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Fazenda estima em R$ 14 bi custo com socorro ao setor de eventos em 2024

Número, se confirmado, consome praticamente todos os R$ 15 bi remanescentes do Perse, programa emergencial para o setor; Congresso prorrogou benefício até esgotamento do valor, com prazo até 2026

Foto do author Alvaro Gribel

BRASÍLIA – O Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) deve consumir cerca de R$ 14 bilhões em renúncias fiscais (perda de receitas) já neste ano, segundo apurou o Estadão. A estimativa foi feita por técnicos do Ministério da Fazenda, tendo como base as declarações das próprias empresas junto à Receita Federal, de janeiro a maio.

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Se confirmado, o número praticamente consome todos os R$ 15 bilhões remanescentes do programa, após a aprovação de um projeto de lei no Congresso que limitou o benefício até o esgotamento desse valor, com prazo até 2026.

O Perse foi criado em 2021, durante a pandemia de covid-19, para socorrer empresas de eventos com dificuldades financeiras, em razão da interrupção de atividades durante a quarentena.

O governo tentou extinguir os benefícios por meio de uma medida provisória (MP) enviada em dezembro do ano passado, alegando que as empresas já haviam se recuperado do período de baixa, mas enfrentou resistência do Congresso, que decidiu dar um fim gradual aos incentivos. Durante as negociações, porém, por pressão da Fazenda, a Câmara concordou em limitar os custos do Perse em R$ 15 bilhões até 2026.

Segundo a pasta, no ano passado, o Perse custou R$ 13,18 bilhões aos cofres públicos — número contestado pelo setor, que calcula menos da metade deste valor.

No envio da MP, em dezembro, o governo alegou que a previsão era a de que a renúncia fiscal com o programa girasse em torno de R$ 4 bilhões por ano durante os cinco anos de vigência (até 2027); mas que, em apenas dois anos, já tinha chegado ao montante total de abatimento de impostos.

O secretário de Orçamento Federal, Clayton Montes; o secretário do Tesouro, Rogério Ceron; e o secretário da Receita Federal, Robson Barreirinhas, no anúncio do 3º relatório bimestral de receitas e despesas. Foto: Washington Costa/MF

O fim do programa constava na mesma MP que previa a reoneração gradual da folha. O Congresso, no entanto, não só aprovou a prorrogação do benefício, como derrubou o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Assim, diante da resistência dos parlamentares, tanto a desoneração da folha como o Perse foram retirados da MP e enviados ao Congresso via projeto de lei.

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No entendimento na equipe econômica, se a MP tivesse se transformado em lei, o governo estaria mais próximo de conseguir cumprir a meta de déficit primário zero este ano. Nesta segunda-feira, 22, a equipe econômica anunciou uma revisão para baixo do resultado fiscal de 2024. A projeção de déficit passou de R$ 14,5 bilhões para R$ 28,8 bilhões, no limite permitido para o cumprimento da meta fiscal.

No anúncio, Barreirinhas afirmou que os custos com a desoneração da folha de pagamentos dos 17 setores que mais empregam e dos municípios seriam de R$ 26,2 bilhões em 2024. A equipe econômica retomou essa projeção após, nas últimas semanas, ter endossado o cálculo do Senado, da ordem de R$ 17 bilhões.

Segundo interlocutores da equipe econômica, juntas, as medidas de desoneração da folha de pagamentos dos 17 setores que mais empregam, dos municípios e o Perse vão gerar uma perda de receita da ordem de R$ 40 bilhões aos cofres públicos neste ano. A renúncia do Perse, portanto, seria de cerca de R$ 14 bilhões.

Em junho, o governo editou uma MP determinando que as informações de renúncias fiscais fossem prestadas pelas empresas à Receita Federal. As companhias tinham até 20 de julho para enviar os dados referentes ao período de janeiro a maio.

Agora, os dados foram anualizados para se chegar a uma projeção para o ano que tivesse como base “dados reais” prestados pelo próprio setor — daí a retomada à estimativa de R$ 26,2 bilhões, afirmou Barreirinhas.

A cifra de R$ 40 bilhões reforça a visão na equipe econômica de que os custos com os programas estão elevados e que as medidas de compensação exigidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) serão um ganho “permanente” para o reequilíbrio das contas públicas.

O que é a desoneração da folha

A desoneração da folha de pagamentos foi instituída em 2011 para setores intensivos em mão de obra. Juntos, eles incluem milhares de empresas que empregam 9 milhões de pessoas. A medida substitui a contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a folha de salários por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Ela resulta, na prática, em redução da carga tributária da contribuição previdenciária devida pelas empresas. No caso dos municípios, o benefício reduz a tributação de 20% para 8%.

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Por decisão do Congresso, em votações expressivas, a política foi prorrogada até 2027 pelo Congresso Nacional, mas acabou suspensa por uma decisão liminar do STF em ação movida pelo governo federal. A alegação é que o Congresso não previu uma fonte de receitas para bancar o programa e não estimou o impacto do benefício nas contas públicas. O Legislativo, porém, argumenta que medidas foram aprovadas para aumentar as receitas da União e que a estimativa de impacto estava descrita na proposta aprovada.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou, em entrevista ao Estadão, um acordo para manter a desoneração em 2024 e negociar uma cobrança gradual a partir do próximo ano. Segundo o Desonera Brasil, os 17 setores beneficiados empregam 9,3 milhões de pessoas, e criou 151 mil empregos nos dois primeiros meses do ano. O movimento menciona ainda que o salário médio nestes setores é 12,7% maior ao dos setores que não são desonerados, dados que comprovariam os benefícios da medida.

A equipe econômica ainda não chegou a um acordo com os senadores sobre a fonte de financiamento para a desoneração da folha. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), enumerou seis medidas que poderiam ajudar a aumentar a arrecadação do governo como contrapartida à desoneração, como a repatriação de valores investidos por brasileiros no exterior e uma espécie de refis para dívidas de empresas com agências reguladoras.

A Fazenda, no entanto, alegou que a previsão de arrecadação com essas medidas não é suficiente para compensar a desoneração e sugeriu, como garantia, o aumento da alíquota de CSLL, que incide sobre o lucro das empresas. A medida, no entanto, foi criticada por Pacheco, segundo quem o governo desonerarava numa ponta e, na outra, aumentava a tributação sobre as empresas.

Diante do impasse, pouco antes do recesso parlamentar, na semana passada, Pacheco e a Advocacia-Geral da União (AGU) solicitaram ao STF a prorrogação do prazo para se chegar a um acordo, que termina agora em 11 de setembro.

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