BRASÍLIA – Diante da forte reação negativa de empresários, industriais e parlamentares, o Ministério da Fazenda estuda alternativas para reduzir as resistências à medida provisória que limita o uso de créditos tributários referentes ao PIS e à Cofins (dois tributos federais) por parte das companhias. Uma das opções na mesa é possibilitar que os exportadores sejam ressarcidos por esses créditos e que isso ocorra em prazo mais rápido.
A MP, que tem o objetivo de compensar a desoneração da folha de pagamentos dos 17 setores que mais empregam e municípios, proíbe que as empresas usem o crédito de PIS/Cofins para abater outros tributos, como o Imposto de Renda, por exemplo – a chamada compensação cruzada. Além disso, os valores obtidos por crédito presumido não serão mais ressarcidos e eles também só poderão ser usados para abater o pagamento do próprio PIS/Cofins.
Nesse cenário, as empresas exportadoras alegam que, como vendem ao exterior sem a incidência desses dois tributos, simplesmente não têm como usar esses créditos, que ficarão retidos em seus balanços. Para os empresários, isso configura um flagrante desrespeito ao direito constitucional de isenção às exportações.
Para solucionar esse problema, a equipe econômica debate a possibilidade de “importar” para o texto da MP um mecanismo previsto na legislação da reforma tributária, o qual determina o ressarcimento dos créditos gerados pelo novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) em até 60 dias.
Esse prazo seria observado, de acordo com a lei complementar, no caso de valores que estivessem dentro da média dos últimos 24 meses do contribuinte, num limite de 150% entre o que ele gerou de crédito e o que terá de pagar de imposto. Já para valores acima desse porcentual, que fugissem da média, o prazo seria maior, podendo chegar a 270 dias. Atualmente, o governo tem até 360 dias para realizar o pagamento em dinheiro à companhia.
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Nesta segunda-feira, 10, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sinalizou que esse ajuste poderá ser feito na MP. “Com a reforma tributária, isso tem o mesmo problema, e foi resolvido na negociação de como operar a devolução do crédito de exportação de PIS/Cofins. Isso está pacificado, até onde entendo, está muito bem encaminhado”, afirmou, ao ser questionado por jornalistas.
“Então, vamos procurar aderir a essa MP o que foi de certa maneira pactuado no Congresso sobre esse mesmo tema na regulamentação da emenda constitucional (da reforma)”, complementou Haddad.
Em entrevista ao Estadão, a procuradora-geral da Fazenda Nacional, Anelize de Almeida, já havia pontuado que a demanda dos exportadores era considerada relevante e poderia levar a mudanças na MP. “A empresa exportou e ela não paga; como é que ela vai usar esse crédito se ela só pode usar no PIS/Cofins? É estranho. Talvez a gente tenha de fazer uma outra alteração no sistema tributário das exportadoras”, disse Anelize.
Tributaristas e empresários ouvidos pela reportagem avaliam, porém, que a alteração em estudo seria insuficiente para sanar os problemas da MP – que já é alvo de questionamento na Justiça. O advogado Luiz Bichara contesta a fala de Haddad e alerta que a devolução de créditos do IVA no âmbito da reforma ainda não está pacificada – e que, portanto, a “importação” da nova regra não resolveria a questão.
“No caso da devolução dos créditos na reforma, há a regra dos 60 dias e há a regra de incidência da Selic (a taxa básica de juros) se demorar mais 15 dias (ou seja, depois de 75 dias da apuração do pedido), mas não há ‘enforcement’. Ou seja, a legislação não prevê mecanismos para obrigar o poder público a realizar o pagamento. Então, se o crédito não for devolvido, o contribuinte fica a ver navios”, afirma o tributarista, que é sócio do Bichara Advogados.
Interlocutores da indústria chamam a atenção para outro ponto: o risco de novos contenciosos, uma vez que poderá haver dúvidas sobre o que é crédito de PIS/Cofins referente à exportação e o que é relacionado à atividade interna da empresa – caso seja necessária essa diferenciação para o ressarcimento dos créditos.
Fabrício Tonegutti, diretor da Mix Fiscal, pondera que a inconstitucionalidade da MP vai bem além do debate sobre os exportadores. “O governo não poderia aumentar a tributação neste ano em função da regra da anterioridade”, diz o tributarista, em referência aos princípios da anterioridade nonagesimal (só cobrar após 90 dias da publicação da lei) e anual (no exercício seguinte).
“Quando o governo tira, por exemplo, o crédito presumido, ele está evidentemente aumentando a carga. Eu não tinha de pagar um imposto e agora tenho de pagar. O objetivo desse princípio é exatamente evitar a imprevisibilidade. O governo não pode, por meio de uma MP, que tem caráter de urgência, mudar a regra no meio do jogo. Há contratos firmados, safra em andamento, compra de equipamentos já planejada”, diz Tonegutti.
Segundo ele, portanto, esse tipo de alteração na legislação tributária só poderia entrar em vigor a partir de 2025, caso aprovada ainda neste exercício. Essa hipótese, porém, não contempla as necessidades da equipe econômica do governo, que alega que precisa de uma fonte de compensação, ainda neste ano, para bancar a prorrogação da desoneração da folha de pagamento.
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