um país parlamentarista, mas na qual no final prevaleceu o presidencialismo, gerou o “presidencialismo de coalizão”, um regime presidencialista com um sistema político fragmentado, mas no qual o presidente tinha instrumentos de poder para poder governar. Com o tempo, o Parlamento ganhou diversos poderes e, hoje, temos um regime disfuncional, com um Congresso poderoso, um Executivo enfraquecido e um sistema eleitoral em que se escolhe quem, supostamente, comandará o País nos quatro anos seguintes, sem ter à mão, porém, os elementos para poder fazê-lo com eficácia.
Na raiz dessa disfunção está a aberração do abuso das emendas parlamentares. Trata-se de uma despesa que está chegando perto de R$ 50 bilhões por ano, a maior parte dos quais para gastos que, sob a ótica federal, não fazem o menor sentido. Ao invés de o governo federal usar esses recursos para construir coisas que sejam condizentes com o que cabe à União fazer – proteção de fronteiras, ciência e tecnologia, energia nuclear, estradas, etc. –, estamos “torrando” dezenas de bilhões numa miríade de iniciativas que constituem, tipicamente, despesas locais: praças esportivas, ginásios, hospitais sem qualquer lógica de integração, etc. Em bom português, equivale a jogar dinheiro pela janela.
O Brasil precisa redefinir o sistema político, para que uma coalizão de governo seja inteiramente responsável pelo sucesso ou pelo fracasso da gestão, ao invés de termos a “geleia geral” em que temos vivido. Por isso, aprovadas as leis complementares da reforma tributária em 2024, na segunda metade do mandato de 2023-2026 deveríamos discutir a sério a possível adoção do chamado “semipresidencialismo” a partir de 2031. Assim, o próximo governo ainda seria no formato atual, mas os players da política já atuariam na gestão de 2027-2030 na perspectiva de mudança do sistema nas eleições seguintes. Sem isso, será difícil escapar da trajetória de mediocridade que tem sido nossa sina. No longo prazo, é uma tragédia.
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